"O Benfica saiu à rua e falou. Quer Rui Costa na liderança, não quer trocar o certo pelo incerto, e existe uma perceção de que, do ponto de vista desportivo, especialmente após a entrada de Mourinho, a tendência é de melhoria. O ‘maestro’ tem a faça e o queijo na mão, mas tem também sobre os ombros a responsabilidade que lhe foi dada pelos 93.891 que foram às urnas, porque a maioria que o elegeu extinguiu-se nesse momento, e Rui Costa só fará sentido como presidente de todos os benfiquistas.
Comecemos pelos números: num universo eleitoral de 160 mil votantes, 93.891 sócios do Benfica colocaram o voto na urna no passado sábado, o que deu uma taxa de abstenção de 41,4%. Na eleição da ‘geringonça’, a taxa de abstenção foi de 51,42%, e na maioria absoluta de António Costa de 48,54%. Nos dois triunfos de Luís Montenegro, a abstenção situou-se nos 40,2% (2024) e 41,8 (2025). Quanto a eleições em clubes desportivos, se juntarmos os atos eleitorais mais participados de Sporting, FC Porto, SC Braga e Vitória Sport Clube, chegamos aos 59.360 votantes. Se a tudo isto adicionarmos ainda que o Benfica superou em 36.803 votantes o recorde do Barcelona, a única conclusão a que podemos chegar é de que o clube da Luz, do ponto de vista social, está bem e recomenda-se, e possuiu uma massa adepta desejosa de participar – em níveis estratosféricos - nas grandes decisões da instituição.
Passemos então aos protagonistas. João Noronha Lopes, de quem tenho boa impressão a nível pessoal e profissional, não defrontou um adversário ‘normal’, do outro lado estava o ‘maestro’, idolatrado no universo encarnado, que fez da sua popularidade (e humildade, também) um trunfo que soube jogar. Noronha Lopes sofreu do efeito bumerangue quando atacou ‘demasiado’ Rui Costa e nunca foi capaz de passar uma ideia suficiente clara, no sentido de chegar às massas (tantas queixas foram ouvidas de que ninguém percebia aquelas «coisas em estrangeiro» que dizia!), do que queria para o clube. Provavelmente não esperaria a derrota clara que sofreu, não que não fosse alertado para o perigo que corria ao confundir a ‘bolha’ em que se movimentava, com o Benfica do país real, o Benfica que mesmo sem resultados desportivos acima da média continua a encher estádios, e tem uma lista de espera para ‘red passes’ de 30 mil almas.
Quanto a Rui Costa, depois deste expressivo voto de confiança, em primeiro lugar precisa que lhe deem tempo para dotar Mourinho e Mário Branco das ferramentas de que necessitam. Com o ‘Special One’ assistimos a uma nova era (muita atenção ao mercado de janeiro), capaz de tornar a equipa principal de futebol do Benfica mais capaz e competitiva. Embora os resultados sejam sempre quem mais ordena, creio que ninguém de boa fé dirá que o futebol encarnado não está bem entregue.
Do ponto de vista financeiro, os nomes que rodeiam Rui Costa são fortes e credíveis, e houve um refrescamento entre aqueles que o acompanham (um grande abraço a Sílvio Cervan, que esteve 18 anos no Benfica para servir, e não para servir-se). Assim, com a dinâmica social criada, com o futebol em mãos experientes, e com a segurança da competência técnica nas finanças, como não se via desde a saída de Domingos Soares de Oliveira, o Benfica, assim não dê tiros nos pés, pode ter um final de década bem interessante, que lhe permita continuar a aprofundar a modernização, e a implementar novos projetos, porque há um compromisso chamado Benfica District, uma das promessas eleitorais que não deve ficar por aí.
BAGÃO FELIZ
António Bagão Félix, 77 anos, ex-vice-presidente do Benfica e antigo ministro da Segurança Social e Trabalho, e das Finanças, foi uma das figuras da noite eleitoral encarnada, ao obter, concorrendo à liderança do Conselho Fiscal (CF), mais 168.910 votos (provenientes de mais 7.360 votantes) do que João Noronha Lopes, candidato à Presidência do clube da Luz, no mesmo ‘ticket’. A vitória no CF (57% contra 43%) sorriu a Raul Martins, mas os números de Bagão Félix revelam o prestígio de que o antigo governante goza entre os seus consócios. Talvez não fosse pior que os benfiquistas meditassem nas palavras de Bagão Félix, na última semana de campanha, sobre a falta de representatividade dos sócios nas Assembleias Gerais (AG) – que anacronicamente viram o seu ‘peso’ aumentado na recente revisão estatutária - uma ameaça permanente à estabilidade do clube. Já o escrevi, e repito-o, se as AG faziam sentido em 1904, mantê-las com os mesmos propósitos em 2025 só pode ser uma piada de mau gosto. Fica o repto a Rui Costa para a criação de um grupo de estudo (ou entregar o assunto a uma entidade externa, que apresente propostas concretas) que aproxime os 93 mil que votaram no sábado de todas as decisões associativas da vida do Benfica, salvaguardando o clube da minoria militante (e em muitos casos, radical) que vive na ‘bolha’ de Lisboa.
Relativamente a dois candidatos que não chegaram à segunda volta, gostava de deixar a seguinte reflexão:
Luís Filipe Vieira, que entre 2003 e 2016 reergueu o Benfica das cinzas, rasgando-lhe um horizonte com futuro, não teve uma votação desprestigiante e encontrou uma forma simbólica para dar por terminado o seu caminho.
João Diogo Manteigas revelou inteligência e um conhecimento profundo do clube, e é uma carta dentro do baralho de opções do Benfica, em futuras eleições, assim deixe a democracia fazer o seu caminho, e não tenha demasiada sede de ir ao ‘pote’. No entanto, deve meditar no facto de grande parte do seu eleitorado ter migrado para Rui Costa.
PRECISÃO HISTÓRICA
Rui Costa continua a ser o 34.º homem a ocupar a Presidência do Benfica, embora tenha ganho, no passado sábado, o direito a permanecer no exercício da 40.ª Presidência dos encarnados.
Se nos socorrermos do sítio oficial da Presidência da República Portuguesa, encontramos a seguinte orientação: «De 1910 aos nossos dias, a República Portuguesa teve vinte Presidentes, embora o cargo tenha sido ocupado por dezanove personalidades. Na I República (1910-1926), Bernardino Machado foi eleito por duas vezes, mas não consecutivamente (em 1915 e 1925), já que a Constituição de 1911 determinava apenas um mandato de quatro anos. Por essa razão, contam-se as suas duas Presidências.»
Assim, Bernardino Machado foi o terceiro e o sétimo Presidente da República Portuguesa, enquanto, por exemplo, nos Estados Unidos, Grover Cleveland foi o 22.º e 24.º Presidente, e Donald Trump o 45.º e 47.º.
Ora, no Benfica, Alberto Lima teve a sétima e a nona Presidências; Félix Bermudes a 11.ª e 20.ª; Manuel da Conceição Afonso a 15.ª, 17.ª e 21.ª; e José Ferreira Queimado a 29.a e a 32.º. Rui Costa, nestes termos, continua a ocupar a 40.ª Presidência do Benfica.
Desde a sua fundação, o Benfica teve, como foi dito, 34 homens a exercerem a Presidência do clube; no mesmo período, Portugal teve 21 homens na liderança do Estado, dois Reis e 19 Presidentes da República. Ou seja, embora em Democracia tenha havido, até 2021, quatro mulheres a candidatarem-se a ter o Palácio de Belém como residência oficial, o poder continua a ser coisa de homens (até de, inevitavelmente, deixar de sê-lo). No nosso País, apenas Maria de Lurdes Pintassilgo chefiou um Governo (de gestão) durante 5 meses, (1 de agosto de 1979 a 3 de janeiro de 1980), nomeada por António Ramalho Eanes.
PS – Visto e revisto o lance que deu o pontapé de canto de que surgiu o golo da vitória do Sporting nos Açores, por se tratar de um erro do árbitro assistente e do árbitro tão invulgar, fica claro que este é o momento para o Conselho de Arbitragem ter a coragem de exercer autoridade, e o bom-senso de fazer pedagogia. Apesar de o mal estar feito, e não haver forma de ressarcir os açorianos, a necessidade de conter danos e reinstalar a credibilidade abalada, é obrigatória. Uma situação destas só pode ser combatida eficazmente com transparência absoluta, quiçá dando aos ‘réus’ do caso a possibilidade de se defenderem, de viva voz, nem que seja só para assumirem o erro e pedirem desculpa."

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