"PARIS - Escrevo esta coluna sentado no chão, na zona mista do Stade de France, enquanto espero por ouvir os homens que vão ficar na história do futebol português. Faço-o porque me dá jeito, mas também para tirar-me das nuvens. Para voltar a pôr-me no sítio onde devo estar e manter a racionalidade. Mas não é fácil. Depois da daquela noite de 25 de Janeiro de 2004, em Guimarães, quando assisti à morte de um jogador em campo, este é o dia mais difícil em gerir as emoções. Elas andam aqui por dentro, às voltas, borbulhando no estômago, querendo saltar, depois de assistir a 120 minutos delirantes, onde vi de tudo: um jogador perder a pose de deus e transformar-se no mais frágil dos humanos, no único momento em que a excepção nunca poderia contrariar a regra; assistir à ovação de pé que milhares de franceses prestaram a um jogador que tanto criticaram; o destino que parecia escrito naquele remate de um gaulês a jogar no México mas alguém terá soprado o couro para o poste e; a outra bola que bateu no ferro, mas no ferro mau; o jogador que afirmou, no início do estágio em Marcoussis; sonhar com um grande momento e poucos acreditarem; o mesmo jogador que usa uma luva branca quando celebra um golo como forma de expurgar males a críticas, mas fundamentalmente como amuleto motivacional. A luva que vi naquela mão negra, apontando o indicador para cima. E eu sem conseguir fazer qualquer comentário. Porque as cordas vocais por momentos ficaram inertes depois do esforço a que foram submetidas com aquele pontapé tão forte quanto a alma coletiva de 11 milhões de crentes.
Chega o apito final. Comovo-me como nunca em 18 anos de carreira. Porque é impossível não ter sentimentos quando se escreve sobre emoções. E sabermos que temos uma família a torcer para que se se juntem as palavras Portugal e campeão no mesmo texto, menos saudade, apesar de muita. É, pois com o enorme orgulho que digo: também sou campeão. Peço desculpa, o melhor é pôr-me novamente de pé."
Fernando Urbano, in A Bola
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