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sábado, 4 de outubro de 2025

No Dragão, o tempo conta!


"O Benfica queixa-se de falta de tempo, enquanto no Dragão se fez com que este realmente contasse, criando uma forte identidade. Na Luz, essa identidade é... Mourinho

O clássico está aí à porta. E mudou tanto a face do Dragão, que serão poucos os que não os consideram favoritos para o grande embate, com o bicampeão Sporting atento, a ver se finalmente aparecem fissuras no rival que já o derrotou em Alvalade. É que, para já, ao contrário do que diz Frederico Varandas, o alvo a abater deixou de morar em Lisboa. Pelo menos, para já.
O FC Porto terminou a participação no Mundial de Clubes a 23 de junho, na última jornada da fase de grupos. Numa caminhada dececionante, que contou ainda com o nulo com o Palmeiras e a derrota frente ao Inter de Miami, os dragões empataram 4-4 com o Al Ahly. Foi o prolongamento agonizante de uma temporada a todos os níveis paupérrima, porém talvez para Villas-Boas tenha sido um mal necessário para justificar a si próprio que era necessário voltar a mudar.
Já o Benfica se despediu cinco dias mais tarde, numa bonança breve após a tempestade que não se estendeu ao tempo-extra, caindo diante do Chelsea. Esses oitavos de final refletiam um pouco uma época do quase, em que as águias conquistaram o troféu menor, mas fracassaram depois na reta final do campeonato, falhando a imposição esperada perante o Sporting na Luz e, depois, capitulando no Jamor, mesmo com vantagem no marcador até perto do final dos 90 minutos. Rui Costa achou suficiente, mesmo com as dificuldades de Lage em capitalizar emocionalmente o momento (entre outras), para manter o técnico, repetindo o erro que tinha cometido um ano antes com Roger Schmidt. Apostou no imediato, mesmo com risco inerente, podendo ter colocado em causa todo o resto da temporada. Já está mais atrás do que deveria.
Os dragões iniciaram a pré-época a 11 de julho no Olival e, uma semana depois, seguiram para estágio na Áustria. As águias arrancaram a 14, três dias depois, porém a sua agenda era muito mais preenchida e apertada: o primeiro encontro oficial, a Supertaça com o Sporting, estava marcada para o dia 31; a 6 e 12 de agosto defrontavam o Nice, na 3.ª pré-eliminatória da Liga dos Campeões, o que adiaria o arranque na Liga para a 2.ª jornada, na Reboleira. A receção ao Rio Ave ficaria para mais tarde. O play-off, que se saberia mais tarde que seria com o Fenerbahçe de José Mourinho, jogar-se-ia a 20 e 27 de agosto, e pelo meio haveria o Tondela, da 3.ª ronda. Entretanto, o FC Porto estreava-se na Liga e em jogos oficiais a 11 de agosto na receção ao V. Guimarães (3-0). Contas feitas, o Benfica teve apenas menos dois dias de descanso do que o FC Porto, só que a sua pré-temporada foi pouco mais do que metade da dos rivais. Os dragões tiveram um mês de trabalho antes do primeiro compromisso oficial. As águias 17 dias e, antes do clássico, já levam nas pernas mais cinco jogos que os dragões.
Os dois clubes aproveitaram para fazer um grande investimento no plantel, com o FC Porto a abarcar todos os setores e a incluir o treinador na revolução. Lage lá continuou e garantiu os primeiros objetivos, o tal imediato de que falava: a conquista da Supertaça e o apuramento para a fase de liga da Champions. As exibições, entretanto, pioravam a cada jogo, mostrando os problemas de sempre, como a falta de qualidade no ataque posicional perante blocos mais baixos e a incapacidade de controlar os jogos, mesmo em situações de vantagem clara.
O Benfica arrancara para a Supertaça com as ideias de Lage e três reforços — Dedic, Ríos e Enzo — em campo. Já o FC Porto contou com cinco — Alberto, Bednarek, Gabri Veiga, Froholdt e Borja Sainz — e Prpic e Luuk de Jong ainda foram a jogo. Se para o Mundial de Clubes ainda viajou Martín Anselmi, pouco depois do regresso à Invicta entrou em ação Francesco Farioli, antigo discípulo de Roberto De Zerbi. Ao mesmo tempo, transparecia na Luz a ideia de que se esperavam individualidades para acrescentar dinâmicas ao processo coletivo — a imprevisibilidade de Lukebakio, mas sobretudo a criatividade de Sudakov para resolver o ataque posicional, que é sobretudo um problema coletivo ou, no mínimo, mais abrangente do que o passe de rotura. Já no Dragão, os jogadores iam chegando para completar. Claro que Froholdt se começou a destacar e a acumular elogios, porém o seu perfil estaria desde sempre contemplado e o dinamarquês não só bebe do coletivo como ele próprio o potencia.
No Benfica, também por culpa de umas eleições à porta, olha-se para o tempo como inimigo e desculpa. Fala-se de pré-época atípica e da falta de espaço entre jogos para realmente treinar (aqui, calculo que se deva ler ensinar), enquanto no FC Porto não só o ponto de partida era mais baixo, como se trocou mais (jogadores) e de forma mais profunda (ideias), e se teve apenas duas semanas mais para montar tudo. Dias importantes sim, mas sublinhe-se que se construiu um (admirável) mundo novo. Rui Costa e quem o rodeia não identificaram o problema a tempo, demoraram a reagir, atuaram tarde no mercado — não mais tarde, porque isso já é uma característica desta direção, mas demasiado tarde devido ao contexto ainda mais difícil — e pagaram demasiado.
O presidente refugiou-se na solução que menos o responsabilizará perante os adeptos e sócios — eu até trouxe o Mourinho, dirá talvez para si próprio —, no agora bombeiro mais famoso do mundo (na perspetiva do Benfica, não na sua, claro), que tem, como o próprio já disse, semanas depois de se perder em elogios ao plantel, o trabalho mais difícil da sua carreira. Mais do que num projeto ou numa ideia, ou até no perfil certo para os problemas existentes, Rui Costa coloca em cima do Special One o ónus de encontrar todas as soluções. E o Benfica fica refém do que vale ainda o melhor treinador português de sempre, do seu lado estratégico e discurso moralizador — e competência no trabalho diário —, para transformar uma equipa e até um clube sem cultura de vitória, parado no tempo e ferido de visão periférica, no mais forte em campo no domingo, no Dragão.
Pode até acontecer, o futebol é mesmo assim tão imprevisível. Todavia, com tantas diferenças, o FC Porto estará sempre mais perto de vencer. E não será tudo graças a Farioli."

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