"Não estamos habituados a ouvir esta frase, muito menos a dizê-lo entre portugueses, mas quando alguém de fora entra a desfazer, aí puxamos pelo argumentário e vamos desfilando vantagens de invejar meio mundo.
No entanto, é bem diferente quando falamos com imigrantes de várias partes e ouvimos dizer que nos queixamos muito e sobre quase tudo, mas que temos uma vida tranquila, pacata e boa como há em poucas partes.
Estas considerações vêm a propósito da forma como somos vistos por aqueles que procuram o nosso país em desespero porque a guerra, o ódio ou o radicalismo já não lhes permite serem cidadãos na sua própria pátria.
Na nossa memória colectiva estão os exilados políticos do Estado Novo e os refugiados dos novos países africanos que nasceram com o fim do império colonial. Foram acontecimentos duros e traumáticos, para os próprios e para a sociedade portuguesa, mas, apesar de tudo, não atingiram os patamares de violência e crueldade que enchem diariamente os telejornais, mesmo descontando a diferença abissal face aos nossos dias em termos de exposição mediática. Quem vem de regiões exangues pela guerra como o Magebe e o Médio Oriente ou da África Subsariana, para ficarmos só por África, encontra em Portugal a mais saborosa das recompensas: a segurança!
Para os portugueses, no entanto, é difícil imaginar a vida truncada de um dia para o outro pelos acontecimentos da guerra, a família destroçada, filhos perdidos, vizinhos desaparecidos, empregos desfeitos, lutas diárias pela água e pelo pão que há muito deixaram de estar garantidos.
Para os jovens e crianças, a fragilidade da sua condição amplia os problemas, interrompe-lhes os estudos, leva-lhes os amigos, obriga-os a fugir e a sobreviver sem lançar raízes em parte nenhuma quando a idade pede sonhos e a realidade impõe pesadelos.
Fugiram a pé, em contentores e caixas de camiões, apanharam boleias, subornaram, trocaram haveres, passaram por situações que querem esquecer, mas chegaram ao mar e reuniram o necessário para comprar meio metro quadrado em qualquer coisa que flutuasse e navegaram com o coração nas mãos à espera do milagre da chegada.
Mas chegaram, e o destino trouxe-os a Portugal, muito vezes sem que esse fosse o seu objectivo principal. E então descobriram um país onde a violência não é regra, onde o clima é ameno e as pessoas querem e sabem acolher. Como qualquer rosa tem espinhos, mas esses são de pouca monta depois do calvário que passaram, por isso abrem sorrisos e dizem à boca cheia 'Portugal é espectacular!', ganham crescentemente um sentimento de gratidão e de pertença, reganham confiança e voltam a sonhar. Muitos querem ser portugueses, e, para além da escola, o desporto é uma grande máquina integradora que pode ajudá-los a tirar partido do privilégio que foi terem aportado ao nosso país e pode também ajudar Portugal a tirar da sua gratidão e do seu potencial o melhor partido. Afinal somos um país feito de mundo e temos no nosso universalismo a nossa maior força. Só assim se explica que um país tão pequeno tenha um fenómeno clubístico como o Benfica e que um clube desta grandeza abra as portas e dedique atenção desta maneira a um punhado de jovens. Merecem-nos tudo, e nós sabemos disso: Carrega, Benfica!"
Jorge Miranda, in O Benfica
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