"Há cerca de ano e meio dediquei-me, nestas páginas, a pensar sobre qual poderia ser o motor do sucesso de Bruno de Carvalho. Estávamos à beira das eleições que viriam a conferir-lhe uma retumbante vitória e identifiquei na estratégia de criação do inimigo a sua grande força. O maior problema dessa estratégia seria a sua manutenção no tempo. Sem vitórias desportivas no futebol, escrevi que a sua única possibilidade de sobrevivência seria através de uma escalada de radicalização.
A radicalização foi feita a partir da criação de um discurso de exclusiva responsabilização da equipa técnica e jogadores de futebol pelo insucesso. Os “meninos mimados” e “bem pagos” não conseguiam os títulos que outros jogadores e técnicos conseguiam noutras modalidades. Esta foi uma retórica interna decisiva para o fortalecimento do poder na qual se lançaram adeptos contra trabalhadores e também trabalhadores contra trabalhadores. À medida que, no futebol, começava a ganhar forma uma unidade de acção para lidar com a sua entidade patronal, os trabalhadores de outras modalidades faziam questão de mostrar o seu apoio ao presidente-adepto - que até falhava o jogo decisivo da equipa de futebol para apoiar outras modalidades. Depois do que se passou em Alcochete, não deixa de ser triste assistir ao seu silêncio*.
Os chamados “apertões” de adeptos são reconhecíveis em todos os clubes. São vistos como comportamentos admissíveis e raramente punidos, quando não estimulados pelas respectivas lideranças dos clubes. Com o ambiente radicalizado contra a equipa de futebol, o que se passou em Alcochete não é anormal mas, felizmente, está muito além do que a sociedade considera admissível. Os “activos” voltaram a ser vistos como seres humanos e trabalhadores. A imagem da testa partida e a lágrima de Bas Dost recolocou a maioria, independentemente do clube do coração, a priorizar a dimensão humana e laboral do problema. Afinal, ainda não voltou a ser admissível bater em trabalhadores para que melhorem a sua performance.
* Silêncio que não se esgota em Alvalade, estendendo-se, fora do clube e por diferentes razões não menos criticáveis, à pouca solidariedade pública demonstrada pelos demais colegas de profissão. Honra seja feita a Sérgio Conceição, Casillas e todos os que não se mantiveram publicamente em silêncio por terem uma entidade patronal desportivamente rival."
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