"Foi grande a expectativa colocada nesta viagem da águia e quando se previa que ela fracassasse, por vários factores, a verdade é que triunfou, e bem
O jogo da Feira foi didáctico por ter ajudado a perceber que, embora a vitória na maratona do título esteja ser discutida por dois, e ao alcance ainda de mais dois, há outros intervenientes a correr por fora e que tentam interferir no desenrolar da própria corrida.
No quadro de evidente bipolarização que define o futebol português, com duas grandes potências que se sobrepõem às restantes, é natural a tentação de perverter uma desejável neutralidade e resvalar para uma posição menos aceitável, mas compreensível, de aproximação a um dos candidatos ao título, desde que seja respeitada a fronteira do razoável, o que parece não ter acontecido no camarote presidencial do estádio do Feirense, ao ponto de Luís Filipe Vieira abandonar o local em consequência do ambiente reprovável que lhe foi criado.
Num camarote presidencial não há anónimos nem clandestinos. Quem lá entre tem nome, está identificado. Neste caso, com certeza que é conhecido quem molestou o presidente do Benfica e o cargo que detém na estrutura directiva do Feirense.
O jogo da Feira foi didáctico também porque permitiu ver uma equipa pré-condenada à despromoção que não estaria no lugar em que está se tivesse conseguido manter no seu campeonato os níveis competitivos exibidos nos mais recentes encontros diante do FC Porto (25.ª) e, sobretudo, frente ao Benfica (28.ª). Mas isso são contas de outro rosário e têm a ver com o processo de substituição de Nuno Manta Santos, podendo verificar-se agora, em função dos resultados, que o problema não estaria tanto na figura do treinador, nem sequer na qualidade do plantel.
É estranha, por isso, a reacção do actual mister feirense. O mesmo que ainda não conseguiu ganhar um jogo na Liga: «... no balneário há muita gente desiludida e destroçada. Não merecíamos perder, muito menos por 1-4».
Extraordinário. Por curiosidade, gostaria de saber como se sentiu o balneário na semana anterior, depois da derrota, também em casa, com o Vitória de Setúbal. Deve ter havido crises de ansiedade e gente a precisar de assistência hospitalar...Acredito que Filipe Martins teria dito outra coisa se tivesse ponta de humildade (ou de coragem?) para aceitar que ainda não tem carreira, nem estatuto para se meter onde não é chamado. Há ocasiões em que o silêncio é a melhor das soluções e esta foi uma delas.
Na primeira volta, no jogo com o FC Porto, no Dragão, aí, sim, o Feirense, ao ver um golo anulado de uma forma enviesada (esse mesmo, o de Felipe), devido a uma trapalhada que deixou desfocados árbitro, árbitro assistente e VAR, mesmo assim, com razões de queixa, Nuno Manta Santos afirmou: «Não falo da arbitragem».
Nem o Feirense se indignou como desta vez, através de estrambólico escrito, que de tão pungente e ofendido dá a ideia, para quem ande distraído, que o presidente e o futuro do clube se esboroaram neste jogo com o Benfica. Nada disso, tão-somente em obediência a uma política de boa vizinhança com quem lhe comprou um guarda-redes, que pouco utilizado é, por um milhão, teve o cuidado de mostrar de que lado está, sublinhando a sua fidelidade à campanha anti-Benfica.
Filipe Martins, sem aquelas nem outras razões, conforme rezam, maioritariamente, as opiniões de especialistas sobre arbitragem, terá pretendido agradar a quem quis que este jogo fizesse história. E fez, mas em sentido contrário ao desejado. Foi grande a expectativa colocada nesta viagem da águia e quando se previa que ela fracassasse, por vários factores, a verdade é que triunfou, com vantagem esclarecedora e irrefutável.
Objectivamente, nenhuma melhoria trouxe a mudança técnica operada no Feirense, nem tão-pouco foi prudente o investimento num quase desconhecido que construía a sua carreira no Campeonato de Portugal e mão amiga o puxou para cima, mesmo sem apresentar qualificação para tal.
Diz o povo que o comboio pode não passar duas vezes pela mesma estação, de aí Filipe Martins ter aceitado, no convencimento de estar a dar um passo em frente. Há momentos de sorte e o jovem treinador apostou, mas, como também já deve ter compreendido, o seu bilhete não teve prémio.
Vamos ver se a seguir ao passo em frente não será forçado a dar dois atrás. Basta olhar em redor e reparar nos exemplos de percursos interrompidos cedo de mais por causa de ultrapassagens imprudentes, feitas em excesso de velocidade."
Fernando Guerra, in A Bola
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