"Se há alguém capaz de contrariar aquele mito de que a primeira vez nunca é nada de especial é Jorge Jesus. Alguém mais fundamentado que me contradiga mas, no futebol, pelo menos, a primeira amostra de Jesus costuma ser a melhor.
Talvez porque o povo também costume dizer que não há uma segunda oportunidade para causar uma boa primeira impressão, não há grandes dúvidas que Jorge Jesus é mais pelas entradas com o pé direito do que pelas saídas em ombros. Mesmo que no futebol ninguém festeje um campeonato em Outubro.
É cada vez mais evidente que o Jorge Jesus de hoje já não é bem o de outros tempos. Parece esgotar-se, abaixo do esperado, diferente, menos entusiasmante. Menos Jesus, no fundo.
Não tenho grandes dúvidas que a melhor temporada de Jorge Jesus no Benfica, por exemplo, foi a primeira. O ano do rolo compressor que apanhou rivais desprevenidos e só parou no título. Trouxe ao futebol português um sistema vertiginoso, de ataque em carrossel que tornava complicada a vida a qualquer rival menos preparado para ter a bola.
Um treinador da nossa praça, por exemplo, poucos dias depois de o FC Porto de Vítor Pereira ter sido tricampeão, disse-me que, sem colocar em causa a justiça do título, para a maioria das equipas do campeonato era extremamente mais difícil travar o Benfica. Tem a ver com a intensidade que Jesus exigia à sua equipa, o que desgastava o rival e trazia, inevitavelmente, mais oportunidades. Contra equipas como o FC Porto com um bloco baixo, entreajuda e, claro, alguma sorte, era «mais possível». Palavras dele.
Ora, depois desse primeiro ano no Benfica, vieram três anos abaixo do esperado, dois anos de título novamente e a mudança para o Sporting.
E o primeiro ano no Sporting voltou a ser a todo o gás. Em dados momentos, fez lembrar o primeiro ano no Benfica, não só pelo que a equipa jogava, mas também pelo contraste. É verdade que Marco Silva tinha conquistado a Taça de Portugal e dado seguimento à aproximação do Sporting à disputa na frente que Leonardo Jardim, com menos recursos, tinha iniciado. Mas foi Jesus a voltar a colocar, verdadeiramente, o Sporting na discussão. Até ao fim.
Falhou por centímetros e o que aconteceu a seguir foi, de todo, inesperado.
Os últimos dois anos não parecem de Jorge Jesus. Mesmo nas épocas em que perdeu o título para André Villas-Boas e Vítor Pereira, em longos períodos o Benfica de Jesus mostrava réplicas do futebol do ano inaugural. No Sporting, o sismo inicial não parece ter seguimento.
O futebol de Jesus, da nota artística, do vaivém constante, da vertigem, da intensidade, dos rivais praticamente trucidados, já é quase uma recordação. A ponto de o próprio Jesus não o reconhecer: equipa italiana, disse ele sobre o Sporting. Um discípulo de Criujff a atraiçoar a doutrina em prol do resultado.
Na verdade, não fosse alguns acasos felizes, como Feira, Vila do Conde, Tondela ou as recepções a Moreirense, Sp. Braga ou V. Setúbal, e o Sporting estaria ainda mais longe do primeiro lugar. Não se trata de analisar cenários hipotéticos mas focar uma tendência.
É verdade que uma conquista da Taça de Portugal, a que se soma, sublinhe-se, a Taça da Liga, colocará a época do Sporting num patamar tépido, até porque a campanha europeia foi, até agora, satisfatória, também. Mas o futebol praticado, esse, fica a léguas do primeiro ano. Evolução, nesse campo, não houve. Já dá para concluir.
Jesus, um personagem único e verdadeiro num futebol de eufemismos e lugares comuns, está diferente. Do arranque ficaram as memórias e se é verdade que não há apenas um caminho para o sucesso, também é certo que desviar-se de uma matriz que foi sempre a sua dificulta a tarde.
Jesus está diferente. Está longe do que foi. Está, enfim, menos Jesus."
Sem comentários:
Enviar um comentário
A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!