"Lamento, mas não tenho tema. O Mundial está aí, e nem os bocejos antecipados pela perspetiva de assistir a um excitante Qatar - Equador na abertura me desmoralizam.
Li as recentes declarações de Blatter sobre o erro da escolha do organizador do Campeonato do Mundo e pensei em recuperar a história da atribuição do evento ao Qatar, o que daria para exibir o conhecimento dos muitos pormenores sórdidos apreendidos com a leitura do notável Red Card, de Ken Bensinger.
Coloquei também a hipótese de partir da sumptuosidade dos estádios para relembrar os mais variados relatórios sobre atropelos de direitos básicos dos trabalhadores, do sistema Kafala, das condições de trabalho horripilantes e das estimativas conservadoras de cerca de 6500 mortos.
Refleti ainda sobre os valores das sociedades ocidentais e como estes são tão facilmente relativizados em prol dos muitos milhões gerados por entretenimento. Combate à intolerância, democracias liberais, liberdades individuais e outras coisas, pelos vistos, são muito importantes...em circunstâncias convenientes.
Ponderei também dar brado à minha indignação pelo comunicado conjunto de várias federações, incluindo a portuguesa, exercendo um papel ativo numa operação de cosmética inaceitável deste Mundial e do Qatar. Assim como a versão polida e moderna, "powered by FIFA", do bafiento "cala-te e joga" face a protestos tímidos pela violação de direitos humanos.
Ou até poderia desenvolver algumas ideias sobre as aparentes políticas de eficiência fiscal por parte de uma entidade cuja existência se deve unicamente à delegação de poderes do Estado (gostaria de conhecer a opinião da Segurança Social sobre a forma como foi contratualizada a relação da FPF e equipa técnica).
No entanto, ouvi o Presidente da República: "O Qatar não respeita os direitos humanos. (...) Mas, enfim, esqueçamos isto. É criticável, mas concentremo-nos na equipa." E dei por mim a pensar no melhor onze português, esqueci essas coisas dos direitos humanos e afins - e fiquei sem tema."
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