"A vitória do Benfica sobre o Sporting na final do Jamor pode muito bem ter sido o maior espectáculo de uma Taça de Portugal em todos os tempos. Por isso, nada como ouvir as testemunhas privilegiadas desse jogo que entrou na era moderna.
«Quando, ao faltar um minuto para acabar o maravilhoso conto do Jamor, uma história fantástica e emocionante do futebol português, Rogério marcou a 5.ª bola em remate feliz, roçando o poste, e depois desmaiava na alegria do feito e da vitória, o Benfica conquistara a Taça de Portugal na final mais rica de que há memória, mas o grande triunfador era, verdadeiramente, o futebol, tanto na expressão benfica como sportingue, que nos dera a melhor final de todos os tempos!»
Foi desta forma inflamada que o grande Tavares da Silva descreveu a final da Taça de Portugal da época de 1951/52, talvez a mais fortemente disputada de todas as finais daquela competição.
Para quem esteve nessa tarde inesquecível do Jamor, foi fantástico! Aos 9 minutos, de grande penalidade, Albano faz 1-0 para o Sporting; aos 23, também de «penalty», Rogério Pipi empata; Corona dá vantagem ao Benfica no início do segundo tempo (49m); Rola empata dois minutos depois; aos 55 minutos, é o Sporting a ganhar vantagem por Martins; Rogério volta a empatar aos 69 minutos; Rola faz 4-3 três minutos mais tarde; José Águas 4-4 aos 73 minutos; finalmente, Rogério decide o jogo no último minuto. Ufa! Cansa só de escrever.
Os elogios multiplicavam-se pelas páginas dos jornais: «A existência de nove golos indica, pelo menos, uma partida muito entretida, mas para além dos golos, alguns deles jóias de requintado labor, praticou-se futebol rasteiro, rápido e desconcertante de eprguntas e respostas, cientificamente organizado e não de acaso: futebol de conjunto onde cabia a iniciativa individual».
Rogério falhou «penalty»
Antes de desfiarmos mais palavras de admiração, vejamos como jogaram ambas as equipas dirigidas pelo árbitro santareno Reis Santos.
BENFICA - Bastos; Artur e Fernandes; Moreira, Félix e Francisco Ferreira; Corona, Arsénio, Águas, Rogério e Rosado.
O treinador era Cândido Tavares.
SPORTING - Carlos Gomes; Juvenal e Pacheco; Veríssimo, Passos e Juca; Pacheco Nobre, Travaços, Martins, Albano e Rola.
O treinador era o inglês Randolph Galloway.
No meio da saraiava de golos, Rogério ainda conseguiu falhar um «penalty» aos 43 minutos. É obra!
E da obra se falava assim: «A todos os títulos, a final da Taça de 1951-52 representou uma alta expressão do futebol moderno, de uma velocidade outrora desconhecida e de movimentação sintonizada com espaço suficiente para as manobras individuais, empenhando-se os jogadores exclusivamente nas boas normas do 'fair-play'. O desafio teve interesse, graça, animação e ansiedade! Viram-se na base da referida movimentação e velocidade golpes estupendos, de arte e harmonia, atitudes escultórias, figuras acrobáticas, todo um mundo de riqueza no campo desportivo! Foi bem a apoteose de toda uma época na beleza do cenário e no valor do seu conteúdo! Os dois mais famosos grupos portugueses contaram-nos, no Jamor, uma bela história que, de aqui a tempos, quando se falar ou relembrar as grandes manifestações do futebol português, 'será sempre recordada:
- Ali, no Vale do Jamor, uma vez, em fim de época de 1952, assistimos a uma final da Taça como nunca tínhamos visto e não mais, pelos tempos fora, haveríamos de ver...»
Às vezes é bom dar palavra às testemunhas privilegiadas de acontecimentos ímpares.
A final de 1952 pode muito bem ter sido a melhor de todos os tempos. Não seríamos nós capazes de o desmentir. Continuaremos pelos anos fora à espera de outra que a iguale."
Afonso de Melo, in O Benfica
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