"Que os pequenos se agigantam com os grandes, já o sabemos. Que os outsiders desafiam o favoritismo, é inegável. Que a tendência é para que a balança se equilibre quando o «nada a perder» afronta o «cumprir a obrigação», também não sobram dúvidas. Porém, esta jornada de Taça, que viu o seu mediatismo ser repartido com os feitos de Jorge Jesus (impressionante performance e justíssimos os pergaminhos que se lhe dedicaram), merece uma forte referência para os que encontraram nela a oportunidade de mostrar o futebol no seu esplendor máximo.
Podia ser esta uma alusão ao Alverca, que, depois do recital de sobriedade que deu contra o poderoso Sporting, num aparente escândalo pela diferença de forças, deixou em alerta um Rio Ave que se contentou com a margem mínima.
Podia estar a falar de uma Sanjoanense que, indiferente ao golo sofrido cedo em Paços, foi lúcido a condicionar o adversário para depois tentar surpreender nas idas à frente. Acabou o jogo com uma bola tirada em cima da linha de golo e, mais tarde, com Pepa a admitir sem problemas que merecia o prolongamento. Quando isto acontece...
Podia ainda estar a referir-me ao soberbo comportamento do Vizela contra o Benfica. Quantos manteriam a serenidade, mesmo em vantagem, ao verem um jogador expulso tão cedo? Quantos resistiriam à tentação de recuar linhas e baixar o bloco? Quantos tremeriam com a bola nos pés perante a noção de que algo histórico disso dependeria? Há, realmente, algo a retirar do comportamento dos vizelenses e da sua organização, até por clubes da Liga NOS que teimam em ceder previamente aos estatutos e às dimensões.
Ou da personalidade do Marinhense. Ou da perseverança do Canelas. Ou da persistência do Sp. Espinho.
Mas estou sobretudo a falar do impressionante feito do Sertanense. Se não bastasse a diferença entre uma equipa profissional (Farense), líder do segundo escalão e a fazer uma época muito boa, e uma equipa que não o é e que está no quarto lugar da série C, essa diferença ainda se acentuou na desvantagem no marcador aos 31 minutos e nas duas expulsões na segunda parte. Chegariam ao empate com nove e levariam o jogo para prolongamento com oito, o que, por si só, já mereceria uma menção honrosa.
Não chegava. Num relvado longe de estar em boas condições, a dimensão emocional dos destemidos da Sertã protagonizou um conto de fadas, uma daquelas histórias que, se não houvesse registo escrito, online e vídeo, daqui a uns anos poderia soar a um valente exagero quando contado pelos protagonistas. O que feito do Sertanense sucede, para já, à mágica campanha do Caldas há duas épocas e a muitos outros contos históricos que esta competição alberga com uma vertente de mística distinta. À atenção da FPF, fica a sugestão de, nas próximas edições das Quinas de Ouro, criar também um prémio para desempenhos hercúleos no futebol português, sobretudo agora que o canal 11 torna ainda mais visível muitas potenciais estórias.
«Já não há jogos fáceis», costumam dizer. Discordo. Há jogos com todo o potencial para o serem, desde que a seriedade seja visível desde o primeiro apito. Mas bem longe estarão aqueles que pensam ver a diferença teórica fazer naturalmente a diferença. Bem longe... ou em casa, a ver pela televisão. Este Campeonato de Portugal está atestado de boas histórias e de muitos gritos por outros palcos."
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