"Após divulgar à CMVM um resumo das contas anuais de 2013/14 com resultado positivo de 14,2 milhões de euros, o dirigente sublinha o crescimento das receitas apesar do aumento de custos.
Soares de Oliveira adopta discurso tranquilo quanto à situação económico-financeira do Benfica.
-Um exercício positivo após cinco negativos é fulcral para cumprimento das regras de fair-play financeiro?
- Não nos passa pela cabeça não cumprir esses critérios, mesmo nos dois anos passados em que tivemos resultados ligeiramente abaixo do breakeven. O destaque nas contas do ano passado é que o Benfica é o primeiro clube português a passar a barreira dos 200 milhões de euros em termos de proveitos consolidados. Para nós representa um crescimento muito significativo e, graças a isso, mesmo com o crescimento dos custos, conseguimos o resultado de 14,2 milhões de euros. Daqui em diante é de esperar que os proveitos continuem a ter uma relevância muito significativa mesmo em termos europeus e que o Benfica continue a cumprir os critérios de fair-play financeiro.
- Nos dados divulgados não estão as estruturas de receitas, gastos, situação da dívida financeira, empréstimos obrigacionistas, entre outros. Como estão esses itens?
- Os resultados foram apresentados de modo mais resumido, no caso do universo da SAD, porque o Benfica tem a sua assembleia geral de aprovação de contas no próximo dia 26 e, para esse acto, foram apresentados os resultados não só do Benfica como clube, mas também como detentor da maior parte do capital das várias participadas. Do ponto de vista prático temos de incorporar no Sport Lisboa e Benfica o método de equivalência patrimonial em relação a cada uma das empresas participadas. Logo não faz sentido os resultados da SAD valerem X no clube sem divulgar alguma informação. No final do mês de Outubro, altura da aprovação de contas da SAD, será feito o relatório detalhado. O destaque vai para o crescimento de receitas acima dos 50 milhões, passando de 156 milhões de proveitos consolidados para um valor próximo dos 204 milhões. Aqui o papel das receitas televisivas foi muito importante com um salto de 255% face aos proveitos tradicionais e as outras rubricas, excepto na venda de jogadores, não há variações significativas.
- E os custos?
- Mantiveram-se sem grandes variações com excepção de salários do plantel, pois existe grande variação na massa salarial associada aos ganhos desportivos: vencer todas as competições menos a Liga Europa leva a que, da equipa técnica aos jogadores, haja aumento dos gastos com pessoal no exercício. Mas há uma correlação interessante que, por hábito, se pensa ser o inverso: prova-se que é possível conjugar bons resultados desportivos e económicos.
- Os empréstimos obrigacionistas que estão a vencer vão ser renovados?
- Depende daquilo que seja o diálogo com as entidades gestoras desses fundos. Até aqui tem havido interesse no chamado ‘revolving', pois os detentores das obrigações ganham dinheiro e para o Benfica é uma fonte de financiamento. Como é sabido há alterações na estrutura de gestão do Novo Banco, nos próximos dias por certo iremos conversar, mas não temos qualquer preocupação sobre esse assunto - se a entidade mantiver a ideia de que é um investimento interessante estaremos disponíveis para o ‘revolving'; caso contrário liquidaremos esses obrigacionistas.
- O Espírito Santo Liquidez tem linhas de obrigações do Benfica, no valor de 67,7 milhões, a vencer em Outubro e Dezembro: como vai amortizar esses casos?
- Temos posição de caixa confortável, porque o conjunto de vendas do ano passado permite posição forte de tesouraria e olhar para o ano em curso de forma equilibrada, não há necessidades adicionais de financiamento, gerimos bem as coisas com os intercalares da parte da banca portuguesa. Se for preciso um reembolso em Outubro será feito; caso se considere um novo mecanismo de financiamento não há problema. Há em curso investimentos como o papel comercial que tem corrido muito bem: abrimos há alguns anos com 30 milhões, neste momento é de 20, mantém-se a tendência de reembolso e tem havido vontade das partes em renovar porque é vantajoso para todos.
- Há dados novos sobre o empréstimo à SGPS?
- Não, nem nos preocupa de forma excessiva. Integra-se na gestão corrente, em certo momento será necessário tomar decisões, mas ainda não chegámos lá.
- O ‘project finance' está assegurado?
- Não temos qualquer incumprimento em relação aos últimos 12 anos, desde que o estádio está construído. Essa é uma grande vantagem do Benfica quando dialoga com entidades financeiras nacionais ou estrangeiras, ou seja, não representamos uma só imparidade. Como nos dizem, o Benfica não é uma imparidade, mas um tema mediático. Notícias que têm saído são falsas, não há problema com o ‘project finance', o papel comercial mantém-se, os empréstimos obrigacionistas são reembolsados nos prazos, fazemos ‘revolving' de forma natural, temos entidades financeiras a trabalhar com o Benfica no plano nacional e internacional...
- Mas aumenta o endividamento...
- Sim, mas os proveitos crescem mais depressa. Entende-se que o modelo de desenvolvimento do Benfica necessita de investimento constante na compra de jogadores, isto é, deixámos o cimento (estádio, academia e Benfica TV) e passámos para as pernas, algo que tem de ser renovado. Muitas vezes olha-se para as contas dos clubes e, como no caso do Benfica, diz-se que o passivo aumentou, mas ninguém refere que o activo cresceu muito mais. Procuram-se ‘sound bytes' e nunca ouvi um comentador falar em activos, seja do Benfica ou de outros clubes. Isso tem de mudar, pois as pessoas devem perceber que esta é uma indústria séria com temas sérios e só assim se justifica que, num país em crise, numa Europa em crise, este clube passasse da facturação de 40 milhões, em termos consolidados, há 10 anos para superar este ano os 200 milhões. Somos um dos 20 maiores clubes da Europa, estamos nos cinco melhores do ponto de vista desportivo e não conheço outra empresa que, com resultados destes, seja tratada como um negócio menos sério.
- A dívida financeira era de 296 milhões no terceiro trimestre, sendo 64% de curto prazo. Esse dado não pressiona as necessidades de financiamento?
- Não, pois não é uma situação nova. O facto de trabalharmos com instrumentos financeiros com renovação em prazos de seis meses a um ano leva a que analisemos a dívida como sendo de curto prazo, mesmo que não na totalidade.
- Qual é o nível do rácio de gastos com pessoal/amortização de passes face ao volume de negócios?
- Está no habitual para o Benfica. Pretende-se que seja entre os 50 e 70% do volume de negócios. Se olharmos do lado da SAD está mais perto da barreira de cima; se for olhado do universo consolidado está muito abaixo dos 50%.
- Os fluxos de caixa têm sido insuficientes para pagar juros. O Benfica está a mudar nesse sentido?
- Os fluxos de caixa dependem muito do que são as transacções com jogadores. Em 2012/13, face à decisão de não alienar os jogadores principais, isso representou esforço adicional do ponto de vista de caixa, mas essa situação vai ser invertida com as vendas feitas agora e, mesmo que não quiséssemos, seria preciso por causa do fair-play financeiro. No caso de clubes ricos como PSG e City as multas são só mais um custo, mas para os clubes portugueses não há espaço para esse incumprimento.
- Fechar o Benfica Stars Fund era inevitável?
- Termina a 30 de Setembro e havia vários cenários: renovação (fomos cautelosos pois não entendemos até onde irá o ataque aos fundos por parte da UEFA e não controlamos o que aí vem) ou não prolongar, podendo voltar a fazê-lo, pois deve ser visto como diversificação de financiamento. Podíamos deixá-lo chegar ao fim sem renovação e os diversos detentores de unidades de participação ficavam com activos do fundo - jogadores e posição de caixa - e não quisemos que passes como o de Gaitán estivessem repartido por nós e sete ou oito entidades, não seria gerível. Restava a opção de comprar as unidades de participação por preços razoáveis e, ao pagar 28 milhões, não significa que estejamos a valorizar os passes nesse montante. Os passes correspondem a oito milhões e tudo o resto é liquidez e contas a receber que o Fundo tem. Foi um projecto interessante, é um instrumento que bem gerido, com regras claras e informação prestada à CMVM e unidade de participação sempre ajustada, é um sistema equilibrado.
- A cedência de jovens formados na Academia é uma estratégia para aposta posterior?
- O grande debate para qualquer clube formador gira em torno da transição do futebol jovem para o profissional, mas outro desafio se coloca no patamar de exigência num clube como o Benfica. Em alguns casos, o jogador deve permanecer e fazer mais um ano na equipa B e outros em que não será o sítio certo para os desenvolver, rodando em Portugal ou fora em equipas de topo. São estes os casos de Cavaleiro, Bernardo e Cancelo. Esperamos que essa passagem dê frutos para todos, sobretudo para os jogadores.
"Custos da BTV não tiveram grandes variações"
São cerca de nove milhões de euros e os assinantes voltaram aos 300 mil após o defeso.
- Há um ano admitiu a saída de um jogador até final do exercício. Saíram dois e, depois, Oblak, Garay, Markovic, Cardozo. Alguma razão forçou tantas saídas?
- Impacto nas contas de 2013/14 há que separar as transacções até 30 de Junho e as posteriores. São razões de mercado: os clubes portugueses dependem da sua capacidade de realizar mais-valias com venda de jogadores e procuramos a optimização do momento máixmo de valorização. Casos de Rodrigo e André Gomes já estavam muito próximos dessa questão e saíram no momento certo. Quanto aos cedidos no Verão é diferente, pois há casos de final de processo de desenvolvimento de carreira (Cardozo), procurando-se refrescar o plantel com sangue novo e valorização significativa nos próximos anos; outras são casos de bom negócio e, na maior parte dos casos deste Verão, a execução de cláusulas de rescisão, sendo obrigatório respeitá-las.
- A saída de Garay pelo preço que foi teve a ver com um compromisso em Janeiro que foi adiado?
- Havia interesse em mantê-lo (e creio que não existia compromisso para saída em Janeiro), bem como aos principais activos, decisão tomada no Verão do ano passado, no sentido de alcançar vitórias não conseguidas em 2013. Foi uma decisão de risco controlado, mas Garay estava no último ano de contrato e, entre mantê-lo contra a sua vontade, não realizar qualquer mais-valia ou deixá-lo sair pelo valor possível, o assunto está feito e encerrado.
- Entende que os adeptos tenham ficado com a ideia de que o Benfica tinha ‘obrigação' de ganhar a Liga Europa?
- O Benfica tudo fez para ganhar a final. Se nos lembrarmos das equipas que ficaram para trás e do dramatismo do jogo com a Juventus, 15 dias antes da final, podia dizer-se que, da mesma forma que o Benfica tinha ‘obrigação' de ganhar a final, a Juventus tinha ‘obrigação' de ganhar ao Benfica que acabou com nove. Mas o futebol é incerteza e, não estando felizes, cá estaremos para voltar a finais e ter mais condições a ganhar troféus.
A BTV teve receitas brutas de 28,1 milhões. Os custos estão perto dos nove milhões como há um ano?
Não houve grandes variações. A estrutura de custos tem a ver com pessoal e compra de conteúdos, pois a produção de jogos, mesmo com imagens de helicóptero, não custa mais de 20 mil euros. A estrutura de pessoal não se modificou, mesmo o lançamento do segundo canal fez-se sem mais pessoal e não houve compra de conteúdos adicionais. Perdemos o Brasileirão, mas talvez venhamos a ter outros conteúdos internacionais interessantes. Logo no primeiro ano, a BTV teve resultados que esperávamos, batendo a proposta da PPTV/Olivedesportos. Não queremos fazer concorrência, mas ir buscar conteúdos que nos permitam pagar com receita adicional que só pode vir por maisassinaturas ou aumento do valor, algo que não está previsto.
- Qual é o número de assinantes?
- Estamos outra vez perto dos 300 mil, também por acção do Benfica-Sporting no começo. O pico mais baixo foi cerca de 200 mil.
- Expansão para outros mercados?
- Já temos acordos para 120 países. No caso da BTV foram definidos 12 países no âmbito da Lusofonia e está, por exemplo, em Angola, Moçambique, França, Luxemburgo, Brasil, EUA."
Entrevista de Domingos Soares de Oliveira, in Diário Económico, por Paulo Jorge Pereira
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