"De 1958 a 1960 e de 1984 a 1996, foi nesta época que o nosso país acolheu aquela que era a maior competição de motores do mundo, e ainda o continua a ser, a Fórmula 1.
Porém, desde então que Portugal espera ser um pouco mais atractivo a nível financeiro, para voltar a fazer parte de um calendário tão impactante como o da Fórmula 1, sendo importante referir que, tanto o Autódromo do Estoril como o de Portimão, tem em mãos a classificação mais alta da medida dos circuitos, o que os torna aptos para receberem um evento desta dimensão.
Enquanto isso não acontece, aguardamos e recordamos quatro dos melhores espectáculos jamais vistos nesta circunstância em Portugal que, para além de ter juntado milhares de espectadores, juntou também os melhores pilotos da História, muitas delas consideradas lendas da modalidade.
1.
Grande Prémio de Portugal 1984 – Em 1984 o mundo era bastante diferente do actual e a Fórmula 1 não foge à regra. Em comparação com a última temporada de Fórmula 1, em 2019, as forças dominantes nessa altura eram a McLaren, a Williams, a Tyrrell, a Lotus e a Brabbham—BMW. O campeão de ’83 era Nelson Piquet.
Em 1984, a combinação Nikki Lauda, Alain Prost, com o McLaren MP4/2, equipado com um motor TAG-Porsche foi a melhor. Estiveram os dois a lutar até ao final da temporada pelo título, que culminou numa corrida épica no Estoril.
1984 marcou o regresso da Fórmula 1 a Portugal. Desde 1960 que os carros mais rápidos do planeta não corriam em território português, sendo que naquela altura se correu em Boavista e Monsanto.
Em 1984, o circuito do Estoril era palco da decisão do título. Alain Prost e Nikki Lauda já tinham dado o campeonato de construtores à McLaren, agora restava saber quem seria o campeão do mundo. Prost arrancava de segundo, enquanto Lauda via a sua tarefa mais dificultada, arrancando no 11.º lugar.
Num tempo em que as desistências eram muito mais comuns, Lauda aproveitou esse fator (só neste Grande Prémio retiraram-se dez pilotos), mas o melhor foram as excelentes ultrapassagens que o austríaco proporcionou aos adeptos portugueses. No fim, conseguiu terminar em segundo, passando o Toleman de Ayrton Senna. Na frente da corrida, a vitória ficava para Prost, que beneficiava do abandono de Nigel Mansell no Lotus, devido a problemas de travões, mas não ficava com o título.
Uma corrida épica, que ‘inaugurou’ o Estoril à Fórmula 1 de uma forma excelente. E em 1985, outro grande piloto estreou-se a vencer em Grandes Prémios, mas isso pode ler mais à frente neste artigo. Já Alain Prost seria campeão em 1985. Lauda, por outro lado, em 1985 teve um ano para esquecer e desta vez ‘reformou-se’ de uma vez por todas.
Reveja o Grande Prémio de Portugal de 1984 no vídeo colocado acima.
2. Grande Prémio de Portugal 1985 – Se o Grande Prémio do Mónaco de 1984 anunciou a chegada de Ayrton Senna, o Grande Prémio de Portugal foi um grito de afirmação à Cristiano Ronaldo a dizer: “Eu estou aqui!!”
Vamos ser honestos, se na tua segunda época de sempre na Fórmula 1, ao volante de um carro que nem é dos três melhores da grelha, dominas de tal forma uma corrida, que terminas a 63 segundos de vantagem do segundo classificado, que conseguiu ser o único a não levar uma volta de avanço tua, é porque és alguém muito especial, e neste caso em especifico, era mesmo.
Há vários exemplos da mestria de Ayrton Senna na chuva, desde a corrida do Mónaco em 1984, até Donington em 1993, incluindo claro está, esta vitória em solo português ao volante do Lotus 97T.
A chuva chegou ao Circuito do Estoril mesmo antes do início, que para Senna era quase como um presságio. Dependendo do seu começo, o brasileiro sabia que poderia ter um caminho livre pela frente, ou, por outro lado, começando mal, ficaria envolto por toda a água levantada pelos carros à sua frente. Para quem era estreante na pole position, o brasileiro fez um excelente trabalho ao arrancar, sem derrapar, liderando o seu colega de equipa, Elio de Angelis (que ele bateu na qualificação por mais de um segundo) na primeira curva.
Durante a corrida, a chuva aumentou até níveis próximos de uma monção, o que resultou em apenas 9 dos 26 pilotos que começaram a corrida, conseguirem acabar. A maioria dos que não terminaram viram a sua corrida terminar após perder o controlo dos seus monolugares, e falamos de pilotos extremamente capazes, como Keke Rosberg (Williams), Alain Prost (McLaren) e Ricardo Patrese (Alfa Romeo). Outros retiraram-se pelos habituais problemas de fiabilidade da maioria dos carros da época.
À décima volta, Senna já tinha uma liderança de 13 segundos, com Elio de Angelis em luta acesa com Alain Prost e Michele Alboreto (Ferrari). Com 20 voltas passadas, a liderança já era de 30 segundos para de Angelis, seguido de Prost e Alboreto. Por esta altura, apenas nove carros ainda não tinham ficado uma volta atrás de Senna, que conduzia como se nada se passasse, com uma calma e controlo absoluto sobre uma corrida, onde mais ninguém o possuía.
A partir da trigésima volta, vendo pilotos de grande nível como Gerhard Berger (Arrows) e Alain Prost despistar-se, Senna começou a pedir aos comissários para parar a corrida, como tinham feito no Mónaco em 1984, porém não houve interrupções ou paragens, era para continuar a correr, algo impensável nos dias de hoje, tendo em conta o autêntico rio em que a pista se tinha transformado.
Não foi a meio da corrida, mas foi a três voltas do fim que se decidiu terminar a corrida. Como o ritmo tinha sido tão lento devido às condições da pista, já se tinha chegado ao limite imposto de duas horas e o director da corrida decidiu terminar a mesma. Senna vencia o seu primeiro Grande Prémio, tendo liderado todas as voltas e dobrado todos, menos o segundo classificado Michele Alboreto. A fechar o pódio, estava o Renault de Patrick Tambay, que após começar em 12.º, conseguiu uma boa dose de pontos para a equipa francesa.
Foi a primeira vitória de Ayrton Senna na Fórmula 1, e era difícil fazê-lo de forma mais contundente. O brasileiro é ainda hoje, muito querido pelos fãs de Fórmula 1, particularmente os fãs portugueses e, em conjunto com outros factores como a partilha da língua mãe, esse carinho dos portugueses por Senna deve-se ao facto de ele ser o grande protagonista da melhor corrida de Fórmula 1 a acontecer no nosso Portugal.
3. Grande Prémio de Portugal 1989 – Se pensa que o GP de Portugal de 1989 poderia ter sido um dos Grandes Prémios mais importantes desse ano, então está certo. Na luta pelo campeonato, Ayrton Senna (McLaren) precisava desesperadamente da vitória para continuar a lutar pelo título contra o seu colega de equipa, Alain Prost. Porém, este GP acaba por revelar-se um autêntico desastre, pois as coisas deram para o torto.
O Autódromo do Estoril, em 1989, deu combustão, em pista, a uma das rivalidades mais emblemáticas da época: Nigel Mansell (Ferrari), já teria sido desqualificado da corrida. Mas nem isso impediu o britânico de tentar lutar pelo segundo lugar, este ocupado por Ayrton Senna.
Esta luta intensa acabou por deixar os dois pilotos retirados da corrida, por colisão, numa curva mal fechada pelo piloto brasileiro. Esta circunstância acabou com a possibilidade de Ayrton Senna lutar pelo título, visto que o seu colega de equipa, Alain Prost, acaba em segundo lugar, apenas ultrapassado pelo já vencedor da pole position, o austríaco Gerhard Berger (Ferrari).
Para além das controvérsias geradas pelos «tubarões» da altura, é importante salientar que a Onyx – sim, a Onyx – conquistou, em terras portuguesas, o primeiro e o único pódio da sua História enquanto equipa. Como se se tratasse de um golpe de sorte, Stefan Johansson sobe ao pódio, representando a bandeira sueca.
Poderá rever o incidente entre Ayrton Senna e Nigel Mansell no vídeo colocado acima.
4. Grande Prémio de Portugal 1993 – O ano é 1993, os computadores cada vez mais se tornam uma ferramenta essencial, capazes de maravilhas, desde os maravilhosos efeitos visuais do Parque Jurássico, aos carros de Fórmula 1 mais avançados que já se viram nas pistas do nosso planeta. Apesar de adorar falar dessa obra-prima de blockbuster do Steven Spielberg, é nas quatro rodas que me vou focar, particularmente no Grande Prémio de Portugal, no nosso Autódromo do Estoril.
Vamos só fazer um pequeno apanhado da época de 1993. A Williams vinha de uma época absolutamente dominadora em 1992, em que Nigel Mansell, ao volante do seu FW14, limpou por completo toda a concorrência. Em 1993, Mansell retira-se e, para o seu lugar, saído da reforma, vai Alain Prost, na altura, tricampeão mundial.
O francês toma conta do Williams FW15C, cuja lista de equipamento faz inveja a muitos carros de luxo modernos. Estamos a falar de Suspensão Ativa, Direção assistida, ABS, uma transmissão semi-automática que podia ser usada como automática, uma infinidade de sensores e computadores e, se isto não bastasse, um botão de ultrapassagem. Com um arsenal destes à sua disposição, o único piloto que ainda foi capaz de fazer frente, mas sem sequer dar luta pelo campeonato foi Ayrton Senna, ao volante do comparativamente limitado, McLaren MP4-8.
Chegando a Portugal, a Williams já tinha garantido o Campeonato de Construtores duas corridas antes na Bélgica, só faltava Prost garantir o Campeonato de Pilotos. Apesar de vitorioso, o francês revelou antes da corrida em Portugal, que 1993, seria a sua última época ao volante de um carro de Fórmula 1.
Na qualificação, os Williams fizeram a habitual dobradinha na fila da frente, mas desta vez com Damon Hill na pole position e Prost em segundo. Um dos grandes acontecimentos desta corrida foi a estreia de um tal Mika Häkkinen ao volante de um McLaren, que na sua primeira sessão de qualificação se colocou em terceiro à frente de Senna, em quarto, e Jean Alesi ao volante do seu Ferrari, em quinto. (Häkkinen substituía Michael Andretti depois de uma temporada sofrível do americano).
Apesar de conseguir a pole position, Damon Hill deixou o carro ir abaixo durante a volta de aquecimento, sendo enviado para o fim da grelha. As luzes vermelhas apagam e Prost foi apanhado a dormir ultrapassado por Alesi e pelos dois McLarens com Alesi à frente de Senna e Häkkinen. No final da primeira volta, Alesi estava na liderança, seguido por Senna, Häkkinen, Prost e Schumacher no seu Benneton.
A luta entre os cinco primeiros manteve-se acesa durante as primeiras voltas, porém, à vigésima volta, o motor Ford do McLaren de Senna decidiu desistir da corrida. Após uma luta estratégica entre os candidatos à vitória, e cada um fazer a sua paragem, a ordem era diferente, com Schumacher na liderança, seguido por Prost, Häkkinen, Hill e Alesi.
Enquanto a corrida desenrolava, a luta pela vitória passou a resumir-se a dois homens: Prost e Schumacher. O francês começou a tentar atacar a posição do alemão, mas Prost é conhecido como “O Professor” por alguma razão, e fazendo as contas, viu que o segundo lugar chegava, e não havia necessidade de correr riscos desnecessários que lhe estragassem a vitória mais importante. Schumacher venceu assim a sua segunda corrida (a primeira foi o Grande Prémio da Bélgica em 1992), Prost terminou em segundo, tornando-se Campeão do Mundo e Damon Hill recuperou estupendamente dos problemas iniciais para terminar em terceiro.
Faltavam ainda duas corridas para terminar o campeonato, que foram vencidas por Ayrton Senna, mas nós, como portugueses, podemos sentir orgulho em ver a última vitória e o último título daquele que será para sempre recordado como uma lenda da Fórmula 1, “O Professor”, Alain Prost."
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