"Observam-se os jogos, olha-se para a classificação da Liga portuguesa, e se o grau de exigência for minimamente elevado percebe-se depressa que se joga pouco. Descontem-se os quatro grandes, que são cada vez mais quatro, e quase nenhuma das outras equipas justifica duas horas no sofá, desprezando um livro ou um filme, ainda por cima pagando uma mensalidade cara em tempo de inflação forte. Um exemplo: alguns dos melhores sinais táticos das últimas semanas chegaram dos dois últimos lugares da tabela, de um Marítimo bem mais ofensivo (não há que ter medo das palavras) com José Gomes, como ainda se percebeu na primeira parte contra o Porto, e de um Paços de Ferreira, de novo a querer jogar no campo todo (desde o regresso de César Peixoto), como foi nítido até diante do líder Benfica. Se imaginarmos um campeonato sem os quatro emblemas do topo e a começar agora, o campeão bem podia ser um dos principais candidatos à descida. Não quer isto dizer que não haja mérito mais acima na tabela, o que não há é equipas completas, de todos os momentos do jogo, em que as preocupações defensivas não condicionem definitivamente as ambições atacantes. Quantas equipas jogam agora, por exemplo, com mais um defesa, numa linha de 5 atrás, sem que se perceba por que o fazem e sem sequer terem centrais de tanta qualidade que justifiquem o lugar extra no onze. Até o Braga caiu na tentação em Alvalade e deu no que deu. No futebol, a obsessão pela eficácia anula a audácia.
Não se negue o rendimento notável do Casa Pia, num impressionante quinto lugar da tabela, mas também não se diga que apresenta um jogar entusiasmante, mesmo se particularmente competente na metade defensiva do jogo. Aliás - e reforçando que há competências claras na equipa de Filipe Martins, para que não se entenda mal o que escrevo - ter em quinto lugar um conjunto que joga em casa emprestada e com escassas centenas de adeptos nas bancadas é bastante significativo. E o Vitória de Guimarães consegue aguentar-se como sexto da tabela – o que está longe de ser trágico, ainda que os adeptos não o entendam – mesmo depois de ter estado oito jogos sem vencer. Poderia ser sinónimo de competitividade, mas verdadeiramente significa insuficiente qualidade. Até porque a maioria das equipas não joga melhor hoje, após meio ano de trabalho, do que no início da época. Há uns fogachos no Arouca e no Vizela, boas intenções com bola do Chaves, um crescimento coletivo discreto em Famalicão, mas é tudo muito curto. Falta qualidade individual em muitos plantéis, não o nego, mas falta sobretudo coragem tática, vontade de dividir jogo concretizada em campo e não anunciada apenas em conferências de imprensa. Passamos a vida a discutir o mercado e os castigos, o VAR e o tempo útil de jogo, mas o que faz mais falta são ideias. De jogo mesmo. E das boas. E talvez façam falta mais treinadores estrangeiros, num futebol que se acomodou à ideia de que tem os melhores e passou a olhar em demasia para o umbigo."
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