"Só em semanas assim, de uma estranha paz sem campeonato, é possível falar de árbitros sem que as leituras surjam inquinadas pelo caso X ou Y, pela comparação de expulsões ou pelo VAR que interveio e deixou de intervir. Olhemos então os árbitros, só eles e sem mais, a partir do que o tempo já nos ensinou. Primeiro tinham falta de preparação, surgiam em campo gordinhos e anafados, a correr bem menos que qualquer jogador. Hoje são atléticos, atletas mesmo, com performances físicas que não podem ser explicação para os erros.
Também eram amadores, sem tempo para treinar e mal pagos, alegadamente mais suscetíveis de uma qualquer tentação. Hoje, têm espaços e tempo para treinar, são profissionais ou perto disso e pagos muito acima da média. Veio depois a tese da injustiça, de jogos vistos por dezenas de câmaras a concorrer com um homem apenas e que precisava de decidir na hora. Surgiu a vídeo-arbitragem, anunciada como garantia definitiva de verdade desportiva. E, todavia, os árbitros permanecem no olho do furacão e ainda mais pressionados neste tempo louco das redes sociais e da comunicação agressiva dos maiores clubes. Como se resolve? Não há solução milagrosa e as medidas concretas serão mais tema de um congresso que de uma crónica.
Adianto aquilo de que não duvido: qualquer evolução positiva terá de passar sempre por reduzir o número de momentos em que o árbitro tem de tomar decisões radicais, como penaltis ou expulsões. E em Portugal tem acontecido precisamente o contrário, em grande parte agravado pela utilização que se dá ao VAR.
Roberto Martínez fez o pleno até hoje, hoje mesmo, esta segunda-feira em que escrevo. Portugal já está no Europeu do próximo ano e vai quase de certeza ganhar o grupo. Além disso, consegue-o com uma série consecutiva – e rara - de vitórias que não pode ser desvalorizada, a despeito da modéstia dos rivais do grupo. Nem sempre jogou bem, chegou a parecer sem rumo tático, mas parece agora claro que a equipa cresceu, se orientou em organização, sobretudo nos momentos com bola.
Pelo caminho mudou de estrutura, o que só abona em favor do técnico. De uma desnecessária linha de 5 passou-se à de 4 defesas apenas – em 1.4.4.2 ou 1.4.2.3.1, em vez de 1.3.4.2.1 - ganhando vaga para mais uma unidade ofensiva, o que desde o início se recomendava. Martínez prometeu maleabilidade tática quando chegou, tardou em concretizá-la, mas antes tarde que nunca. E antes um selecionador convicto que um teimoso. Seguramente por convicção, também pré-anunciou o que já se adivinhava: o grupo está quase fechado e que dificilmente a porta da seleção se abrirá a mais alguém. João Neves forçou a entrada com exibições categóricas no Benfica, mas a vaga à qual se candidata também é pretendida por Matheus Nunes, Renato Sanches, eventualmente Pedro Gonçalves, se Martínez conseguir olhar para este último como médio.
É o paradoxal excesso de qualidade que tanto facilita como complica a vida de um selecionador que já tem seis nomes firmes para aquela zona do campo: Palhinha, Rúben Neves, Vitinha, Otávio, Bruno Fernandes e Bernardo Silva. Portugal terá tido seleções mais fortes nas últimas décadas, pensando na qualidade do onze, mas dificilmente houve tanta fartura global, sobretudo do meio-campo para a frente.
Espanha também tem imenso talento acumulado e convocatórias difíceis, em particular de atacantes, que a lista impressionante tem, só entre eleitos recentes, Morata, Ferrán Torres, Ansu Fati, Oyarzabal, Joselu, Iago Aspas, Abel Ruiz, Gerard Moreno, Yeremy Pino, Lamine Yamal, Iñaki Williams, Dani Olmo, Marco Asensio. São mesmo muitos. Mas se ainda não percebeu que ele existe, anote mais um: Bryan Zaragoza, 22 anos, extremo do Granada. É um daqueles baixinhos dribladores que entusiasmam, mas é bem mais que um simples agitador.
Atalha com arte a caminho da baliza, soma golos (vão 5 em 9 jogos na liga) mesmo que pelo buraco da agulha e multiplica jogadas de causar espanto. Impressiona-me a frieza com que, no último momento, é sempre capaz de mais um gesto surpreendente. Alguns clubes – Málaga, Valladolid, Bétis – desvalorizaram-no pelo seu 1,65m, o Granada percebeu-o como talento incomum e José Luis De La Fuente, o seleccionador espanhol, até já o estreou com o 10 de La Roja diante da Escócia. O futuro apenas começou."
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