"Caso armstrong deu novo pretexto para a luta pela ética desportiva...
A previsão não era falível: depois da colossal dissimulação de Armstrong, o combate contra a dopagem iria intensificar-se. Como, aliás, tudo se intensificou depois da tragédia de Heysel Park (final de 1985 da Taça dos Campeões Europeus), que obrigou a assumir toda uma outra estratégia na questão da violência e da segurança nos estádios. Como, depois dos sucessivos escândalos de corrupção e de tráfico de influências a cargo de dirigentes de importantes (e vencedores) clubes italianos, tudo poderia ter mudado no ataque à teia de cumplicidades, temores reverenciais e “terrorismos” psicológicos em que medra a actuação dos corruptores, coactores intermediários e executores. Depois de Armstrong ressurge em vigor a nova “arma” dissuasora: o passaporte biológico do atleta.
Instituído pela Agência Mundial Antidopagem no final de 2009, o “passaporte do doping” começa a ser implementado generalizadamente pelas várias modalidades (esta semana foi o ténis). A sua vantagem é passar da “ detecção directa” das substâncias dopantes no organismo dos praticantes para a “ detecção indirecta” dessas substâncias, verificada em modificações anómalas no perfil sanguíneo e actuada através de reiterados “controlos” fora da competição. Se o atleta apresentar uma grande variação da sua “linha” biológica, teremos um forte indício de manipulação sanguínea através de dopagem. É aí que o caso passa para uma comissão de peritos, que decidirá se há elevado grau de probabilidade de o perfil anómalo se dever ao “uso de substância ou método proibido” e, nessa hipótese, recomendar a entrega do processo aos órgãos disciplinares por causa de “conclusões resultantes de perfis longitudinais” do praticante desportivo (art. 3.º, 2, c), da lei contra a dopagem).
A Autoridade Antidopagem de Portugal tem estado na vanguarda técnica e logística do passaporte biológico. Em meados do ano passado surgiu o caso mais conhecido de castigo por “violação do passaporte biológico”, com um maratonista olímpico sancionado com quatro anos de suspensão. Outros virão. E, neste momento, conviria tornar mais transparente nestes processos a aplicação dos princípios fundamentais do direito sancionatório e as garantias de defesa e de exercício do contraditório, nomeadamente nos regulamentos federativos.
A guerra da prevenção vale a pena, se outros princípios não caírem. Se for ganha na dopagem, o exemplo possibilitará pensar noutros “passaportes desportivos”, em especial para atacar a violência, a corrupção e a coação, onde temos com certeza muito meliante com cadastro para carimbar."
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