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quarta-feira, 3 de julho de 2019

Sabe quem é? Um 'sheik' sem hárem - Caio Lucas

"Aos 17 anos estava para deixar o futebol, japoneses não o deixaram; Não veio para o FC Porto, veio para o Benfica

1. Nasceu, por Abril de 1994, em Araçatuba (que, no interior paulista, se conhece como a Cidade do Boi Gordo) e por lá se lançou ao futebol na escolinha do América. Não tardou que o desafiassem para o São Paulo FC. Vendo-o chegar com metro e meio de altura, passaram a chamar-lhe Baixinho. Por lá andou seis anos (na sua equipa jogava Lucas Moura) - e, dum instante para o outro, o seu sonho parece tornar-se cinza.
2. Acabara de fazer 16 anos - e foi como se o céu desabasse sobre a sua cabeça: «No São Paulo falavam desde o começo que eu não tinha tamanho para ser jogador e, então, arrumaram esse motivo para me dispensar». Amargurado com a guia de marcha, ainda se aventurou a teste no Santos e no Palmeiras - e, em ambos os casos, a resposta que não, não o queriam.
3. Achando a esperança a fugir-lhe por entre os pés, deu a um amigo e material de futebol que tinha e atirou-se à busca de trabalho «em qualquer coisa que pegasse». O destino deu-lhe, desconcertante, futuro outra vez: «Ouvindo falar de japoneses que façam temporada por ali, meu pai insistiu que fosse a um jogo em Birigui, cidade ao lado da minha, com esse tal colégio de Chiba. Peguei as minhas chuteiras de volta ao meu amigo e fui ao amistoso com eles. Com dois toques na bola, logo me quiseram...»
4. A proposta soltou-se-lhe no final do jogo: ir para o Japão jogar e estudar - e já lá fez 17 anos. «Fui com Breno, não sabíamos falar nada. Quando a japonesada falava com a gente só dávamos risada. Com sete meses lá, já me virava. Na escola, não jogava só, não estudava só. Por exemplo, éramos nós, os alunos, que lavávamos os banheiros do colégio em esquema de revezamento. Ali, quando chegava a minha vez, eu dava uma escapada com a malandragem brasileira. Quando não tinha jeito para isso, jogava uma água lá, mas não esfregava, não...»
5. Fulgor que espalhou nos torneios escolares pelo Chiba Kokusai levou a que, aos 20 anos, o Kashima Antlers (onde Zico jogara) o desafiasse para lá. Logo ganhou a Taça do Imperador. O seu treinador era Toninho Cerezo - que dele disse: «Criativo, alia a técnica à rapidez. Não fica preso a marcações, gosta de ter bola, com ela nos pés nos pés procura sempre tabela e infiltração, das duas deambulações ela esquerda resultam golos, muitos golos».
6. Não, já ninguém o tratava por Baixinho, tratavam-no por Neymar Japonês (e não só pelas tatuagens) - e, no ano seguinte, foi o craque que arrastou o Kashima Antlers à vitória na J-League. A Champions da Ásia perdeu-a para o Jeonbuk Motors (e a mágoa maior foi não poder fazer o que imaginara: foto ao lado de Cristiano Ronaldo e de Marcelo quando com eles jogasse o Mundial de Clubes).
7. Desafiado a tornar-se japonês, ficou de pensar. Em 2016, o Al Ain deu três milhões de euros pelo seu passe. Casado com uma japonesa, a hipótese de jogar pela selecção do Japão perdeu-se pelos Emirados Árabes Unidos. Em Abu Dhabi virou, um fogacho, ídolo do clube - o fascínio que causou num ápice o arrastou a grande reportagem vestido de sheik (e, deliciado e brincalhão, ele revelou-o: «Sheik sim, mas diferente - pois vim para cá com a minha esposa e a minha vida não tem essa história de harém, não...»
8. A história repetiu-se: pelo Al Ain (onde se cruzou com Rúben Ribeiro) também ganhou o campeonato e taça - e em 2018 jogou, finalmente, o Mundial de Clubes (só que, apanhando o Real Madrid em Abu Dhabi já lá não tinha o Cristiano Ronaldo). Aliás, não jogou apenas o Mundial de Clubes, resplandeceu nele: golo seu arrastou à eliminação do River Plate (e o túnel que fez a Enzo Pérez correu mundo no frenesim do Youtube). A final perdeu-a para o Real - ele saiu de lá com a Bola de Prata (a de Ouro coube a Gareth Bale). E foi nessa altura que se começou a falar de si para o FC Porto (achando-se que pudesse repetir em novo encanto a história de Hulk).
9. Para Portugal veio mas não foi para o FC Porto - foi para o Benfica (a custo zero, com salário de 1,2 milhões de euros ao ano e prémio de assinatura que se insinuou ter andado próximo dos 3 milhões). Ao chegar à Luz, na quinta-feira largou o aviso, num clamor: «Venho para ser campeão! Sou um jogador com muita velocidade. Tento marcar golos e ajudar nas assistências. Vontade e garra não vão me faltar, podem ter a certeza»."

António Simões, in A Bola

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