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quinta-feira, 24 de outubro de 2019

As 10 noites marcantes do SL Benfica europeu

"O Benfica é tão mais feliz nos boémios serões de Paris, Madrid, Turim ou Liverpool. Cosmopolita, requintado e com um gosto especial pelo hedonismo das noites a meio da semana, a história encarnada além-fronteira assenta num mágico conjunto de glórias e peripécias que a fama e o álcool, por vezes, provocam.
O Benfica é um convidado tão assíduo nas cortes do Velho Continente que perderíamos infinidades a debruçar-nos sobre todas as epopeias já escritas. Em dia de confronto decisivo na prova rainha de clubes, aproveitamos para relembrar dez míticas noites que ajudaram à construção do mito encarnado em termos continentais.

1. O primeiro amor (Benfica 2-1 Bordéus) – Estamos em 1949-50 e ainda não existia na Europa uma competição generalizada com todos os campeões: a Taça Mitropa e a Taça Latina eram os exemplos que mais se aproximavam da ideia de Gabriel Hanot, editor do L’Equipe , o grande impulsionador da primeira Taça dos Clubes Campeões Europeus em 1955. No Jamor, e após dois prolongamentos, o Benfica conseguiu levar de vencidos os franceses e arrecadar a primeira competição continental em território português, com recurso a finalíssima e a 134 minutos de prolongamentos sobre prolongamentos.

2. A segunda de onze (Real Madrid 1-0 Benfica) – A 23 de Junho de 1957, o Benfica chega à sua segunda final europeia. Frente ao Real Madrid de Di Stéfano e Paco Gento, e tendo Chamartín como palco, os pupilos de Otto Glória não conseguiram contrariar a força espanhola: 1-0 e uma promessa de vingança que chegaria poucos anos depois. Aquela seria a edição final da Taça Latina, autodestruindo-se aquando da consolidação da Taça dos Clubes Campeões Europeus.

3. O fim dos magyares (Benfica 6-2 Ujpest) – Corria o ano de 1960 e o sorteio ditou em sorte do Benfica os campeões húngaros, o famoso Ujpest, dissertores da escola futebolistíca das margens do Danúbio, de fino recorte técnico e fantasia aos magotes. Apesar da reputação do oponente, os pupilos de Béla Gutmann não se amedrontaram e tal foi a elevação da exibição encarnada que, à passagem da meia hora, o marcador assinalava 5-0. Depois da vitória em Edimburgo sobre o Hearts, na ronda anterior, era a confirmação perante toda a Europa de que o campeão português contava para o Totobola.

4. A primeira nunca se esquece (Benfica 3-2 Barcelona) – Wankdorf, 31 de Maio de 1961. Costa Pereira; Mário João e Ângelo; Neto, Germano e Cruz; José Augusto, Santana, Águas, Coluna e Cavém. São estes os onze imortais que derrotaram o favorítissimo Barcelona e trouxeram na bagagem a primeira Taça dos Clubes Campeões Europeus para Portugal. Um feito histórico e que obrigou o Presidente do Conselho, Dr. Oliveira Salazar, a condecorar todos os elementos da equipa com a Medalha de Mérito Desportivo, o que levou Béla Gutmann a reflectir, num misto de ironia e apreensão: «como posso treinar, na próxima época, 14 comandattori?».

5. Vingança perfeita (Benfica 5-3 Real Madrid) – Já com Eusébio e António Simões introduzidos no contexto da titularidade, aquele Benfica tornou-se na melhor equipa de sempre do futebol português. Cavém de barba farta (em respeito à superstição dos sonhos) a secar Di Stéfano, Puskas em evidência (às custas do grande Germano) na primeira parte e a afirmação de Eusébio perante todo o mundo no segundo tempo, com a final a ser transformada num one man show. Aos 64’ sofre falta para penalty e Santamaría, central espanhol já farto da brincadeira, tenta outros métodos: enquanto o moçambicano ajeita a redondinha, este chega-lhe ao ouvido e grita “Maricón!”, num misto de frustração e raiva. Coluna percebe a confusão na cabeça do miúdo e aconselha “olha, marca golo e chama-lhe cabrón!”. E assim fez: duas vezes.

6. Taça da vergonha (Inter de Milão 1-0 Benfica) – À quarta vez que o Benfica se classifica para a final da Taça dos Clubes Campeões Europeus, há uma decisão provocatória dos membros da organização da UEFA: a final seria em casa do adversário. O Inter de Helenio Herrera esperava-os em San Siro e mil circunstâncias impossibilitaram a vitória. Noite diluviana, relvado transformado em pântano, frango e lesão de Costa Pereira, que obriga o Benfica a jogar com menos um e Germano na baliza a partir dos 12 minutos da segunda parte. Apesar de tudo, a exibição encarnada mereceu ovação geral por parte da equipa e adeptos italianos e, num gesto cobarde, os senhores da UEFA depositaram todas as medalhas a que o plantel tinha direito nas mãos do capitão Coluna. Adolfo Vieira de Brito, reforçando a confiança na equipa com tal demonstração de força, entregou na mesma o prémio de jogo e mandou fazer uma réplica da taça.

7. Eriksson conquista Roma (AS Roma 1-2 Benfica) – Depois de conquistar a Taça UEFA pelo Gotemburgo, aquele jovem sueco constrói uma equipa de sonho em Lisboa. O Benfica de 1982-83 merecia todo o sucesso do mundo: além da gigante qualidade de jogo, a equipa tinha uma personalidade fortíssima, o que permitia disputar a vitória em qualquer estádio. A Roma – equipa de alta estirpe no Calcio e colosso europeu -, disputando no ano seguinte a final da Taça dos Clubes Campeões Europeus com o Liverpool de Ian Rush, contava nas fileiras com as qualidades excepcionais de Falcão, Prohaska ou Conti. Em tarde de sonho, Filipovic inscreveu o nome na história com um bis e a exibição de gala catapultou animicamente a equipa para uma caminhada triunfante até à final da competição, onde o Benfica caiu aos pés do Anderlecht.

8. A coxa de Vata (Benfica 1-0 Marselha) – Diz quem lá esteve que não eram 120 mil nas bancadas de pedra da Luz: eram seis ou 14 milhões, tantos quantos benfiquistas há no mundo. A Catedral estremecia de ansiedade, o 1-2 da bagagem era tão fácil contrariar. A sete minutos do fim, Vata responde a um canto de Valdo e a um desvio de Magnusson com a “mãoxa”, com a “comão”, com todas as partes do corpo que tinha à disposição; o importante era ela entrar lá dentro e adormecer nas redes. O angolano sabia, melhor que ninguém, o quão necessário para a felicidade de uma nação seria aquele golo. Foi o vulcão em erupção de onde brotaram choros e gritos de alegria até ao Prater, palco da final.

9. Com licença, campeão europeu (Liverpool 0-2 Benfica) – O Benfica chegou a Anfield com a margem mínima, apoiada numa “tolada” de Luisão em Lisboa e que se previa muito curta para aquela noite gélida em Liverpool. Dono da Europa, campeão em título depois do épico 3-3 com o AC Milan, Gerrard e Morientes tropeçaram numa equipa bem preparada por Ronald Koeman. Simão, num movimento característico, puxa para dentro e remata em arco: 1-0 a fechar a primeira parte, que deu novo fôlego aos encarnados para aguentar a enxurrada ofensiva do segundo tempo. Num lance fortuito de contra-ataque, Simão começa e Micolli acaba, numa recepção adocicada a passe salgado de Beto, finalizando acrobaticamente para o 2-0. Pedro Sousa, num relato mítico aos microfones da Rádio Renascença, tirava o seu «chapéu de côco».

10. O cerco de Turim (Juventus 0-0 Benfica) – Naquela noite, jogava tudo a favor da Juventus: desvantagem minúscula, jogo em casa e a final no mesmo sítio. Bastaria atropelar aquele Benfica para pôr uma mão no troféu – a outra encarregava-se de despachar Sevilha ou Valência, igualmente insignificantes aos olhos da comitiva italiana, recheada de craques mundiais, que um ano depois marcariam presença na final da Champions. Andrea Pirlo, à La Gazetta Dello Sport, desprezava as hipóteses encarnadas: «lamento muito por eles». Jorge Jesus ouviu, Oblak também; piscaram os olhos em cumplicidade e enquanto um (qual maestro) guiou a equipa a uma exibição colossal numa valorosa lição táctica, o outro foi defendendo remates em catadupa, com a tranquilidade e confiança de um Pirlo, que pensava já estar na final."

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