"O recente abandono do Conselho de Justiça (CJ) da Federação (FPF) deveria ser pretexto para uma atenção profunda sobre o funcionamento dos órgãos jurisdicionais do futebol. Algo mais penetrante do que o mero registo jornalístico do facto (por si só caricato na forma atabalhoada da “demissão coletiva” dos seus membros). Algo que saísse da mera escolha de nomes, da putativa impossibilidade dos juízes, da doentia investigação das preferências clubísticas desses nomes. Em suma, uma estratégia.
O primeiro dado para essa análise é a instabilidade dos órgãos. Vejamos o caso do CJ da FPF. Só neste mandato de Gilberto Madaíl o CJ terá quatro presidentes. Com as sucessivas mudanças de lideranças e das equipas constituídas no “supremo tribunal” do futebol, as consequências são profundamente lesivas da estabilidade das competições. Relembro que no CJ “cai” – ou “pode cair” – tudo: desde o castigo sumário dos campeonatos até às deliberações da Comissão Executiva da Liga ou da Direção ou do Conselho de Arbitragem da FPF. É neste órgão, por isso, que mais se pede uniformidade de critérios ao longo dos anos, em especial nas questões relativas aos “casos recorrentes” e “típicos”. Isto é, que se fizesse “jurisprudência”, que, mal ou bem, sempre transporta consigo o valor da segurança jurídica.
O segundo dado é a falta de coordenação. As lideranças destes órgãos devem ambicionar internamente um sistema credível de decisão. Um sistema que respeite a individualidade da deliberação de cada um dos seus membros, mas que a integre na orientação antecipada do órgão julgador em matérias estruturantes. Um exemplo: no que toca à prescrição da responsabilidade disciplinar, não se pode decidir num sentido quando um processo é distribuído por um dos membros e decidir em sentido oposto quando um outro processo é distribuído a outro dos seus membros. Aconteceu no CJ. Não pode ser. Ninguém percebe com o que conta.
O terceiro é a falta de fundamentação. Os órgãos de justiça desportiva não podem viver de parágrafos soltos e excertos incompreensíveis. Têm que ser uma referência na interpretação da lei desportiva e dos regulamentos e legitimarem-se pela bondade técnica. Dá trabalho e exige muita dedicação? Claro – como tudo o que, na vida, é feito com rigor.
O quarto é a falta de transparência. Devemos sempre conhecer, até porque a lei o impõe, as decisões e o seu percurso. Conhecer como deve ser, seja pela exposição sumária dos seus fundamentos de facto e de direito, seja pela publicação dos acórdãos mais significativos. Ainda hoje me dizem que o futebol não merece isto, porque o facciosismo a tudo se sobrepõe. Mas tenho como certo que a opacidade não provou ser o melhor caminho.
Estabilidade, coordenação, fundamentação e transparência. Ainda é tempo de acrescentar a iniciativa, porque há quem pense que estes órgãos só funcionam empurrados por queixas e participações – e não é assim!
Seria bom que a federação pensasse nestas cinco palavras, em especial para um CJ moderno, sem condicionalismos e com “resistência psicológica”. Porventura se falasse menos, então, de “tribunal desportivo”."
O primeiro dado para essa análise é a instabilidade dos órgãos. Vejamos o caso do CJ da FPF. Só neste mandato de Gilberto Madaíl o CJ terá quatro presidentes. Com as sucessivas mudanças de lideranças e das equipas constituídas no “supremo tribunal” do futebol, as consequências são profundamente lesivas da estabilidade das competições. Relembro que no CJ “cai” – ou “pode cair” – tudo: desde o castigo sumário dos campeonatos até às deliberações da Comissão Executiva da Liga ou da Direção ou do Conselho de Arbitragem da FPF. É neste órgão, por isso, que mais se pede uniformidade de critérios ao longo dos anos, em especial nas questões relativas aos “casos recorrentes” e “típicos”. Isto é, que se fizesse “jurisprudência”, que, mal ou bem, sempre transporta consigo o valor da segurança jurídica.
O segundo dado é a falta de coordenação. As lideranças destes órgãos devem ambicionar internamente um sistema credível de decisão. Um sistema que respeite a individualidade da deliberação de cada um dos seus membros, mas que a integre na orientação antecipada do órgão julgador em matérias estruturantes. Um exemplo: no que toca à prescrição da responsabilidade disciplinar, não se pode decidir num sentido quando um processo é distribuído por um dos membros e decidir em sentido oposto quando um outro processo é distribuído a outro dos seus membros. Aconteceu no CJ. Não pode ser. Ninguém percebe com o que conta.
O terceiro é a falta de fundamentação. Os órgãos de justiça desportiva não podem viver de parágrafos soltos e excertos incompreensíveis. Têm que ser uma referência na interpretação da lei desportiva e dos regulamentos e legitimarem-se pela bondade técnica. Dá trabalho e exige muita dedicação? Claro – como tudo o que, na vida, é feito com rigor.
O quarto é a falta de transparência. Devemos sempre conhecer, até porque a lei o impõe, as decisões e o seu percurso. Conhecer como deve ser, seja pela exposição sumária dos seus fundamentos de facto e de direito, seja pela publicação dos acórdãos mais significativos. Ainda hoje me dizem que o futebol não merece isto, porque o facciosismo a tudo se sobrepõe. Mas tenho como certo que a opacidade não provou ser o melhor caminho.
Estabilidade, coordenação, fundamentação e transparência. Ainda é tempo de acrescentar a iniciativa, porque há quem pense que estes órgãos só funcionam empurrados por queixas e participações – e não é assim!
Seria bom que a federação pensasse nestas cinco palavras, em especial para um CJ moderno, sem condicionalismos e com “resistência psicológica”. Porventura se falasse menos, então, de “tribunal desportivo”."
Ricardo Costa, in Record
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