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quinta-feira, 31 de julho de 2025

De João Félix aos grandes de Portugal: o futebol é sempre contexto


"Vai ser curioso ver João Félix do lado dos favoritos do povo, de Cristiano Ronaldo, o herói intocável, e Jorge Jesus, o mestre da tática. Vou deixar a minha previsão, em contraciclo com o que tenho lido e ouvido: Félix desatará a marcar golos e a brilhar com regularidade não por ter passado a estar mais focado ou com nova atitude – que será a explicação generalizada – mas essencialmente porque jogará na posição certa para ele (a de segundo avançado, que Jesus valoriza muito) e num campeonato com espaço para finalizar, o que favorece quem define acima da média, como é o caso.
No contexto tático certo e num campeonato desequilibrado, Félix só pode funcionar. Daí será um pequeno passo até à discussão sobre a titularidade na seleção (finalmente!), até pelo entrosamento com Ronaldo. Mas claro que o mérito nunca será do jogador que amamos odiar, antes será atribuído ao profissionalismo contagioso do CR7 ou ao rigor de liderança imposto por JJ. Ou seja, se eu estiver certo, serei acompanhado por um exército dos que «sempre admiraram o talento do jogador», só que não. Claro que se esta previsão falhar, cá estarei a admiti-lo. Sozinho, provavelmente.
Na linha do talento de Félix surgiu recentemente Rodrigo Mora, na mesma afirmação exuberante de quem executa melhor que os outros e encerra jogadas como se finalizar não fosse afinal a mais difícil das artes em campo. Sucede que o futebol é mesmo contexto e no sistema preferencial de Farioli (o 1.4.3.3. que se esboça) não está fácil encontrar espaço para quem não é tão agressivo a atacar (e a assumir o 1 para 1) como Borja Sainz nem a defender (e a assumir também os solicitados duelos individuais) como Gabri Veiga ou Froholdt.
Quer isto dizer que nos lugares que a nova estrutura pode reservar a Mora - médio interior mais ofensivo ou falso extremo a partir da esquerda – estão os principais reforços do FC Porto até agora. Daí que ou Farioli muda o sistema para acomodar Mora ou muda Mora para encaixar no sistema. O treinador parece acreditar mais nesta última, mas não será parto sem dor.
No Benfica não se percebe ainda qual é, afinal, a nova ideia tática. A mesma equipa que sonhou juntar Félix e Thiago Almada acredita agora que é possível um onze sem nenhum jogador desse perfil. O valor investido em Ivanovic (e a sua qualidade indiscutível) sugere titularidade ao lado de Pavlidis, e claro que dois bons jogadores são sempre compatíveis, mesmo se nenhuma equipa de topo na Europa alinha com um par de pontas de lança declarados. Mas o problema essencial está taticamente a montante: quem vai alimentar a capacidade finalizadora da dupla greco-croata?
Isto num onze sem alas/extremos de topo - os titulares no arranque de época serão Aursnes e Akturkoglu, o que é curto para a ambição anunciada – e em que o médio que liga jogo por dentro não existe propriamente. Kokçu já não está e Di María não surgirá da direita a pedir a bola para ser ele a escolher o rumo das jogadas. Sim, há Richard Ríos, encantador para quem aprecia o médio maratonista e combativo, mas ver no colombiano um organizador de jogo é tão desajustado como considerar que a velocidade é o melhor atributo de Otamendi.
Do outro lado na Supertaça estará um Sporting em busca de uma identidade alternativa, mas já com um ponta de lança, Luis Suárez, para combater as saudades de Gyokeres e render, no imediato, o que Harder, pese todo o voluntarismo, está longe de garantir. Prevejo o colombiano titular frente ao Benfica, para ver se o novo finalizador disfarça a insegurança do 1.4.2.3.1 em que Rui Borges insiste. Não me parece que o novo desenho favoreça nem os maiores talentos – Trincão e Quenda – que precisam de mobilidade (por não serem exatamente velocistas) e têm vantagem em pisar mais terrenos interiores, nem os mais competitivos Catamo e Maxi Araújo, jogadores mais de aceleração que de definição (a despeito da veia goleadora de Geny) e que teriam vantagem em partir de terrenos mais recuados. A decisão deste troféu frente ao Benfica pode bem ser o teste do algodão: se corre bem, Borges insistirá na nova via, se fracassar lá irá de regresso ao formato Amorim. Porque o contexto tático conta, sempre e uma vez mais.

PS: Podem dizer o que disserem, mas as três melhores equipas do atual futebol brasileiro – as que seguem no pódio - têm indelével marca portuguesa. Lidera o Flamengo, que o diretor desportivo José Boto dotou de um plantel de luxo, seguido do Cruzeiro, a quem Leonardo Jardim devolveu competitividade, e de um Palmeiras que Abel Ferreira mantém altamente competitivo (e ganhador) ao sexto ano em São Paulo. Só pode haver mesmo competência, porque não há coincidências."

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