"Três derrotas, um empate, uma vitória e uma eliminação da Liga dos Campeões depois, o Benfica ganhou (3-0) ao Zenit, na última jornada da fase de grupos e garantiu que continuará na Liga Europa jogando com muito espaço e à boleia de Gabriel, Taarabt e, sobretudo, de Pizzi para o aproveitar
Já batemos e rebatemos a fábula que é esta Liga dos Campeões para o Benfica. Pelas impressões, são sempre elas que ficam, a desventura ficará como aquela rocambolesca vez em que, antes de o cântaro ir à fonte, já presidente, treinador e clube vertiam litros de água esperançosa cá para fora, enchendo baldes com vontade em fazer uma prova condizente com a “dimensão europeia” do clube.
Olharam para um conceito abstracto, feito com dois títulos reais nos anos 60, várias finais perdidas e uma chegada aos quartos-de-final fresca na memória, fizeram por inflacionar as expectativas e, no topo, colocaram a ideia de fazer crescer tudo isto com mais miúdos fabricados no Seixal que, por mais histórias que lhes contassem, desabituados estavam a pisar a prova em que só o hino já arrepia.
Uma derrota, outra derrota, uma vitória, de novo uma derrota e um empate depois, a dimensão do Benfica circunscreveu-se, cinco jogos depois, a lutar por uma repescagem para a Liga Europa, condicionado por resultados de terceiros e a puxar por três particulares jogadores, contra um Zenit desorganizado sem bola, por vezes com toda um mundo por explorar entre as linhas de defesas e médios, com futebolistas afastados uns dos outros para haver compensações.
E Gabriel bailava com tempo, os dois braços abertos e suspensos, como as pontas dos dedos sentissem água gélida, variando jogadas com passes longos. Taarabt, não pressionado, sempre com espaço para receber e rodar, batia adversários com passes rasteiros, ligando a equipa à área quando o centro da decisão não estava em Pizzi, o crónico fabricador de tabelas que mais acelera qualquer forma de atacar da equipa.
O Benfica rematou por ele, à entrada da área, por Chiquinho servido por ele, no minuto seguinte, e durante quase meia hora manteve-se a pressionar os russos uns contra os outros, tendo cinco ou seis jogadores diferentes, constantemente, a tocar na bola nos últimos 30 metros.
Mas, fora um livre top spin de Grimaldo, a bola não era finalizada na baliza e Vinícius, o finalizador recente, só tocava nela para tabelar ou ir buscar rasgos de passe de Taarabt.
O Zenit só se compôs da desorganização quando sacudiu a mansidão vinda, quiçá, de empate, vitória ou até derrota se lhe poderem servir para sobreviver na Champions. Quando mais gente ousou esticar corridas até as bolas que Dzyuba dominava, segurava e protegia da pressão, um remate do iraniano Azmoun rasou o poste direito no fim de uma transição a trote dos russos - a que os jogadores do Benfica reagiram a passo.
O problema, já com barba de alguns meses, foi tapado com área ao primeiro minuto da segunda parte, quando Ivanovic não interceptou um cruzamento de Gabriel e, sem médios a cobrirem a entrada da área, a bola chegou a Vinícius, que se virou para a baliza e a passou a Pizzi, que cruzou rasteiro para um Cervi isolado pelos olhos que os centrais do Zenit não tiveram para os espaços na área.
Nem 10 minutos depois, uma mão na área expulsava Douglas Santos, os russos perdiam um lateral esquerdo, Pizzi ganhava um penálti e o Benfica um 2-0 tranquilizador e, sejamos bruxos, sinalizador para se agarrar à bola e amansar o Zenit com ela. Passando-a, concentrando-a num lado do campo, atraindo a pressão e filtrando-a, depois, rápido para onde está o espaço.
Os só 10 jogadores do Zenit concederam-no, cada vez mais, a cada minuto, porque o Benfica abusou, ainda mais, dos pés extrovertidos e sociáveis de Taarabt e Pizzi, fez os russos correr atrás da bola e não de adversários a correr com ela, cansou-os e dominou-os através da posse de bola.
Pacientes, não se precipitando e arriscando, com justificação, só perto da área, os jogadores tricotaram passes pela relva e, resumindo, geraram coisas. O central Osorio teve elasticidade de yoga para evitar um golo de Cervi, quase na linha. O pé esquerdo de Vinícius finalizou, à bruta, dois remates que deram canto. E, num deles, Azmoun desviou para a própria baliza a bola que tentou evitar que entrasse na zona do primeiro poste.
Antes, só um chutão que a gravidade abateu sobre Dzyuba o fez arrancar um canto, em que a marcação à zona do Benfica foi estática, o mesmo iraniano rematador apontou à baliza certa e só a mão de Vlachodimos reagiu, evitando o golo que, nos últimos cinco minutos, muita trepidação teria injetado na Luz - porque, às tantas, o Lyon empatou com o Leipzig no outro jogo do grupo e, sofrendo um golo, a equipa de Bruno Lage teria de vencer por três de diferença.
Nesta altura, já Pizzi se encostara ao banco com sede nos gestos, pediu água, hidratou-se e manteve-se em campo como nunca acontecera, esta época, na Liga dos Campeões, onde o espaço e o tempo diminuem em proporção inversa à exigência que aumenta, fazendo o tipo que mais tabelas, passes, ligações e acelerações de jogadas provoca e, enfim, mais jogo gera, ganhar importância numa equipa que, aqui, clama por jogadores que se elevem à dimensão da circunstância.
O Benfica ganhou na contagem certa de golos para cair da Liga dos Campeões e evitar uma queda chapada, com estrondo, no chão, para aterrar sobre o amparo da Liga Europa.
É aí que a mentalidade, de que o trintão Pizzi falou - entre o “temos que nos soltar mais” e o “povo português que limita-se um pouco a fazer o normal”, terá sido outra forma de mencionar, subtilmente, coisas como pedalada e acusar a pressão -, passará a ter que jogar.
Na espécie de segunda divisão das competições europeias, onde a noção europeia do Benfica, esta época, mais hipóteses terá de se sobrepor a adversários e ter uma aventura condizente à dimensão do clube, que a construiu chegando longe em provas da UEFA. Seja ela qual for."
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