"«Não comprem jornais, não vejam canais portugueses com excepção da Sporting TV e que os comentadores do Sporting saiam dos programas.»
Não vejam, não escutem, não saibam. Ignorem, virem costas, abandonem a guerra. Bruno de Carvalho apelou ao boicote geral à comunicação social e, naturalmente, as reacções não se fizeram esperar. Apoio em massa sportinguista, crítica generalizada dos visados, ridicularização dos rivais.
Por incrível que pareça, entendo todos, embora uns mais do que outros.
Não me parece, por exemplo, que seja um pedido mais anedótico do que o protagonizado por Luís Filipe Vieira quando, há uns anos, pediu aos benfiquistas para não assistirem aos jogos fora de casa. Acho, até, que as mesmas declarações teriam menos eco se ditas por um presidente de outro clube, mas é assim porque Bruno de Carvalho contribui muito para isso. A importância que dá a questões menores no seio do clube, o estilo popular e bastantes exageros comunicativos tornam-no um «alvo» fácil. Basta lembrar a quantidade de figuras que eu, admito, nem sabia que existiam, a que se deu ao trabalho de responder na abertura da Assembleia-Geral.
De igual modo, se as intenções de Bruno de Carvalho tiveram um apoio de quase 90 por cento, não me espanta que grande parte desse número continue por trás do seu líder quando chega um pedido deste género. Mesmo que, sublinhe-se, me pareça que a maioria faça pouca intenção de cumprir religiosamente o acordo, até a avaliar pelos comentadores que continuam confortavelmente sentados.
Ora, a parte que mais me interessa é, naturalmente, a dos visados. O estado do jornalismo e um suposto tratamento diferenciado dado ao Sporting. Um pouco à semelhança do que acontece com os árbitros, todos dizem que é tudo para os outros.
Parece-me, porém, que as pessoas estão mais interessadas em discutir jornalistas do que jornalismo. E, muitas vezes, colando o rótulo de jornalista a qualquer pessoa que fale na televisão. Há uma falta de noção gritante do que é o trabalho no terreno, ideias pré-concebidas que não fazem qualquer sentido e, claro, maus exemplos. Tropeço neles quase todos os dias, como, provavelmente, também pode haver quem os aponte no meu trabalho.
Mas não é um exclusivo do jornalismo. Quando vai a uma loja de roupa vê o que gosta, o que não gosta e escolhe o melhor. Ou será melhor andar nu porque três ou quatro pares de calças da montra estão claramente fora de moda?
Uma coisa é óbvia: os canais oficiais dos clubes não são solução. E isto é transversal a todos: não me parece que alguém possa ficar devidamente informado sobre tudo o que diz respeito à realidade do seu clube apenas através dos meios oficiais. E não é por falta de profissionais de qualidade: há bastantes, em todos os canais. É, isso sim, porque há temas que não interessa informar.
É da condição humana a predilecção por boas notícias em detrimento das más, excepto, claro, se nada tiver a ver connosco. É a tal atracção pelo acidente alheio que condiciona o trânsito na estrada. Mas isto não deve levar a que se persista numa realidade paralela, com arco-íris, borboletas e dias de sol uns atrás dos outros. Há chuva, há nuvens, há tropeções. Há, enfim, o dia-a-dia.
Os jornalistas têm clube? Claro. Digo até que é desejável que tenham, pois significa que o fenómeno desportivo não lhes passa ao lado e não caíram de para-quedas na profissão. Por outras palavras: gostam do que fazem. Quem não gostaria de trabalhar naquilo que gosta?
Perguntam-me, muitas vezes, se não acho que tudo se resolvia se os jornalistas assumissem o clube. Digo sempre que não. Nada mudaria na forma como se faria o trabalho, mudaria tudo na forma como ele é encarado. Há que haver distância e rigor num mundo onde impera a emoção.
Lamento, mas não concordo com Bruno de Carvalho. Leiam muitos jornais, vejam muita televisão, ouçam rádio, consultem blogues, pesquisem na internet. Resumindo: informem-se. Se não servir para mais nada, irão perceber que, se é tudo é assim tão igual, há uns mais iguais do que outros."
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