"Os sucessivos episódios de xenofobia nas bancadas exigem respostas à altura. Mas palavras e promessas de dureza não chegam: é tempo de agir sem hesitações.
São chocantes - sem dúvida - as imagens do jogo entre a Bulgária e Inglaterra, marcado por cânticos e gestos racistas por parte de um número significativo de adeptos da selecção búlgara. A formação britânica ganhou facilmente por 0-6, mas o jogo quase não chegava ao fim: foi mesmo interrompido duas vezes devido ao que se ia vivendo nas bancadas. Saudações nazis e insultos lamentáveis deixaram a equipa inglesa à beira de um ataque de nervos (mas, já agora, não o suficiente para deixarem de esmagar o adversário com 6 golos sem resposta).
No final do jogo, para piorar as coisas, Krasimir Balakov, seleccionador da Bulgária, decidiu menorizar a situação. Disse o antigo craque do Sporting que «não ouviu» os cânticos racistas, e apontou o dedo ao mau comportamento dos adeptos ingleses. Isto depois de o próprio capitão de equipa Ivelin Popov ter, ao intervalo, tentado apelar a um ponto final naquele comportamento inaceitável dos próprios adeptos.
O episódio colocou a Bulgária numa posição humilhante a nível mundial e já teve consequências: o presidente da Federação demitiu-se, seguindo o «conselho» do primeiro-ministro Bokyo Borisov - ele próprio também já envolvido em pequenos escândalos depois de comentários racistas contra minorias... Hipocrisia à boa maneira populista.
De qualquer forma, depois de assistirmos a um conjunto de fortes reacções por parte de diversas entidades nas últimas horas, apetece perguntar: mas estiveram hibernados até agora? O racismo nos estádios (e no próprio futebol) é um problema de extrema gravidade há décadas! E se as coisas chegaram a este ponto, é também por total inacção das autoridades locais e globais.
Nos últimos anos repetem-se os episódios em inúmeros países, eventualmente de mãos dadas com o discurso racista e xenófobo tão em voga. Hungria, Ucrânia, Rússia, Suécia, Espanha, Sérvia, Eslováquia, Noruega, Inglaterra… A lista continua. Na Polónia, por exemplo, uma investigação aprofundada permitiu perceber que os estádios de futebol do país serviam como excelentes locais de recrutamento para organizações extremistas da direita.
E as respostas parecem sempre… pouco musculadas. Para não as classificar como simplesmente ridículas. Aliás, como refere um artigo de um jornal inglês, os exemplos concretos falam por si. O dinamarquês Bendtner pagou quase 100 mil euros de multa por ter mostrado o logotipo de uma empresa de apostas no festejo de um golo.
Em pleno Euro 2012, os adeptos da Rússia passaram o jogo a fazer sons de macaco sempre que o checo Gebre Selassie tocava na bola. A multa: sensivelmente 30 mil euros. Ainda assim, um pouco mais do que a Federação de Espanha teve que pagar por insultos racistas dirigidos a Balotelli num Espanha-Itália. Percebe-se, portanto, que a mão da UEFA é mais pesada quando estão marcas (e questões de natureza económica) na equação, e mais levezinha quando há episódios xenófobos…
O racismo nos estádios representa um (alarmante) retrocesso social, mas é também um ciclo vicioso que todos temos que combater. As mensagens racistas que certos sectores extremistas querem difundir propagam-se facilmente no calor das bancadas. Ganham força, porque estes comportamentos são muitas vezes desvalorizados e quase «normalizados». Porque alguns encolhem os ombros e olham para o lado, porque outros dizem que, enfim, são manobras para desconcentrar o adversário, e também porque as multas e as punições não estão à altura.
Castigos efectivamente pesados terão outro impacto, e talvez ajudem a tirar das bancadas os miseráveis extremistas. Quando as entidades não fazem a sua parte, tiram força também a quem está no terreno a lutar contra esta triste realidade.
E quem acha que o problema só se vive lá fora, desengane-se. Basta ir ver um jogo qualquer em Portugal, da Primeira Liga aos Distritais. As equipas portuguesas já estiveram na mira da UEFA, FC Porto e Boavista até já pagaram multas. E mais um exemplo, para terminar: o Braga foi punido em 2017 com um jogo à porta fechada por «comportamento racista do público» num jogo frente ao Desportivo das Aves. Já cumpriu?"
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