"Abel pediu ajuda para credibilizar o futebol... Presumindo, se calhar ingenuamente, que era a sério aqui vai a minha contribuição. Comecemos por alguns pressupostos básicos:
1. Os erros de arbitragem são inevitáveis no futebol. O problema existe na distribuição desigual dos erros entre equipas, seja ela verdadeira ou imaginada.
2. Se os erros tiverem consequências diferentes para o árbitro consoante erre para um lado ou para outro isso condiciona os árbitros. Quanto maior a penalização maior o risco da decisão, promovendo uma distribuição desigual do erro.
3. É quase sempre impossível distinguir (ou de o fazer de forma não controversa) entre erros intencionais e não intencionais, da mesma forma que é impossível distinguir entre críticas que resultam da indignação com os erros de críticas que visam condicionar os árbitros para que errem mais contra os outros e a nosso favor. A violência das críticas pode ter menos a ver com o grau de indignação do que com a oportunidade de pressão.
Se aceitarmos estes pressupostos, que me parecem indiscutíveis, então compreendemos o que sustenta o círculo vicioso do futebol português: erros sustentam críticas e pressões que por sua vez produzem mais erros desiguais que incentivam a aumentar ainda a mais a pressão e as críticas...
Há duas conclusões:
1) as críticas, e sua associação a diferentes consequências para os árbitros, não reduzem os erros, antes tendem a os aumentar e, sobretudo, alteram a sua distribuição (favorecendo quem for capaz de impor consequências mais negativas);
2) não se podem proibir as críticas - e a pressão que lhes está associada - se não existirem processos e instituições credíveis, aceites por todos como garantindo uma distribuição igual dos erros. Mais do que procurar eliminar o erro a prioridade deve estar em eliminar o que promove a suspeita de uma distribuição desigual dos erros. Eis o que é fundamental para quebrar este círculo vicioso:
- Os membros dos órgãos de arbitragem e disciplina devem ter um mandato não renovável e não devem poder ter qualquer relação profissional anterior ou posterior com clubes (isso não quer dizer que não tenham preferências clubísticas), devendo ser financeiramente compensados por esta restrição pós-mandato.
- Devem ser obrigados a uma declaração de património e registo de interesses, estando obrigados a explicar qualquer divergência durante e no final do seu mandato, sendo tal fiscalizado por um entidade independente.
- O relatório de avaliação anual dos árbitros deveria ser público e incluir uma componente de coerência na aplicação dos critérios (o que seria fácil através das imagens gravadas pelo VAR ao longo da temporada).
- Qualquer agente ou dirigente de um clube seria proibido de contactar, directa ou por interposta pessoa, qualquer árbitro ou membro dos órgãos de arbitragem e disciplina, sendo obrigação destes denunciar um tal contacto. E a proibição de comentar as arbitragens deveria ser imposta a todos os agentes do jogo e ter sanções sérias.
Pedir para credibilizar o jogo sem estar disponível para estas reformas será apenas usar o argumento da credibilização para reforçar a pressão sobre os árbitros e, logo, reduzir essa credibilidade..."
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