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domingo, 29 de outubro de 2017

As contas da Europa e as nossas contas

"Somos, em competição, 'o melhor da Europa' mas somos, em concretização e ambiente interno, dos 'menos bons da Europa'.

1. Se a Espanha e a Catalunha vivem semanas decisivas, as equipas portuguesas participantes nas competições europeias vão viver uma semana determinante. O Benfica sabe que tem de pontuar em Manchester para ainda poder sonhar com uma presença nos oitavos de final da Liga dos Campeões. O Futebol Clube do Porto sabe que se vencer a difícil equipa do RB Leipzig tem acrescidas hipóteses de alcançar os oitavos e o Sporting, mesmo que desfalcado na sua defesa, e igualmente com três pontos, ambiciona ultrapassar a velha Senhora, a Juventus, para arrecadar os milhões que os oitavos proporcionam. Mas sabendo as equipas de Sérgio Conceição e Jorge Jesus que a sua permanência na Europa depende apenas deles a três jornadas do fim desta fase de grupos da Liga dos Campeões. E o Minho também sabe que o Sporting de Braga tem uma tarefa mais acessível que o seu vizinho - que não espanhol! - Vitória de Guimarães para alcançar os dezasseis avos da Liga Europa. Aquela Liga em que o nosso Vitória é um referência, já que é aquela singular equipa que participa numa competição europeia sem que, num concreto jogo desta prova, tivesse qualquer jogador europeu no onze titular! De terça a quinta-feira da próxima semana muitas contas se vão fazer. Ficarão a faltar dois jogos e seis pontos para sabermos, de ciência certa, quem fica na prova dos ricos ou quem fica na competição dos remediados. E, ao mesmo tempo, os tesoureiros das sociedades podem antecipar as suas contas. Ou recebem ainda mais, e abertamente sorriem, ou pouco mais arrecadam e, ainda, esboçam um leve sorriso. Ou sentem, com diferentes angústias - no Porto e em Lisboa - que a Europa esta época acabou e, por aqui., houve um Portexit, ou seja, algum Portugal ficou fora da Europa do futebol. O que será, ainda, uma má notícia para o ranking da UEFA e para o futuro próximo na Europa do futebol português. Como nos apercebemos no momento arranque do Mundial da Rússia do próximo ano.

2. A força da Liga inglesa também já chegou à Europa. Os seus cinco clubes participantes na Liga dos Campeões lideram os respectivos grupos. Pode acontecer que no final da próxima jornada esta realidade não se confirme. Seria uma boa notícia para Benfica ou Real Madrid, por exemplo. Em razão dos resultados obtidos e conquistados... Mas o que é real é que os clubes ingleses dominam na Europa e no tempo em que o Reino Unido negoceia a saída da Europa. E dominam com a consciência que investiram 1.500 milhões de euros no último defeso. E que os seus cinco representantes já utilizaram nestas jornadas da Liga dos Campeões 69 jogadores mas apenas 16 - sim dezasseis! - eram ingleses. O Chelsea utilizou apenas um e o Manchester United três. É a força do dinheiro a potenciar lideranças ganhadoras e conquistadoras. Como se vê com o PSG e a sua capacidade goleadora. Também a Europa do futebol é uma Europa a duas ou mais velocidades. E, infelizmente, o futebol português já está no segundo pelotão. E cada vez mais longe do primeiro e a caminhar dolorosamente para o terceiro... Basta fazermos as contas. Todas as contas mesmo.

3. Esta semana o Doutor Fernando Gomes assumiu na Assembleia da República um verdadeiro discurso acerca do complexo momento do estado do futebol português. Foi um discurso perturbante mas que evidencia, com a autoridade que lhe reconhecemos e a autenticidade que o caracteriza, o tempo fraturante do nosso futebol. Somos, em competição, o melhor da Europa mas somos, em concretização e em ambiente interno, dos, digamos, menos bons da Europa. O ambiente faz-me lembrar a fórmula de um antigo relevante responsável soviético, Idanov, que no princípio da conhecida guerra fria proclamou que «todo aquele que não está por nós está contra nós»! E, desta forma, Moscovo, na altura - como em parte hoje... - delimitava o amigo e o inimigo e assumia, em pleno, as respectivas consequências. Assumamos que no nosso futebol a clivagem entre a Federação e a Liga é real e efectiva. Pedro Proença, que é por inerência Vice-Presidente da Federação, assumiu, na passada sexta feira, que «não tinha conhecimento das propostas da Federação» (!!!) - ou seja das propostas apresentadas na Parlamento pelo Doutor Fernando Gomes - e que gostava que a Liga «fosse ouvida pela Assembleia da República»! Está assumido, e confessado, o inimigo, o verdadeiro inimigo. E importa assumir a divergência que é confronto. Que já alastrou ao sector da arbitragem. Dizendo o Presidente da Liga que não tem «responsabilidade no sector da arbitragem»! Mas com parte relevante da arbitragem a assumir que é amiga da Federação e, logo, inimiga da Liga. E, desta forma, e claramente sinalizando, poderá fazer greve à prova por excelência da Liga, ou seja, à Taça da Liga! Com legítima dor dos CTT, o principal patrocinador desta competição. As clivagens são claras. E só com alguma generosidade se aceita que tudo possa continuar na mesma... Mesmo muita... Estas são, de verdade, as nossas contas... que não é nosso consolo! Como se fossem reais aquelas palavras de Ambrose Bierse no seu Dicionário do Diabo quando nos diz que «consolação é o facto de saber que alguém melhor do que nós está mais infeliz do que nós»...

4. Na próxima terça-feira a quase totalidade dos jogadores do Benfica irá pisar, pela primeira vez, um dos Estádios mais emblemáticos da Europa e do Mundo, Old Trafford. Terá de ser um momento de clara superação e com permanentes instantes de concentração. Pisar aquele relvado e sentir aquele ambiente é um sonho de qualquer profissional de futebol. E de qualquer verdadeiro amante de e do futebol. Todos desejamos e ambicionamos que sejam noventa minutos para recordar. E a «recordação é o perfume da alma». De uma alma que sente, sempre, uma chama imensa. E intensa!

5. Ver um Estádio quase deserto é uma dor de alma. Ver um lindo Estádio quase sem espectadores é desesperante. Foi o que me aconteceu ontem ao olhar para o Estádio do Restelo."

Fernando Seara, in A Bola

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