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sábado, 4 de maio de 2019

O que se pode ou não festejar

"Julgo interessante tentar perceber o que sentem os adeptos nos finais de época, especificamente os das equipas que lideram, como no caso os benfiquistas. Refiro-me às ansiedades de ir na frente, às necessidades de esclarecer, como ocorreu com a vitória em Braga, que o festejo é contido e referente tão-só àquilo. «Já se veem campeões», aferroam os rivais, constrangendo, forçando uma culpa por comemorar. É como se estes benfiquistas temessem celebrar o que quer que seja, vivam nesse afogo.
Qual é em todo o caso a extensão da felicidade nestas zonas de decisão no futebol? Festeja-se um golo, a vitória no jogo ou a liga? Onde começam e acabam aquelas desgovernadas emoções? É difícil descobrir-lhe sentido porque nos parecerá a todos que as pessoas celebram os momentos e nada mais. Só discordará da ideia quem por absurdo lembrar ao amigo em dia de casamento que a nada deve brindar sob pena de um dia vir a divorciar-se.
A verdade é que se o desígnio de felicidade é uma meta, há ainda assim quem a tema, ora por pensar que não a merece, ora por pensar que tê-la antes, ou tê-la de mais, degenerará no contrário, como se se gastasse rápida e forçosamente. Há até uma latência cultural, arriscaria religiosa, na nossa tradição judaico-cristã observável em inúmeras vertentes quotidianas e se calhar nesta, pueril e futebolística, também: a penitência necessária na via para a salvação, evitar o prazer antes do tempo (em vida) na crença de algo superior depois (em morte) - uma ilusão, caso me admitam o aparte.
Hoje na Luz creio que bastantes benfiquistas voltarão a sentir que ganhando ao Portimonense podem ter dificuldade em festejar só isso. Ou pelo menos trabalho a explicar que é somente o jogo que festejam."

Miguel Cardoso Pereira, in A Bola

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