"Não aprendemos nada. Nada de nada. Nem com esta pandemia que tanto nos tirou e que tanto nos proporcionou em termos de aprendizagem. Nem uns com os outros, que tantas condicionantes encontrámos nos nossos caminhos ao longo do confinamento. Não aprendemos nada. Nada de nada.
E se dúvidas houvesse quanto a isso, bastou regressar o desporto-rei, o desporto que move as massas e que tanta paixão suscita nos adeptos para perceber que não aprendemos nada. Rigorosamente nada.
Achar-se no direito de ofender, ameaçar e violentar física e psicologicamente outrém é algo que me repugna, que me entristece e que me faz pensar que rumo estamos a seguir enquanto sociedade, enquanto comunidade, enquanto humanidade. Seja em que área, meio, circunstância for, quem o faz não está na plenitude das suas capacidades, não pode estar. Por opção própria ou por desequilíbrio estrutural.
E isto nada tem a ver com o clube em questão. Tal como não tem nada a ver com futebol. Porque o futebol não é isto. Não pode ser isto. Não deve ser isto. Se quisermos que volte a haver futebol, claro está, situações como aquelas que conhecemos nos últimos dias, atitudes como aquelas que conhecemos nos últimos dias devem ser banidas. Do futebol e da nossa sociedade.
Ameaçar alguém, agredir alguém de forma gratuita e insultuosa apenas porque não venceu um jogo? Está tudo bem, meus senhores? Nunca tiveram um dia menos bom na vossa vida enquanto trabalhadores? Ou vários dias menos bons? Certamente que sim. E quando os tiveram, foi esse o tratamento que receberam por parte dos vossos patrões? Se foi, o que fizeram? Denunciaram o péssimo e ultrajante comportamento de quem vos paga ou foram coniventes e ficaram calados?
Já agora, depois de terem sido agredidos e ameaçados por terceiros no vosso local de trabalho, como foi o dia seguinte, no regresso ao trabalho? Regressaram com um sorriso na cara, com a esperança nos olhos, com vontade de trabalhar ainda mais afincadamente e de dar ainda mais em prol daquele/daqueles que vos agrediram? Tenho a certeza que sim, certamente que foi assim, pois sois uns super-heróis...
No meio de toda esta tragédia (não é preciso morrer alguém para que se possa considerar uma tragédia), o argumento de que os jogadores e os treinadores profissionais ganham milhões e têm de fazer mais e melhor é uma falácia. Uma enorme falácia. O compromisso e o carácter das pessoas não se medem pelo vencimento auferido no final de cada mês de trabalho. Se assim fosse, e tendo em conta o comportamento lamentável de quem fez o que fez, facilmente posso concluir que o vosso carácter é zero. Ou menos um, menos dois, etc...
O futebol que eu gostaria de ver/ter merece mais. A sociedade em que eu gostaria de viver merece mais. Infelizmente diz-se que o futebol é o reflexo da sociedade e cada vez mais apercebo-me do quão verdadeira é essa afirmação. No nosso caso, em Portugal, somos o futebol que temos e temos o futebol que somos. E o que temos e somos não nos espelha nem representa a todos, mas os que verdadeiramente se importam com o próximo e percebem que o futebol é a coisa mais importante das coisas menos importantes são cada vez menos.
Perde o país, perde a sociedade, perde o futebol...porque pura e simplesmente não aprendemos nada. Nada de nada..."
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