"Um dos melhores deste século colocou agora um ponto final na carreira, aos 40 anos, mas já há seis que nos despedimos dele. Amor ao futebol fê-lo estender este adeus ao máximo e bem longe
Se daqui a uns anos me for esquecendo do que jogava Don Andrés Iniesta, espero que o algoritmo que adivinha os meus interesses me comece a mostrar aquelas imagens do pequeno 8 rodeado de adversários por todo o lado. Eles bem tentavam: aproximavam-se, cheiravam a bola e sentiam que estavam mesmo, mesmo quase a tirá-la. Puro engano, malabarismo até, do craque que dedicou uma vida a um clube - a mais que um clube, aliás. A bola era dele.
Sou de uma geração que não se pode queixar muito: não vi Pelé e para ver Maradona como deve ser tive de puxar as cassetes atrás, mas tive a sorte de acompanhar Messi e Cristiano Ronaldo do princípio até - espero - ao fim. Nunca vi ninguém jogar como aquele Barcelona de Guardiola e, se a memória não me falhar, guardarei um espaço muito especial para Iniesta e para a forma como nos divertia.
Custa sempre despedirmo-nos dos melhores, mas este é um luto que já estava feito. O médio colocou agora um ponto final na carreira, aos 40 anos, mas foi naquela conferência de imprensa muito chorosa em Barcelona, em 2018, que nos disse adeus. De acordo com a personalidade que também mostrava em campo, Andrés retirou-se dos holofotes europeus e passou os últimos seis anos no Japão e nos Emirados de forma humilde e recatada. No vídeo que partilhou na segunda-feira, nas redes sociais, a anunciar a retirada, é Luis Enrique quem descreve esta decisão melhor do que ninguém: Iniesta era como um miúdo a jogar à bola na rua até ficar de noite e a mãe o chamar constantemente para casa. Ele esticou o futebol ao máximo, queria sempre mais um bocadinho, mas nós já não o víamos no escuro.
O debate sobre a ida para campeonatos distantes (e desinteressantes) e sobre qual o melhor momento para sair vai continuar: Kroos abandonou no pico e ainda deixou saudades no Real Madrid; Messi e Cristiano serão eternos, mesmo que provavelmente não saibam desistir. Mas Iniesta fez o que sabe tão bem: aproximou-se do fim, deixou-nos a pensar que lhe iam tirar a bola e continuou com ela até quando quis.
Agora, na hora de a passar de vez, até os rivais de Madrid lhe fazem a devida vénia. Já aqui escrevi que aprecio muito as rivalidades, mas é nestas alturas que elas podem ser ainda mais bonitas. É verdade que aquele golo na final do Mundial 2010 o tornou o único jogador que era ovacionado pelas bancadas adversárias ao sair, mas esses ventos não vêm só de Espanha: quem gosta de futebol, aplaudirá sempre Andrés Iniesta. Obrigada por tudo."
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