"«Os futebolistas são como actores de cinema, querem ser aplaudidos»... Luis Aragonés disse-o e sentiu-o. Estaria hoje de pé, no último aplauso a David Villa, mais um dos fabulosos daquela Roja que passou de eterna fracassada a larga dominadora do futebol europeu e mundial. A Roja, que assim foi baptizada pelo próprio Luis Aragonés, que apaixonou uma geração e que deixou um marco.
No futebol, o sucesso é efémero e o esquecimento rapidamente abraça quem passa à história. Excepção aos imortais. E é aí que têm de se situar aqueles rapazes que com Aragonés deram o ponto de partida para a conquista do Mundo - Del Bosque teve a arte de aproveitar os alicerces e de lhes dar consistência.
Naquele Junho de 2008, La Roja estava em ponto rebuçado. Raúl González até podia ser um histórico do Real Madrid, melhor marcador da selecção e ter feito 23 golos nessa época. Não caberia na selecção, porque o seu ego, confundível com estatuto, era visto por Aragonés como um grão de areia na engrenagem. Foi Güiza, então melhor marcador do campeonato, mas somente para fazer descansar os explosivos Fernando Torres (Liverpool) e David Villa (Valência), os imprescindíveis.
O tempo deu-lhe razão e não foi preciso muito esforço. A barreira psicológica dos espanhóis com os quartos de final, quais ingleses traumatizados com os penáltis, foi ultrapassada contra a Itália, com um enorme Casillas no desempate desde os 11 metros, e o troféu seria levantado pelo guarda-redes em pleno Ernst Happel. Um mês que mudou a história do futebol espanhol e que lhe começou a dar os condimentos para a hegemonia que depois se veria, quer em selecções, quer em clubes.
2019 marcou o adeus de ambos os avançados ao futebol. Primeiro, El Niño, agora, maraVilla. Dois tradutores do futebol de quilate da Roja em golos. Dois imortais.
A Torres associa-se presença, instinto, conhecimento profundo de movimentações e também o rótulo de primeira promessa a emergir nessa geração. A Villa aponta-se faro de golo, capacidade de acelerar, frieza para decidir. Ambos foram enormes, numa selecção onde era difícil definir a grande estrela. Casillas era decisivo entre os postes, Puyol e depois Ramos tinham a voz da liderança, Xavi e Iniesta possuíam a arte de pensar muito mais rápido do que os outros e de executar com uma mestria e elegância distintas.
Estava lá tudo, na escola de Luis Aragonés. «Apanhei uma selecção, tento deixar uma equipa», dizia na despedida. Deixou uma equipa e o futebol reconhece-a como inesquecível.
David Villa levará, por certo, duas amarguras: aquela lesão na meia-final de 2008 contra a Rússia, que lhe tirou a final com a Alemanha; e a grave lesão em dezembro de 2011 que não o deixou ser, novamente, o homem-golo naquela que seria a revalidação do título europeu. Sobra, contudo, muito mais para enaltecer, tanto que Espanha não tem maior artilheiro na sua história.
Sobe agora ao palco onde estão Xavi, Torres, Puyol, Xabi Alonso, a ser aplaudidos como actores de cinema, mas onde ainda falta chegar o principal: Andrés Iniesta."
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