"1. A história ensina-nos, em múltiplos dos seus registos, que é nos momentos difíceis que percebemos a fé das pessoas, o espírito das instituições, a força de uma concreta comunidade. Seja esta comunidade uma nação, uma cidade que resiste, uma empresa que sobrevive ou, também, um clube, após uma derrota não esperada. Se lermos Winston Churchill e as suas interessantes Memórias da II Guerra Mundial, interiorizamos bem a sua enorme determinação, a sua perfeita consciência dos desafios com que, nesse tempo, se confrontava a Europa e o mundo. Ele teve consciência da liberdade que importava preservar, como também da cortina de ferro que estava a emergir. Mas, uma das suas surpresas maiores - e há sempre surpresas na história - foi a sua derrota eleitoral nas eleições legislativas ocorridas no seu país, na sequência da vitória aliada na II Guerra Mundial. E escreveu Churchill neste livro: «Tão absorvido estava no prosseguimento da guerra e na situação que começou a desenvolver-se durante o desfecho vitorioso, que não me dei conta do que se estava a passar nas ilhas britânicas.» O que nos fica da história são ensinamentos permanentes. E neles deparamos com uma frase: «Nunca desistir.» Quando acreditamos na nossa força, na nossa terra, no nosso espírito, na nossa cor. A história do Benfica, nestes 108 anos de vida, está repleta de momentos em que, mesmo tristes, nunca deixámos de acreditar. No nosso lema, no nosso clube, nas nossas equipas, nos nossos atletas. A nossa história está cheia de momentos de uma imensa e singular força interior, em que assumimos que uma derrota não esperada é um momento de reforço da nossa crença, de reafirmação da nossa vontade comum. Mesmo tendo - como temos - razões de queixa acrescidas da equipa de arbitragem. Mesmo tendo - como temos - instantes em que a sorte nos foi madrasta. Mesmo tendo - como temos - momentos em que cometemos erros, erros graves. Mesmo tendo - como temos - minutos em que sentimos menos frescura física. Mesmo tendo - como temos - segundos em que nos interrogamos acerca de situações tácticas concretizadas. Mas este é o sortilégio único do futebol. Aquele que suscita uma relação permanente entre o relvado e as suas diferentes bancadas. Seja a daqueles que, como nós, vibrámos e sofremos no estádio. Que nos entusiasmámos em certos momentos e nos interrogámos em outros. Ou, ainda mais, daqueles milhões que, perante as imagens televisivas, sabem avaliar, quase de imediato, as incidências do jogo e nos comunicam, através dos meios instantâneos contemporâneos, que o golo do Maicon foi em claríssimo fora de jogo. O que nos leva, logo no estádio, a assumir a injustiça do resultado. Esta é a força do futebol. Força única. Força imensa. Força de blocos. Força de convicções. Força de quentes disputas. Força de palavras disputadas. Força onde competem, ao mesmo tempo, a lucidez, o dramatismo, o momento extraordinário. Mas, também, a emoção que perturba, e muito, a razão. Mas sempre com um lema bem presente: «Nunca desistir». Como sentiremos, na próxima terça-feira, frente ao Zenit, e na próxima jornada da Liga, face ao Paços de Ferreira.
2. Faltam nove jornadas para sabermos quem ganha a Liga, quem vai directamente à Liga dos Campeões e quem participa na Liga Europa. Ao contrário do que julgávamos, parece que alguns querem que não saibamos, ainda, no final do calendário previsto, quem sobe e desce no âmbito das competições profissionais. É indiscutível o dramatismo de tesouraria de muitos clubes. É inequívoco que o número de praticantes profissionais com salários em atraso atinge números bem perturbantes. Todos conhecemos clubes que, todos os meses, desistem de determinadas competições. A crise no futebol, e em outras modalidades, é tão grave quando aquela que condiciona o país. E, entretanto, há grupos de trabalho nesta área que gastam tempo e dinheiro a discutir coisas nada prioritárias. Apenas para satisfação de alguns egos pessoais. Cada uma destas nove jornadas envolverá diferentes finais. Se há quatro jornadas atrás, o Futebol Clube do Porto assumiu que não desistiria, é agora o tempo do conjunto do Benfica interiorizar que tudo é possível, tudo mesmo. O título, a presença nos quartos-de-final da Liga dos Campeões, mais tarde o acesso directo a esta Liga milionária, a vitória na Taça da Liga. É que, no arranque da Primavera, voltaremos a defrontar o Futebol Clube do Porto no nosso estádio e, nesse jogo, estou confiante que não teremos legítimas razões de queixa da equipa de arbitragem. É que a nossa história está cheia de momentos em que a palavra desistir não consta do nosso vocabulário. Como sempre assumiu o nosso querido Jaime Graça que, esta semana, em dia de aniversário do Benfica, nos deixou e estou certo que Deus, na sua imensa bondade, o acolheu. Por mim, nunca esqueço momentos únicos vividos no velho Estádio da Luz, proporcionados por jogadores como Jaime Graça, Mário Coluna, José Augusto, José Torres, Simões e Eusébio. Esta geração também teve momentos em que, após derrotas não esperadas, interiorizou e assumiu: «Não desistir».
3. Na próxima terça-feira, os russos do Zenit merecem sentir, mas, acima de tudo, perceber o que é o inferno da Luz. O fervor das bancadas é uma das referências da história do Benfica. Nestes dias em que o Colégio Militar comemora mais um aniversário, recordo bem todos aqueles jogos, a que assisti, impecavelmente fardado de castanho, com 10, 11, 12, e 15 anos. Vibrei com os golos. Sofri com as derrotas. Exultei de alegria. Limpei lágrimas. Empunhei bandeiras. Comi queijadas. E senti que, nas bancadas, havia gente de todas as idades, de todos os credos, de todas as cores e de todas as classes. E, mesmo em derrotas não esperadas, se dizia ontem, como hoje: «Não desistir.»
4. (...)"
Fernando Seara, in A Bola
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