"Para mim, não há nada que se compare a representar Portugal. Não encontro sentimento maior em relação a algo que não é palpável, tangível, algo que não é amor a uma pessoa, mas que é muito mais que um conceito, uma tribo, um lugar ou uma geografia. Representar Portugal é o expoente máximo do orgulho bom. E que dizer de representar Portugal competindo na Ginástica? Orgulho e Amor! É andar nas nuvens. Mas isso sou eu. Para muitos (alguns lusos patetas e muitos estrangeiros), Portugal será eternamente um underdog. Aquele rectângulo periférico cheio de gente que “não se governa nem se deixa governar” e de que muitos, por isso, se aproveitam.
Ah, mas como eu adoro os underdogs. Adoro treinar os underdogs. Aqueles que treinam enquanto outros ainda dormem, aqueles que trabalham quando ninguém está a olhar, aqueles que treinam quando o professor da faculdade lhes massacra a cabeça e não os deixa fazer exame “porque não podem faltar para ir a prova nenhuma!”, mas, mesmo assim, eles treinam! Adoro aqueles que treinam, ponto!
Escrevo no rescaldo dos II Jogos Europeus que foram, por isto e muito mais, um momento mágico. Quatro anos passaram desde que a Joana Patrocínio, a Susana Leal Pinto e a Jessica Leite se estrearam em Baku, nos I European Games, com um 7º lugar e uma experiência incrível, uma jornada em que foi impossível tirar-nos os sorrisos da cara. Mas que mais se pode pedir a quem dá o máximo? Só podemos andar felizes, sempre!
Este ano, com outras perspectivas, este grupo amalucado de treinadores do Acro Clube da Maia sonhou com algo mais. Aos poucos, dia-a-dia, com o passar do tempo, o sonho foi passando a objectivo para estes “loucos” e começou, aos poucos, a desenhar-se o sonho nas ginastas. E depois de muito trabalho (nosso e delas), os underdogs, a Bárbara e as duas Franciscas, foram a Minsk e fizeram três exercícios no máximo das suas capacidades, com a maior nota de dificuldade de toda a prova em cada um desses exercícios (what?, eu escrevi mesmo isto de três portuguesas?) e não deixaram dúvidas a ninguém: 3 medalhas – Bronze – Prata – Prata nos European Games!
Três exercícios e três pódios (arrepio-me de pensar nisso e, como ainda não chorei, sei que ainda me há-de “cair a ficha” em relação ao que estas miúdas conseguiram)! Eu já disse que gosto dos underdogs, não disse? Gosto muito! Especialmente porque da próxima vez estes underdogs já não o serão... O Ouro escapou-nos do Dinâmico por 0,09 pontos... Se pensarmos que o mínimo de penalização que um juiz pode dar é de 0,10, temos aqui a real dimensão deste feito e de quão perto estivemos, realmente, do Ouro. Dezassete mortais em oito elementos! Underdogs?!
Com três medalhas ao peito, pesadas como o quanto nos custou alcançá-las, é impossível não sentir o Orgulho por Portugal e o Amor pela Ginástica. (Só não são os Toronto Raptors da Ginástica Acrobática porque não ganharam... mas calma... passo-a-passo!)
Foram as primeiras medalhas na Ginástica Acrobática, foram a primeira medalha nestes Jogos Europeus. Fomos nós! Foi a Bárbara Sequeira, a Francisca Maia, a Francisca Sampaio Maia, a Ana Úrsula, o João Ferreira, o Nelson Araújo, eu, o nosso fisioterapeuta Frederico Silva e todos os colegas de treino: porque ninguém faz nada sozinho! Conseguimos, cambada! Crer, querer e trabalhar como se não houvesse amanhã. Porque na realidade, no treino como na vida, só o que fazemos “hoje” interessa! O presente é a nossa dádiva diária!
E foi fácil? Não! Foi duro!!! Irra, se foi! Valeu a pena? Meu Deus, claro que valeu! Faríamos tudo outra vez! Se calhar faríamos mais ou diferente, mas não fugiríamos de nada que foi difícil, duro ou doloroso. O desporto é assim. Tal como a vida também o é. E quem se lembra do início? Quem se lembra de como foi feito este Trio? Quem se lembra de haver outros planos e expectativas individuais, quem se lembra das críticas à constituição destas equipas seniores vencedoras? Ah, gente de pouca fé! Mas eu lembro-me! (é aqui que eu semicerro os olhos e sorrio...)
E com tantas dificuldades inerentes ao desporto, às dores (porque vai doer!), às lesões, à conciliação de vidas académicas e desportivas exigentes (Medicina e Psicologia não são escolhas que se façam “com uma perna às costas” mesmo para ginastas flexíveis), não seria possível ajudar e facilitar um pouco? Não seria possível que o Professor que não deixou a Bárbara fazer um exame porque iria estar em Minsk (e por isso se arriscar a chumbar de ano por causa das precedências dessa cadeira), lhe fizesse o exame a que ela tem, legalmente, direito? Não seria possível que a Faculdade de Medicina onde anda a Francisca acreditasse que as declarações do IPDJ já tinham sido, realmente, pedidas há muito e que estavam apenas atrasadas, conforme documento a prová-lo?
Não dava para ajudar um pouco estas (e outros) ginastas e atletas? Gostamos tanto de ver as notícias sobre os sucessos nacionais! Mas depois, quando é possível ajudar a fazer a diferença que permite que se treine, verdadeiramente, para chegar ao pódio, porquê tantas pedrinhas dentro das sapatilhas? É este o “dark side”, infelizmente, do nosso sistema desportivo.
Mas depois, graças a Deus, temos o lado brilhante! O lado das instituições que se esfalfam para ajudar.
Estes dias passados em Minsk, tal como em Baku em 2015, a equipa do Comité Olímpico de Portugal – o grande chefe Marco Alves, a Catarina Monteiro, o Filipe Jesus, o Ricardo Bendito, o Pedro Roque, o António Varela, a Ana Ramires, o Dr. Jaime Milheiro e toda a equipa de fisioterapia, em especial o incansável André Ruivo (e, claro, o seu quase-omnipresente Presidente José Manuel Constantino que fez questão de acompanhar a Ginástica Acrobática na Minsk Arena – muito obrigado pela confiança), foram uma família para nós! Estas medalhas são vossas!! São mesmo! Esta é a equipa que tudo faz, que tudo disponibiliza; são os Ronaldos do nosso COP – são os que resolvem! Obrigado! Como já vos disse: Obrigado do fundo do coração. (nunca esqueceremos aquela Cerimónia de Abertura e o quanto vocês ajudaram a proporcioná-la a quem tinha prova no dia seguinte).
E depois temos esta família alargada de atletas e treinadores de todos os desportos que vibra com os sucessos e sofre com as perdas. Que quer saber como funciona o desporto “do outro”, que quer perceber as regras da modalidade do seu colega de refeição enquanto almoçamos juntos na cantina e que quer saber as coisas porque há um interesse genuíno no que faz o seu “companheiro de luta”. Obrigado a todos! Boa sorte para o resto dos Jogos! Estamos juntos!!!
Este capítulo não ficaria completo sem o Acro Clube da Maia, a nossa casa, o nosso abrigo e a nossa força. Aos companheiros de treino, aos companheiros que gerem o clube, aos companheiros que, todos os dias, zelam para que este possa continuar a ser o melhor clube do mundo, um enorme Obrigado.
E, obviamente, à Federação de Ginástica de Portugal que cria as possibilidades para que eu possa estar dedicado ao clube e ao treino, no máximo das minhas capacidades; um agradecimento muito especial pelo que tem feito pelo crescimento da Ginástica Acrobática, por sinal. a modalidade gímnica com mais praticantes em Portugal.
Duas últimas coisas breves: - No outro dia li, num jornal, algo do género: “O trio do Acro Clube da Maia já tinha amealhado uma medalha de prata e uma de bronze, pelo que a sua passagem pela Bielorrússia se cifra por três pódios, um número recorde, melhor do que o que foi obtido pelo canoísta Fernando Pimenta em Baku 2015”. É preciso explicar uma coisa: é que há atletas normais, depois há atletas incríveis e depois há o Fernando Pimenta. Mais nada! É mesmo assim. Um atleta incrível, determinado e humilde, daqueles que compete para ganhar, mais, que treina para ganhar! É preciso pôr estas coisas em perspectiva. O Fernando Pimenta é um Gigante! Tal como a Telma: 32 anos e 15 medalhas em 13 provas europeias! Não é para qualquer um. Aliás é só mesmo para um: ela própria! Para nós foi uma honra enorme “lutar” ao vosso lado pelo verde e vermelho da nossa Bandeira. Obrigado. Espero que haja mais oportunidades porque vocês são uma inspiração.
Depois da prova, um jornalista perguntou-me o que diria eu a alguém, com poder de decisão, para incluir a Ginástica Acrobática nos Jogos Olímpicos. Respondi que não lhe diria nada: levaria essa pessoa até às bancadas da Minsk Arena e sentar-nos-íamos lado a lado bem em frente ao praticável a ver estes ginastas espectaculares nos European Games e não eu teria qualquer dúvida, pela emoção que essa pessoa sentiria, que incluiria a modalidade nos próximos Jogos Olímpicos. “In an heart beat”, como dizem os americanos. Sem hesitar! Quem viu Acrobática na televisão e nunca tinha visto que me corrija se não for verdade. 8000 pessoas a vibrar com os exercícios destes campeões não deixam ninguém indiferente. Este é o poder da Ginástica Acrobática.
Pronto! Obrigado Úrsula, João e Nelson! Obrigado! Agora está na altura de por o “Where is my mind?” dos Pixies, bem alto nas colunas! E tentar perceber onde é que estava, realmente, a nossa cabeça quando sonhámos com isto."
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