"O senso comum sugere que as crises são 'oportunidades' e que correspondem a 'tempos interessantes'. Dois pressupostos equívocos as crises trazem empobrecimento e a história ensina-nos que quando empobrecemos não empobrecemos todos da mesma forma. Quem à partida já tinha dificuldades, sofrerá muito mais do quem tinha algum conforto. Não há nada de interessante neste processo e o mundo do futebol não é excepção: será afectado de forma desigual, consoante o contexto de partida.
Num primeiro momento da crise do coronavírus, a questão suscitada era como apurar o campeão nacional. Um tema marginal hoje e que até se pode resolver, mas que passa ao lado do essencial. Se ficar resolvida a excelsa questão do apuramento de campeões nacionais, persistirão problemas bem mais sérios para a sustentabilidade das competições domésticas, em particular de ligas semiperiféricas com a portuguesa. Caso a crise dure alguns meses, mesmo que se resolvam os campeonatos, os danos económicos e financeiros serão difíceis de reparar.
E este deveria ser o cenário no centro das preocupações de todos os agentes do sector: com ou sem campeões em 2019/20, procurar garantir condições mínimas para termos campeonatos financeiramente viáveis e competitivos na próxima temporada. Se passarem alguns meses nas actuais circunstâncias, o fosso entre clubes grandes e financeiramente robustos e os restantes acentuar-se-á, com um resultado agregado que será danoso para todos. Para os clubes portugueses, o tema é particularmente agudo.
Há hoje um paradoxo no futebol europeu. O enraizamento social dos clubes e da massa adepta é nacional (somos do Benfica, do Porto ou do Sporting em importante medida por força da rivalidade com outros clubes portugueses e não propriamente por gostarmos de eliminar clubes turcos, alemães ou ingleses), mas parte importante das receitas financeiras é europeia. Ao mesmo tempo, as dificuldades financeiras dos clubes coexistem com uma estrutura da UEFA cada vez mais próspera. A crise só acentuará este dualismo.
É por isso fundamental que neste momento, uma estrutura capitalizada como a UEFA faça tudo ao seu alcance para salvar o futebol europeu. Isso implica distribuir dinheiro não apenas pelos clubes que se qualificam para a Champions mas por todos os outros clubes que competem com estes. Se isso não acontecer, o nível de desequilíbrio interno das Ligas nacionais (entre clubes que sobreviveram porque estão nas competições da UEFA e os restantes, amarados a Ligas nacionais em recessão) será de tal ordem, que a crise será de facto uma oportunidade. Mas uma oportunidade para aqueles que há muito desejam criar uma superliga europeia, apenas com os clubes mais ricos dos campeonatos mais poderosos. Se a UEFA não contribuir para resgatar financeiramente os clubes das competições profissionais nacionais, os campeonatos nacionais serão derrotados e a superliga tornar-se-á uma inevitabilidade."
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