"O Campeonato de Sub-23 é notícia.
No nosso país, já é tradição avançar com novidades sem primeiro se aprofundar uma análise consistente do que existe e procurar formas para aperfeiçoar e eliminar imperfeições.
Fico sempre com a convicção de que teóricos sem prática pensam que o futebol pode ser o que eles pretendem, só por esse motivo: a sua pretensão! Não será presunção excessiva?
Em vez de se resolveram erros e falhas, num movimento imparável, criam-se novos desafios sem que se corrijam as evidências que nos atrofiam.
Inventar passou a moda, a destino e repentes imparáveis, porque mediáticos.
A maior parte das vezes, repetem-se consequências desastrosas: tudo fica mais confuso….
Raramente se privilegia a estabilidade, as reflexões cuidadas e ponderadas sobre custos, investimentos, riscos e vantagens… é mais um tipo de surto febril: vem de repente e pronto, já está.
Ora o futebol, como todas as outras actividades, precisa de análise e de acompanhamento permanente, de ponderação e de profunda reflexão antes do afã de inovar.
As “guerrinhas” de protagonismo, os apetites por destaques noticiosos e financeiros, suportados por um poder praticamente total e sem um controlo efectivo e independente, provocam situações que vão minando confiança, desperdiçando recursos, matando hipóteses de crescimento sustentado.
Vive-se no futebol, nos organismos que o tutelam, como numa passerelle de vaidades meteóricas, a disputar primeiras páginas, não pela “grife” mas por ideias, algumas vezes, demasiado absurdas e sem contraditório.
Importa é que sejam sempre contra algo ou alguém, nunca pelo futebol como prioridade absoluta.
Falta capacidade para entender que a humildade, o diálogo, a sensatez e a sabedoria, são essenciais para compromissos duradouros e vantajosos.
O VAR arrancou apressadamente, sem ser testado de forma segura, com tempo e tranquilidade, não se conseguindo evitar a tempo tantos erros e vícios que acabaram por influenciar resultados de uma competição que se deseja exemplar, até para ganhar impacto internacional.
Curiosamente, a Liga inglesa adiou a entrada dessa tecnologia, até que a mesma comprove a indispensável excelência generalizada. Um bom exemplo a vários níveis!
O que “nasce torto, tarde ou nunca se endireita”.
Mesmo que em menor número do que os acertos, as falhas do VAR potenciaram suspeições, por vezes confirmações de dúvidas inquietantes e um crescimento de violência verbal e não só, que paira no ar e que podem ter subvertido, algumas vezes, a verdade da competição, ainda que inadvertidamente.
Ou seja, com paciência, com acompanhamento, com detecção de pontos fracos e alternativas de aperfeiçoamento, poder-se-ia hoje mostrar ao mundo que sabemos trabalhar bem e que o nosso futebol seria um excelente exemplo na utilização do VAR. Perdemos, para já, essa possibilidade.
Assim não aconteceu, digam o que disserem os mais fervorosos defensores, mesmo escondendo as imperfeições com lóbis mediáticos que, por mais esforçados, não conseguem milagres de ilusão.
Depois surgem sempre problemas: equipas que a justiça obriga a integrar em competições de onde foram expulsas por decisões erradas (com técnicos especialistas que se repetem e continuam a exercer impunemente altos cargos desportivos!), casos e litígios que duram anos e provocam posteriormente muita dificuldade de resolução, prejudicando outros, alterações de quadros competitivos instantâneos, sem darem qualquer importância ao drama de clubes que passam a ter vários meses sem competições, acumulando obrigações contratuais sem receitas, até ao futebol jovem onde muita coisa está mal embora continue silenciado, logo despercebido. E assim vai continuar…
Um dia será tarde e o mal estará profundamente enraizado.
Calam-se vozes contrárias e incómodas com chamadas para cargos e distinções, internacionalizam-se amizades para utilização mediática, abrem-se portas a uma “globalização selvagem”, a um universo de investimentos sem controlo, onde alguns vão minando o jogo, as apostas e os resultados desportivos, a credibilidade de um jogo que sempre foi mágico e brilhante e que se pode tornar bastante obscuro.
Por isso, defendo a realização de auditorias periódicas às entidades que tutelam o nosso futebol (há uma ideia generalizada de que se movimentam muitos milhões sem um controlo seguro, apertado, vigilante e preventivo).
Bastaria nunca esquecer a sina do senhor Blatter e o que se passou na FIFA para ter presente os potenciais riscos de corrupção e de destruição de um património valioso, que exige uma imagem de solidez, de indestrutível seriedade e transparência.
Só assim as grandes marcas aceitam patrocinar e reforçar apoios. Credibilidade e honestidade são critérios em valor sempre crescente.
A desvalorização de campeonatos, além da omnipresente LIGA I, é um facto indesmentível; a distribuição arcaica dos direitos televisivos, nem sempre muito clara e justa, dá a ideia de um país a 5 velocidades: rápido, lento, muito lento, quase parado, a extinguir.
A invenção do campeonato sub-23 sob a égide da FPF, com alguns clubes a aderir de imediato, antes de haver regulamento e formato conhecidos, revela uma forma de estar muito preocupante. Dá a impressão de alinhamento de forças e de estratégia de confronto entre entidades, do que a opção racional por planos consolidados. Curiosamente, nesta altura, ainda sem conhecimento se vai haver um só campeonato ou mais um segundo escalão…
Numa competição da alçada da LIGA, já se coloca a hipótese de grande mudança: uma Zona Norte e uma Zona Sul (regresso a um passado bem distante), com alguns (?) a alegarem o peso das despesas e das deslocações, sem reflectirem com competência nas consequências.
Há uma grande probabilidade de desvirtuar a competição, caso uma zona seja muito mais competitiva do que a outra, logo prejudicando os clubes dessa série.
Como está, a competição tem a sua verdade desportiva garantida e despesas com critério uniforme; com mudança, mais um foco de desestabilização deverá ocorrer, pois haverá prejudicados e favorecidos em função da série em que competirem.
Presidentes da FPF e da LIGA, com diferença de meses, publicaram nos jornais desportivos artigos de opinião que são muito mais do que isso.
Para uns, a admissão de um diagnóstico sem terapia, disfarça um rotundo falhanço e admissão de incapacidade para resolver as questões mais complexas.
Para outros, fica a ideia de mais um jogo de luta pelo “título” que consiga levar não há vitória mas antes à extinção/diminuição de influência do outro “adversário”.
Onde abunda confronto, por mais dissimulado que for, deveria haver cooperação e entendimento.
Trata-se do Futebol e não de questões pessoais de poder, no fundo, pequenas vaidades embora bem lucrativas, num espaço onde ninguém vence e todos perdem, dos clubes aos atletas, dos agentes desportivos aos adeptos do futebol,
E assim, com actores de “curtas- metragens” de qualidade duvidosa, vamos vivendo num ambiente virtual onde à superfície viaja a simpatia, a delicadeza, o sorriso, a modéstia e a educação e nos planos inferiores, tipo universo real, vão guerreiros, intriguistas com intenções destrutivas camufladas que acabam por travar “combates sucessivos”, mesmo que silenciosos, para derrotar o opositor e se possível anulá-lo.
E o futebol, a quem se comprometeram honrar e defender? Palavras descartáveis, porque vazias, ocas…
Se os clubes apresentam dificuldades financeiras em suportar uma equipa sénior e vão heroicamente mantendo os escalões de formação, como será possível criar mais uma equipa (excepto os clubes que já tinham equipas B) com custos acrescidos de inscrição de atletas, despesas com técnicos, jogadores e staff, deslocações e todos os outros pagamentos do dia-a-dia?
Será que se vai permitir a criação de um “parque especial de investimento maioritariamente estrangeiro” com total liberdade e dependência para os nossos clubes? “Barrigas de aluguer”, afinal tema em discussão neste momento na sociedade nacional.
Zona franca para movimentação de jogadores, num “mercado” cada vez mais livre e apetecível para longínquos e desconhecidos investidores?
Divulgam-se ideias (séries regionais, 1.ª e 2.ª divisão, Taça de Portugal específica, provas internacionais) bem como a possibilidade de os jogadores do campeonato sub-23 integrarem a equipa principal.
Recorde-se que em termos de campeonatos, os nossos regulamentos em vigor, apresentam diferenças (como se podem verificar nas provas Taça de Portugal e Campeonatos profissionais). Notar também a ausência de campos em relva natural.
Uma breve nota: James Rodriguez, jogador do Real Madrid emprestado ao Bayern de Munique, participou no primeiro jogo da meia-final da Champions, contra o clube que tem os seus direitos contratuais, porque a UEFA assim determina.
Por cá, jogadores emprestados nas provas da LIGA não podem jogar contra o clube de origem embora o possam fazer na Taça de Portugal. São “especificidades” deste teor que Portugal deveria começar por resolver definitivamente, para contribuir para a eliminação de factores de suspeição.
A UEFA não poderá servir de exemplo?
Quanto ao campeonato de sub-23, como já nos habituaram as entidades que gerem o nosso futebol, o secretismo, a falta de divulgação e de discussão pública alargadas é sempre preterida em favor de planos de “especialistas”.
Infelizmente, o desconhecimento de todas as variantes e a capacidade para sentir e entender o futebol, para além do negócio, têm sido responsáveis por retrocessos que o tempo futuro acabará por revelar em toda a sua vasta extensão.
O lamentável é que o futebol acabe por ter de pagar os erros dos que entretanto saberão sair, na melhor ocasião, para outros destinos, sempre sem responsabilização.
A pirâmide do futebol é hoje mais uma falácia que, com a urgência possível, precisa de apoio dos que defendem o futebol-jogo para o salvaguardar de aventureirismos imparáveis, que as escolhas para acolher os Mundiais revelam na plenitude.
É chegada a hora da afirmação das ideias, da divulgação das críticas e dos erros sistemáticos, e do fim dos silêncios cúmplices, estratégicos ou receosos.
O futebol precisa de contraditório, de portas abertas, de planos adequados para futuros favoráveis (Portugal abunda em talento para o jogo) e de coragem para um maior debate sem as incomodidades de dependências, sejam quais forem.
São diversos os sintomas doentios que têm de ser tratados antes de se tornarem epidemia.
Há vírus que estão a moda: divulgação de denúncias anónimas à Procuradoria Geral da República, com objectivos que todos sabem ser invenções na hora, mas que vão minando os alicerces do futebol.
Neste caso, não pode haver quem proteste e quem bata palmas, pois todos serão vítimas.
A indignidade e cobardia do anonimato, sem indícios válidos, em momentos e datas precisas, merecem uma persistente investigação que permita identificar a fonte das evidentes falsas notícias, com a celeridade máxima.
Só com medicação adequada se pode conter a infecção com que o fanatismo procura derrotar o desportivismo.
O futebol merece total empenho e dedicação.
A liberdade valoriza a criatividade, a tolerância, a paixão, e oferece as sementes para o nosso crescimento, desde que com dirigentes capazes de coordenar, mas sem nunca agrilhoar o património do nosso futebol.
O exemplo da antevisão do jogo entre o Desportivo de Chaves e o Rio Ave, que juntou um jogador de cada equipa, Pedro Tiba e Nélson Monte, num clima de amizade e fair play, no qual ambos lutam, com todo o empenho, pelo 5.º lugar, foi um momento de Grande Futebol: um golo fantástico e oportuno.
Adorava ser surpreendido positivamente por mais episódios deste género que nunca são anónimos, mas sempre devidamente personalizados."