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quinta-feira, 13 de novembro de 2025

O caso Schjelderup: um alerta para levar a sério


"Espera-se que o que se passou com Schjelderup sirva de exemplo, não só para ele - que parece ter-se apercebido da dimensão do seu erro -, também para colegas, familiares e amigos.

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“Recebi um pequeno vídeo e, sem pensar duas vezes, reencaminhei-o para um amigo alguns segundos depois. (…) Infelizmente, naquele momento, não pensei nas consequências, nem que poderia ser ilegal partilhá-lo. (…) Foi um erro estúpido e pontual, do qual me arrependo profundamente (…). Não tenho desculpas. O que fiz (…) foi ilegal e não está certo. Assumo total responsabilidade por isso e espero que o meu erro possa levar outras pessoas a não cometerem o mesmo erro depois de ouvirem ou lerem a minha história. Espero que pensem duas vezes antes de partilhar algo que não deve ser partilhado”.
As palavras são de Andreas Schjelderup, futebolista norueguês do Sport Lisboa e Benfica, que foi recentemente acusado do crime de partilha de conteúdo sexual de menores pelas autoridades da Dinamarca. Mas devem merecer a reflexão da generalidade dos leitores – particularmente, daqueles que não se encontram cientes da gravidade deste tipo de práticas.

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Para que fique claro: não é intuito do presente artigo tecer juízos de valor sobre o caráter do jogador em causa – que não conheço pessoalmente, e por quem, aliás, até nutro alguma simpatia do ponto de vista desportivo, enquanto sócio do Sport Lisboa e Benfica. O que se pretende é tão-só alertar para o facto de a sua conduta configurar um crime – não apenas na Dinamarca, onde ele foi acusado, mas também em Portugal, onde situações semelhantes tendem a repetir-se praticamente todos os dias, de uma forma cada vez mais «normalizada».
Efetivamente – e fruto das alterações introduzidas pela Lei n.º 26/2023, de 30 de Maio -, a redação do art. 193.º do nosso Código Penal é hoje inequívoca: “quem, sem consentimento, disseminar ou contribuir para a disseminação, através de meio de comunicação social, da Internet ou de outros meios de difusão pública generalizada, de imagens, fotografias ou gravações que devassem a vida privada das pessoas, designadamente a intimidade da vida familiar ou sexual, é punido com pena de prisão até 5 anos”. Sublinha-se: “quem (…) disseminar ou contribuir para a disseminação (…)”. Para efeitos da disposição supramencionada, deverá considerar-se punível tanto o agente que promove a disseminação inicial das imagens, como todos aqueles que, a posteriori, concorram para aumentar o alcance dessa disseminação – designadamente, através de atos tão simples como o perpetrado por Schjelderup, ao reencaminhar o vídeo que lhe havia sido originalmente remetido por um amigo para outras pessoas da sua rede de contactos.
De resto, percebe-se que assim seja. Afinal, ponto é que aquilo que para uns é um gesto aparentemente insignificante – uma simples partilha de algo que já se tornou público –, para a vítima representa uma machada mais nos seus direitos e liberdades fundamentais. É que cada partilha abre a porta a novas visualizações. E cada nova visualização determina um grau adicional de exposição da sua vida privada perante terceiros. Circunstância tanto ao mais grave quando esteja em causa a divulgação de conteúdos particularmente sensíveis, tais como imagens ou vídeos de cariz sexual – mais ainda, quando essas imagens ou vídeos digam a respeito a menores de idade, como no caso em análise.

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Espera-se, pois, que o que se passou com Schjelderup possa servir como exemplo. Não só para o próprio – que, ao que tudo indica, já se apercebeu da dimensão do seu erro. Mas também para os seus colegas, familiares e amigos. E, acima de tudo, para todos aqueles que acompanham a sua carreira – seja enquanto adeptos, seja enquanto rivais. Porque como se lê na página de Responsabilidade Social da Federação Portuguesa de Futebol, “a importância de que o futebol se reveste perante a opinião pública configuram-no enquanto fator de influência para a promoção e desenvolvimento de ações de cariz social”.
Aproveite-se a exposição mediática do jogador e do lamentável caso em que este se viu envolvido para moldar e corrigir comportamentos – nomeadamente, junto dos mais jovens. Se assim for, poderá até não se apagar o mal que já foi feito. Mas, pelo menos, estarão a criar-se condições para que este tipo de práticas ocorram com menor frequência. Quanto ao mais, caberá aos Tribunais julgar e decidir. Sem entrar em «derivas punitivas». Mas afastando liminarmente a ideia de que o crime compensa. Porque não pode compensar. Não pode haver espaço para o benefício do infrator num Estado de Direito Democrático."

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