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sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

A fruta apodrece mas a memória não prescreve!

"Perante a tentativa de branqueamento total daquela que foi a grande bandalheira do futebol em Portugal é importante não esquecer quem e como criou um polvo macabro de contornos indefiníveis.

O ano aproxima-se do fim. A falta de pudor de determinada gente sem qualquer tipo de escrúpulos é não apenas revoltante como nos faz duvidar da própria realidade dos factos.
Assim sendo, e tal como o fiz nos últimos números, tento que a memória não prescreva. E com base naquele que foi o maior processo contra a corrupção no futebol em Portugal, deixo-vos aqui mais alguns dados que importa guardar para sempre na gaveta de cima da secretária das nossas lembranças.
Debruçando-se sobre o que a investigação apurara em relação à alteração de resultados de jogos do FC Porto e dos seus adversários directos na luta pelo título de campeão nacional da época de 2003/2004, escreve o inspector Simões da Polícia Judiciária: 'Para a 'consumação' de alteração destes resultados desportivos assumiu um papel fulcral a relação entre o presidente do Futebol Clube do Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa, e o empresário de jogadores, António Fernando Peixoto de Araújo'.
A 14/2004, António Araújo confessava a Luís Gonçalves (engenheiro que trabalhava na SAD do FC Porto, agora mais conhecido por ser expulso do banco quase todas as jornadas): 'Eu ajudo muito o presidente e você sabe disso!' Estas 'ajudas' ter-se-ão traduzido no facto de António Araújo ter funcionado como 'intermediário' entre o presidente do Futebol Clube do Porto e determinados árbitros, aos quais foram prometidas e oferecidas diversas contrapartidas para que fossem viciados os resultados desportivos do Porto e dos seus dois adversários mais directos, Sporting e Benfica.
Uma das 'contrapartidas' em causa terá passado por assegurar aos árbitros a prestação de serviços sexuais por prostitutas. No dia 18/2/2004, o árbitro Paulo Silva, da 2.ª categoria, comentou com outro colega ainda não identificado o facto de ter conhecimento de que António Araújo costuma patrocinar encontros de prostitutas com árbitros: 'Tu, lembras-te, uma vez depois de a gente acabar... o putedo, com o Araújo, no Porto'.

As prostitutas!
Bela expressão: putedo. Merecia um mail.
Entrando na pormenorização dos jogos suspeitos, podemos perceber como a Polícia Judiciária foi chegando a determinadas conclusões.
O jogo FC Porto - Nacional da Madeira, para a 10.ª jornada da I Liga, por exemplo, disputado no Estádio das Antas no dia 31/10/2002, foi arbitrado por Paulo Pereira, da Associação de Futebol de Viana do Castelo. No dia a seguir ao jogo, o presidente do FC Porto comentou com outro funcionário do clube que o árbitro tinha sido 'estúpido' na marcação de uma falta. E acrescentou: 'Se quisesse tinha resolvido o jogo logo'.
Conclui-se no relatório: 'A palavra 'resolver' foi aqui utilizada claramente para dar a entender que o árbitro favoreceu o Porto. E do teor desta conversa pode presumir-se que o árbitro teria sido aliciado a fazê-lo'.
O jogo entre o FC Porto e o Estrela da Amadora, da 19.ª Jornada, disputado no Estádio do Dragão no dai 24 de Janeiro de 2004, foi dirigido por Jacinto Paixão, da Associação de Futebol de Évora. Foram seus auxiliares José Chilrito e Manuel Quadrado. Este seria um dos jogos mais mediáticos de todo o processo 'Apito Dourado', o famoso 'Jogo da Fruta'.
Vejamos o que diz o relatório da polícia Judiciária sobre ele: 'No dia do jogo, às 12 horas, 58 minutos e 27 segundos, o árbitro Jacinto Paixão telefonou para o empresário de jogadores António Araújo e solicitou-lhe que o Futebol Clube do Porto lhe assegurasse para a próxima noite o serviço de várias prostitutas. Disso nos dá conta a conversa entre o suspeito António Araújo e o presidente do Futebol Clube do Porto, Jorge Nuno Pinto da Costa'.
E prossegue: 'Num diálogo em que os dois intervenientes falaram quase sempre em 'código', António Araújo informou o seu 'Presidente' que alguém lhe tinha pedido 'fruta para logo à noite'. Entendendo erradamente que Araújo estaria a usar o termo 'fruta' para significar 'dinheiro', Pinto da Costa esclareceu que a dita 'fruta' já havia sido entregue: 'Já foi mandada'.
Araújo teve então de esclarecer que a 'fruta' em questão era 'para dormir', percebendo-se definitivamente qual o assunto. Araújo até especificou quem é que iria ser presenteado com a 'fruta': 'O homem que vai ter consigo de tarde, o JP'. Repare-se que as letras JP coincidem com as iniciais de Jacinto Paixão.
Usando mais uma expressão em código, Araújo reiterou o pedido feito por JP: 'Rebuçado para logo à noite'. O presidente do Futebol Clube do Porto respondeu: 'Diga que sim senhor!'
Ainda no decorrer dessa mesma conversa, os dois interlocutores abordaram outros 'pormenores' da 'fruta' para JP: a cor da pele das prostitutas e como seriam pagos os seus serviços de natureza sexual. Aliás, sobre o pagamento destes serviços, depreende-se pelo teor da conversa que Araújo já por diversas vezes teria sido o intermediário de outros serviços sexuais pagos pelo Futebol Clube do Porto: 'Só estou a dar-lhe a dar conhecimento ao Presidente senão isso fica... é que eu... eu... é que eu estou sempre a dispor, a dispor, também não há necessidade!', referiu António Araújo.
No final da mesma conversa, Araújo e Pinto da Costa combinaram encontrar-se pessoalmente nesse mesmo dia para falarem sobre a 'fruta' para JP.
O Porto venceu a partida por 2-0.
A fruta passou a fazer parte do léxico do futebol em Portugal.
E nós não nos esquecemos por causa de quem. Por mais que essa gente de total ausência de princípios e de vergonha venha tomar a imagem de anjo de asas de pomba. O cheiro a enxofre está lá. E a podre..."

Afonso de Melo, in O Benfica

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