"É a velha sina: no futebol não há nada mais fácil do que arranjar-se um bode expiatório que deixe ficar à sua sombra dezenas de falsos inocentes a assobiar para o ar. Por isso, sem espanto, nos últimos dias, me apercebi de linha (cruel) a enrodilhar-se, fugaz, na tese de que quando o FC Porto ganha, ganham todos, quando o FC Porto falha, falha o Vítor Pereira. (Se contra o Marítimo as substituições foram feitas ao deus-dará - a equipa de arranque não, era a que eu faria. E não foi ele que falhou o penalty, como já falhara com o Olhanense, nem foi ele que escorregou para o empate do Suk...)
Não, para mim, a questão da sua culpa, não é a sua culpa, é a sua circunstância, tem a ver com o futebol ser o que é: um jogo onde o treinador pode construir uma equipa ou uma ideia na cabeça - mas só alguns jogadores conseguirem levá-la, à equipa e à ideia, mais adiante. É o que sucede com Moutinho. (Ou antes, diferente, com Hulk) Com ele, toda a equipa joga a entender melhor o jogo, as suas peripécias, os seus alçapões, a equivocar-se menos com a bola, os seus ritmos, os seus caprichos. (Por isso é que sem ele em Alvalade o FC Porto perdeu o tino, sem ele em Málaga o FC Porto perdeu o carácter, sem ele no Funchal o FC Porto talvez tenha perdido o destino.)
Não querendo fazer de Vítor Pereira responsável principal pelo que suspeito que acontecerá: o Benfica ser campeão (o que seria injusto, sobretudo para o Benfica) - há, contudo, crença a que não fujo: que sem Moutinho, Vìtor Pereira teria de ser menos ortodoxo para compensar o não o ter tido quando o não teve (e não foi). E que sem Moutinho o que se viu foi que Vítor Pereira não é o que Jorge Jesus é: treinador sagaz que não se prende a um sistema como a uma obsessão e faz evangelho da ilusão (ou não) de que só se vence com a alma além da fé. E sim, eu acho: não é por ter caído na tentação do disparate que Vítor Pereira pode acabar a penar no purgatório, chegando lá, ironicamente, apenas com uma Taça da Liga em sua salvação (ou não) - é por não ter sido dessa religião de Jesus (e não ser tão subversivo como ele, o Jesus é...)"
António Simões, in A Bola
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