"Este sistema não serve o futebol. Muito menos serve o Benfica. O clube não pode continuar a competir em competições sem credibilidade.
“Há coisas que ultrapassam todos os limites”, disse ontem Rui Costa aos jornalistas, depois da derrota na final da Taça de Portugal. Sim, ultrapassaram-se todos os limites. Mas não apenas no campo. Este domingo, o Benfica não perdeu apenas uma final. Perdeu-se, também, a última réstia de esperança numa presidência que chegou ao fim sem deixar obra feita. O que vimos foi a confirmação de um ciclo falhado, marcado pela ausência de liderança e de rumo.
É difícil escrever isto. Difícil porque, como qualquer benfiquista, habituei-me a ver Rui Costa como símbolo de talento, entrega e mística. Mas o respeito pelo passado não pode justificar a continuação de um presente sem direção. E exige-se, a quem ocupa esse lugar, muito mais do que esforço ou boas intenções. Nestes últimos quatro anos, em que lhe foram oferecidas condições únicas para governar, Rui Costa tornou-se, ele próprio, um fator de instabilidade. Ora vejamos: o clube passou a estar ainda mais dependente da venda de jogadores para alcançar a sustentabilidade financeira. Teve mais treinadores do que títulos. E mais administradores da SAD a sair do que conquistas alcançadas. Manteve-se refém de interesses externos e de circuitos que deveriam ter sido cortados. Não reteve muitos dos seus principais quadros internos. Não lançou uma única infraestrutura relevante.
Ao longo dos últimos anos, tentei contribuir de forma construtiva para o clube, com ideias, propostas e com o livro A Nossa Camisola, onde procurei pensar o Benfica de forma exigente e ambiciosa. Infelizmente, o modelo de clube estagnou. Os erros repetem-se. Os discursos sucedem-se. E o Benfica continua entregue à inércia.
Tal como defendi em A Nossa Camisola, o problema vai além do Benfica. É também do futebol português. Depois de uma das finais mais escandalosas da história das competições nacionais, o clube não protestou o jogo nem exigiu a erradicação do VAR, Tiago Martins. E quando o maior clube português não age, o sistema agradece. Não podemos continuar a tapar os olhos.
O futebol em Portugal está capturado por vícios estruturais e poderes instalados que bloqueiam qualquer tentativa de modernização. Os regulamentos são aplicados de forma desigual. As decisões disciplinares carecem de critério. A arbitragem permanece opaca e sem responsabilização. A centralização dos direitos televisivos está parada. As instituições que regem a modalidade são geridas sem rumo, tornando-se meros espaços de acomodação, onde se protegem equilíbrios e se evitam conflitos.
Este sistema não serve o futebol. Muito menos serve o Benfica. O clube não pode continuar a competir em competições sem credibilidade. E tem de agir perante a erosão da verdade desportiva.
Faltam ideias.
Faltam reformas. Falta coragem. E o Benfica, que deveria ser protagonista dessa mudança, tem sido cúmplice por omissão. Hoje, mais do que nunca, é claro: se não formos nós a liderar esta transformação, não será ninguém.
O que está em causa é uma ruptura. E essa ruptura exige coragem e visão. Não se trata de um gesto impulsivo, mas de uma exigência institucional. Se o Governo continuar ausente, se a Liga e a Federação persistirem na opacidade e na conivência com o imobilismo, então o departamento jurídico do Benfica terá de analisar todas as hipóteses, incluindo ponderar a continuidade do clube nas competições nacionais. Liderar também é saber dizer basta. Com firmeza, com clareza e com autoridade.
Chegou o tempo da coragem. E essa coragem começa por reconhecer aquilo em que se falhou. Não há tempo a perder com dirigentes da velha guarda nem com candidatos que têm medo de incomodar. A ruptura não se faz com conciliadores, nem com perfis de diplomata. Faz-se com quem está disposto a enfrentar interesses, a incomodar poderes instalados e a liderar com firmeza. Chegou o momento de romper com o que falhou e construir, com exigência, um novo ciclo.
Competência, ambição, coragem, exigência e respeito. São estas as cinco condições essenciais para voltar a vencer. Quando estão presentes, constroem-se equipas, instituições e campeonatos. Quando faltam, colecionam-se desculpas. Rui Costa teve tempo, teve legitimidade, teve meios. Faltou-lhe o essencial: visão estratégica e capacidade de ruptura. Quem ama o Benfica, como ele ama, terá sempre lugar no clube. Mas não é à frente dos seus destinos.
Neste momento, a melhor decisão que compete à atual direção é apenas uma: demitir-se em bloco e permitir que o clube avance, de imediato, para eleições. O Benfica já perdeu tempo demais.
Precisamos de um Benfica capaz de se modernizar por dentro e de transformar o futebol por fora. Um Benfica que lidera sem hesitar, que protege os seus interesses sem medo e que constrói o futuro com seriedade. Esse é o compromisso que hoje se exige — um compromisso à altura do amor à nossa camisola, que deve estar sempre acima de qualquer agenda pessoal ou ciclo dirigente.
O Benfica tem de estar sempre em primeiro."

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