"A ideia de Benfica é uma construção assente nas histórias concretas de todos aqueles que ajudaram a construir um clube garboso, plural e democrático: o Cosme Damião e o Félix Bermudes que sonharam alto e, desde baixo, deixaram uma inscrição popular definitiva na nossa agremiação; o Rogério Pipi e, depois dele, o José Águas que encheram as balizas de golos, inaugurando uma senda vitoriosa; o Coluna, o Eusébio e o Simões que nos ofereceram a Glória internacional; o Toni que, na sua bonomia e generosidade, tem a capacidade única de representar todas as qualidades do benfiquismo; e o Chalana, o Diamantino e o Carlos Manuel, capitaneados pelo gigante Bento, que juntaram as vitórias a uma vontade indómita, bem portuguesa, sustentada no antes quebrar do que torcer.
Se nomeio estes exemplos é porque, no essencial, são excepções, hoje ainda mais raras. O Benfica é nosso: dos adeptos que ficam sempre e não de dirigentes e jogadores que, transitoriamente, nos representam ou envergam o manto sagrado.
Há, contudo, um nome que não referi e que ajudou a construir a ideia de Benfica: o Shéu Han. Quando primeiro comecei a ir ao velho Estádio da Luz, no início dos oitenta, já o Shéu por lá andava há mais de uma década – sempre com uma delicadeza quase silenciosa na forma como tocava na bola e uma sobriedade elegante que o diferenciava em campo. Enquanto dirigente, transportou essa mesma moderação que exibia nos relvados para as estruturas do clube e, no meio de muitas tormentas que tivemos de ultrapassar, o Shéu lá estava sempre, como referência moral de ponderação e educação. Visto da bancada, como jogador ou como secretário-técnico, o Shéu foi sempre um pêndulo de sensatez e de racionalidade. Duas qualidades tão necessárias como escassas num clube de futebol.
Mas foi, também, o Shéu contido quem melhor nos representou na forma como festejou exuberantemente com o Luisão a conquista do tetra, que nos devia ter levado ao penta. Aquela imagem celebratória, de dois gigantes que, em pleno relvado, se abraçam, perdurará como espelho do benfiquismo. De alguma forma, foi naquele abraço que nos encontrámos todos, adeptos e equipa.
Não nos despedimos do Shéu, porque ele também é o Benfica. Mas, agora, que, a seu pedido, abandona as funções que desempenhou no clube nas últimas décadas, o Benfica não lhe pode agradecer apenas com um vídeo, lançado nas redes sociais, em pleno verão. O mínimo que podemos fazer é, num dia de Luz cheia, aplaudi-lo de pé, reconhecendo a forma como o Shéu nos representou e projecta uma imagem consentânea com a ideia do Glorioso. Aliás, por aquilo que corporiza, o Shéu Han podia bem ser o prefixo do nome do nosso clube: de Lisboa e de Benfica, mas construído a partir de uma matriz cosmopolita e moralmente íntegra, que, nós sócios, temos o dever de defender. Em todos os momentos."
Pedro Adão e Silva, in Record
Sem comentários:
Enviar um comentário
A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!