"Deu-se o acaso de, numa semana, o FC Porto perder no Restelo e o Benfica jogar hoje no Bonfim, estádios clássicos de Belenenses e V. Setúbal, clubes que, mais do que quaisquer outros, têm enfrentado problemas existenciais nas últimas décadas. Primeiro, porque andaram em tempos numa primeira linha; segundo, porque pela vizinhança alimentaram competição com Benfica e Sporting que também os fez crescer. Assim, merecem interpretação duas coisas: a forma como Silas, depois de vencer o FC Porto, falou ao coração dos belenenses dizendo «isto não é uma ponte, é o Restelo!». Segundo, a decisão do Vitória de, pela primeira vez, proibir adornos do visitante nas bancadas centrais.
Acho bem. E acho bem porque estes clubes (há outros claro) perderam tudo: estatuto, dinheiro, sonhos de campeão, adeptos. No sorvedouro moderno parecem sentir-se cada vez mais obstáculos no caminho dos grandes, constrangidos a escolher entre serem rivais ou aliados deste ou daquele. E quando os adeptos da casa dizem Restelo ou Bonfim parece sentir-se, neles, um impulso da história. A casa é o que lhes resta na comparação com os grandes e vê-la, um dia, terminantemente fácil, invadida, será o fim dessa identidade emocional.
Talvez, com mais tempo, clubes como o Belenenses e o Vitória não possam evitá-lo. Talvez os grandes com que se comparam nem tenham culpa dos caminhos que as sociedades/economias, traçaram. Jogos como estes, em todo o caso, enleiam forças regeneradoras, quase a possibilidade de um título que não se ganha por jornadas, antes por combate, como no boxe. Como se o Belenenses pudesse roubar um troféu ao Porto ganhando-lhe só uma vez. Ou o Vitória ao Benfica. É essa presença caseira, de combate único, o que lhes resta de uma velha nobreza. A última ousadia é existir."
Miguel Cardoso Pereira, in A Bola
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