"Londres: a grande capital do império onde o sol nunca se põe! Tottenham Hotspurs-Benfica: um jogo que ficou para a história da Taça dos Campeões Europeus...
Chegou a hora de um confronto que ficou marcado a letras de ouro na história da Taça dos Campeões Europeus. Agora na Liga Europa. Vão-se os nomes, ficam os emblemas com a sua maravilhosa pátina dos mármores antigos. Dêem-me licença para recorrer de novo ao «Viagens em Redor do Planeta Eusébio». Com fui eu quem o escreveu, começo por dar licença a mim próprio para me citar.
Abril de 1962 - Primeira página do «Daily Sketch», jornal londrino: «BENFICA! OH, WHAT A DRAW! Meet the Lisbon Millionaires...» Logo abaixo desta manchete garrafal, as fotos tipo-passe de oito jogadores do Benfica, adversário do Tottenham Hotspurs, campeão inglês, na meia-final da Taça dos Campeões Europeus. Sobre cada foto, um carimbo com o valor que lhes era atribuído.
Oito jogadores; oito preços:
Costa Pereira 3.600 contos
Cruz 4.000 contos
Coluna 6.800 contos
Ângelo 2.400 contos
José Augusto 8.000 contos
Germano 6.400 contos
Eusébio 20.000 contos
Preços em Libras Esterlinas, claro está: em 1962, uma Libra Esterlina valia 84$00.
Com estes montantes, não haveria equipa mais valiosa em todo o Mundo. E Eusébio, embora valesse mais do dobro que qualquer um dos seus companheiros, era dado pela imprensa inglesa como certo no Real Madrid.
Tottenham Hotspurs: fundado em 1882, é um dos grandes conquistadores da Taça de Inglaterra, apesar de contar apenas com dois títulos de campeão; primeira equipa britânica a ganhar uma competição europeia (a Taça das Taças, em 1963), viveu durante a década de 60 o seu período de maior fulgor.
Tottenham Hotspurs: a equipa de Danny Blanchflower, de Dave Mackay, de Cliff Jones, de John White e, acima de todos, de Jimmy Greaves.
Jimmy Greaves: houve quem atrevesse a chamar-lhe o «Pelé de Inglaterra»; nascido em 1940, jogou no Chelsea passou fugazmente pelo Milan antes de se instalar no Tottenham ao qual custou a módica quantia de 99.999 Libras (o manager, Bill Nicholson, não quis criar-lhe a acrescida responsabilidade de ser o primeiro jogador inglês a custar 100 mil Libras); terminaria a carreira no West Ham martirizado por problemas com o álcool. Esquerdino, foi um goleador temível: fez 44 golos nas suas 57 «internacionalizações» e 357 em jogos do campeonato inglês, tendo, por três vezes, marcado cinco golos num só jogo.
Enorme ovação em White Hart
Na edição da Taça dos Campeões de 1961-62, o Tottenham Hotspurs chegava às meias-finais com uma terrível veia goleadora nos jogos caseiros, marcando oito golos ao Gomik Zabrze, da Polónia; quatro ao fortíssimo Dukla de Praga; e vencendo o Feynoord, em Roterdão, por 3-1. No ano seguinte venceria a Taça das Taças, batendo o Atlético de Madrid, na final de Roterdão, por expressivos 5-1.
De nada lhe serviu. Em Lisboa, na Luz, o Benfica foi empolgante: aos vinte minutos já vencia por 2-0; aguentou o contragolpe de Smith, aos 54 minutos; fechou a conta por José Augusto, aos 64. Em Londres, no White Hart Lane, o Benfica foi científico: logo aos 15 minutos marcou um golo, por Águas; depois aguentou estoicamente a pressão de um adversário revoltado e de um público à beira do fanatismo. A derrota por 1-2 garantia-lhe a sua segunda final consecutiva.
White Hart, o veado branco, era o centro do escudo de Ricardo II, rei de Inglaterra, filho de Eduardo, o Príncipe Negro, neto de Eduardo III. Ah! Como é cheia de lendas a história da velha Inglaterra!
Bélla Guttmann, o «Feiticeiro», sentenciara antes do jogo de Lisboa: «O difícil, para o Benfica, não será vencer o Real Madrid na final, mas sim eliminar o Tottenham. Na final, os espanhóis não terão a mínima chance de nos vencerem. Mesmo que o Real chegasse ao fim da primeira parte a ganhar por 2-0».
Terá Guttmann dito tais palavras? Ou nasceram elas da pródiga imaginação de quem tem escrito a história do futebol até aqui? Vá lá saber-se. Por isso é que Guttmann tem direito a estátua no Estádio da Luz. Vão lá e vejam-na.
Eusébio não marcou golos aos ingleses. Todavia, mais uma vez, Londres fora palco de uma das suas soberbas interpretações desse jogo que os britânicos tinham inventado mas já não dominavam. Duramente marcado pelo escocês MacKay, foi exemplo deabnegação e valentia. Sairia ovacionado como só em Inglaterra se sabe fazer aos que saem de lá vencedores.
Tottenham-Benfica; Benfica-Tottenham: tomáramos nós que houvesse todas as semanas jogos assim.
Desfrutem-nos porque são uma raridade."
Afonso de Melo, in O Benfica
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