Últimas indefectivações

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Xiuuuuuuuuuuuu. Não digam nada!

"O futebol português vive acima das suas possibilidades.
A narrativa exige que qualquer análise ao que as finanças dos três grandes nos transmitem a cada três meses comece por uma ideia lapidar: vivem muito acima das suas possibilidades.
No entanto nem todos os três grandes são iguais.
Lembro-me de já há uns dez anos, numa apresentação das contas do FC Porto, o então vice-presidente financeiro Fernando Gomes ter dito que era indispensável, como a UEFA recomendava, que os gastos com pessoal de um clube não ultrapassassem os 60 por cento de receitas operacionais, sem contar nestas com as transacções de jogadores.
Nessa altura, o FC Porto era o que estava mais próximo dessa meta fundamental.
De então para cá muita coisa mudou. A recomendação da UEFA passou a ser mais do que isso, passou a ser um dos critérios de avaliação do fair-play financeiro. Não se deve gastar mais de 70 por cento das receitas em salários (sim, houve um aumento de 10 por cento na margem).
A verdade, porém, é que olhando para os últimos relatórios percebe-se que só o Benfica leva este critério à letra. Os encarnados são os que têm uma folha salarial mais baixa (68 milhões, contra 74 do Sporting e 79 do FC Porto) e são os únicos que conseguem que essa folha salarial não ultrapasse em 70 por cento as receitas operacionais (sem contar com transacções de jogadores).
No caso do Benfica os salários representam 55,8 por cento das receitas, no caso do FC Porto representam 74,5 por cento e no caso do Sporting significam 80,4 por cento.
O que nos diz duas coisas.
Por um lado, o Benfica está a seguir à risca a recomendação da UEFA com mais de dez anos. Por outro, a política desportiva de aposta na formação tem-se traduzido num reequilíbrio das contas, confirmado pela descida do passivo, sem colocar em causa da competitividade desportiva: a equipa lutou até ao fim pelo título e perdeu naquele detalhe em forma de pontapé de Herrera.
No entanto, e mais importante do que isso, como tem sido possível aos clubes continuarem a investir como investem? Basicamente porque as transacções de jogadores reequilibram (ou melhor, aproximam o clube do reequilíbrio) as finanças.
O que nos remete para outra questão.
O futebol português está sobrevalorizado. Há pelo menos quinze anos que está sobrevalorizado. Lembro-me também de, em 2007, ter encontrado um olheiro do Bordéus no Euro sub-21 e lhe ter perguntado que jogador estava a observar.
«Português? Nenhum. Os vossos jogadores são demasiado caros para o futebol francês», respondeu-me ele na altura.
A verdade é que qualquer jovem português que aparece adquire imediatamente um preço muito acima do seu real valor: quinze, vinte, trinta milhões de euros, enfim.
Talvez por isso, a lista de jogadores saídos do futebol português que não corresponderam ao investimento neles realizado está sempre a crescer. João Mário, Gaitán, Jackson Martínez, Adrien Silva, Lindelof, Slimani, Markovic, Quaresma, Mangala, enfim, a lista pode ser grande.
Porquê?
Basicamente porque Portugal lhes dá condições perfeitas. Como dizia um brasileiro não há muito tempo, é normal que os jogadores dos grandes do futebol português deem nas vistas quando custam 5 ou 6 milhões de euros e defrontam adversários que custam 50 ou 60 mil euros.
A verdade é que o desnível do campeonato permite que os melhores jogadores se optimizem. Ao defrontar adversários inferiores, fazem boas exibições, vão adquirindo mais confiança e cada vez fazendo melhores exibições. É uma bola de neve que os deixa no topo de forma. Inclusivamente quando depois defrontam adversários mais difíceis: por exemplo, na Liga dos Campeões.
Portugal anda a enganar? Obviamente que não, os clubes grandes exportam de facto excelentes talentos. Basta ver casos como Ederson, Alex Sandro, Bernardo Silva, Oblak, James, Di Maria ou Rúben Neves. Mas também exportam muitos jogadores sobrevalorizados.
Quando os grandes clubes acordarem para esta realidade, então aquele limite de 70 por cento das receitas operacionais em gastos com o pessoal pode tornar-se dramática.
Mas até lá, xiuuuuuuuu. Não digam nada."

Sem comentários:

Enviar um comentário

A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!