Últimas indefectivações

segunda-feira, 15 de março de 2021

A linha ténue entre apoiar e exigir


"Estádio da Luz, Lisboa, 23 de Maio de 2015.
Poucos minutos passam das 21 horas quando Luisão levanta a taça de Campeão perante uma Luz extasiada de alegria. Sessenta mil benfiquistas celebram batendo palmas, gritando e cantando o "We are the Champions". Um daqueles momentos em que o tempo pára e tudo parece belo. Em que se sente que tudo está bem quando acaba bem e a vontade é de engarrafar este momento e levá-lo no coração para todo o sempre. Mas passada a euforia do momento, da música tocada a altos berros nas colunas de som, dos abraços e cumprimentos, os gritos e as palmas abrandam. E por momentos faz-se silêncio. Até que suavemente, ao de longe, lentamente, começa-se a ouvir... 
"Benficaaaaaa...Benficaaaaaa...Benficaaaaaa...dá-me o trinta e cincoooooo!"
E de repente todo o estádio entoa o cântico, repetindo até à exaustão: 
"Benficaaaaaa...Benficaaaaaa...Benficaaaaaa...dá-me o trinta e cincoooooo!"
Como era possível? Luisão acabara de levantar a taça do 34, nem cinco minutos tinham passado e o povo já pedia o 35? Seria isto fruto de gente ingrata? Mimada? Precipitada? Com ambições sem sentido? Não! Apenas expressavam o que lhes foi ensinado por avós, pais e mães. Sentiam o que lhes corre nas veias, o ADN da raça Benfiquista. É que no Benfica não se conta espingardas em tempo de guerra, no Benfica a ambição faz todo o sentido, no Benfica quer-se sempre mais, no Benfica o objetivo é sempre ganhar o próximo. Ganhar no próximo ano. Voltar a ganhar. Outra vez ganhar. E mais uma vez ganhar.
Não significa que as pessoas não estejam gratas, não sejam racionais, não compreendam que nem sempre é possível. Mas a vontade férrea tem de ser essa. Vencer sempre. É uma lição que é importante recordar à "estrutura": A conversa do "não se pode ganhar sempre", do "até já fomos tetra", do "Benfica no passado também perdeu", do "os outros também estão a ter más épocas" é a antítese do que é o clube que após derrotar em 1907 a invencível armada Inglesa do Cabo Submarino ganhou a alcunha de "Glorioso", expressão que atravessou gerações até chegar aos dias de hoje. Quem serve o Benfica tem que ganhar tempo a escrever 45 razões para encontrar o sucesso e não perder tempo a escrever 45 desculpas para justificar o insucesso. E tem que entender que as críticas e a oposição fazem parte de uma democracia e que existem muitas e justificadas razões para elas. Que a época está a ser um falhanço estrondoso e inaceitável. E que responsabilidades têm que ser assumidas.
Estádio da Luz, Lisboa, 23 de Outubro de 2015.
Minuto 70 do derby entre Benfica e Sporting. O clube visitante vence por uns escandalosos 0-3 o clube da casa, que se encontra humilhado em campo. Raras vezes os adeptos da altiva águia tinham sentido esta sensação de impotência, de domínio, de esmagamento por parte do rival do outro lado da 2ª circular. Um daqueles momentos em que o tempo pára e tudo parece horrível. Em que se sente que quando tudo está mal vai mesmo acabar mal e a vontade é de engavetar este momento e escondê-lo do coração para todo o sempre. Mas passada a depressão do momento, do "Bailando" cantado a altos berros pelos adeptos rivais, dos suspiros e resmungos, os impropérios e os assobios abrandam. E por momentos faz-se silêncio. Até que suavemente, ao de longe, lentamente, começa-se a ouvir...
"La la la la...eu amo o Benficaaaa...la la la la...eu amo o Benficaaaa! BEN-FI-CA!"
E de repente todo o estádio entoa o cântico, repetindo até à exaustão:
"La la la la...eu amo o Benficaaaa...la la la la...eu amo o Benficaaaa! BEN-FI-CA!"
Como era possível? Téo Gutierrez, Slimani e Bryan Ruiz tinham marcado três golos ainda nem à meia-hora e o povo cantava que amava o Benfica. Seria isto fruto de gente louca? Desfasada? Conformada? Submissa ao status-quo? Não! Apenas expressavam o que lhes foi ensinado por avós, pais e mães. Sentiam o que lhes corre nas veias, o ADN da raça Benfiquista. É que no Benfica unimo-nos quando somos atacados de fora, no Benfica nunca há hesitações no amor ao clube, no Benfica nunca se desiste, no Benfica sabemos sempre que se ele cai lá estaremos para o levantar de novo, no Benfica podemos andar às turras entre nós, mas sabemos sempre que um valor mais alto se levanta.
Não significa que as pessoas não sejam exigentes, não apontem o dedo, não exijam responsabilidades a quem está lá dentro. Mas a vontade férrea tem de ser essa. O Benfica acima de tudo. É uma lição que é importante recordar a nós adeptos. A conversa do "Benfica devia perder para ver se aquela gente sai dali para fora", do ir escrever para o Instagram dos jogadores "Seu cepo, não vales nenhum", do dizer "Otamendi é um infiltrado do Porto e Jesus quer destruir o Benfica" é a antítese do que é uma das melhores massas adeptas do mundo, que se deslocava aos milhares atrás do clube a todo o lado, que embalou dirigentes, treinadores e jogadores para inúmeras conquistas. Os Benfiquistas têm de ser os adeptos que constroem um clube melhor através de uma democracia saudável onde se questiona os dirigentes, aponta-se falhas, apura-se responsabilidades, indicam-se caminhos e não os adeptos que mandam abaixo o clube com uma guerra civil onde impera o ódio, a ausência de troca de ideias e a violência verbal. Queremos revolucionar o clube? Mudar os seus dirigentes? Façamo-lo com inteligência, com nível e com sentido de responsabilidade.
Vamos no "minuto 70" desta temporada 2020/21? Pois cantemos agora, repetindo até à exaustão, o "Eu amo o Benfica". E cinco minutos depois de Jardel levantar a Taça de Portugal em Coimbra? Cantemos, repetindo até à exaustão, o "Benfica, dá-me o 38!""

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