"O campeonato português tem-se revelado perfeito para avançados que, sem historial goleador, se tornam especialistas indiscutíveis; também acontece o contrário, jogadores que chegam com o suporte de uma carreira feita de números eloquentes e perdem o hábito – Ferreyra é apenas o exemplo mais à mão. Seferovic constitui, ele próprio, uma contradição: avançado possante, de entrega total, com argumentos interessantes, mas que revela incompatibilidade surpreendente com o último toque. Começou bem a época passada, fez alguns golos mas acabou preterido por Rui Vitória no momento em que optou por jogar em 4x3x3 – o suíço foi vítima da entrada de Krovinovic e nunca mais recuperou a aura.
Seferovic encarna a diferença entre técnica (que revela nos gestos mais importantes, como recepção e passe) e habilidade (que não tem). De costas para a baliza, mesmo quando está pressionado, revela talento suficiente para dar seguimento automático às acções; utiliza bem o corpo, esconde a bola dos adversários, é forte pelo ar e eficaz no jogo combinado. Não é um predestinado mas está longe de ser um tosco e é muito útil quando se desmarca em grande velocidade e abre linhas de passe. O problema é não acrescentar a essa utilidade evidente um número de golos significativo.
Jogador de perfil lutador, com vastíssimo raio de acção e enorme amplitude de movimentos, Seferovic é perfeito para um estilo de jogo mais directo, embora também mais impreciso e menos eficaz. É complicado pedir-lhe que participe nos diálogos que antecedem o último toque ou que alimente lengalengas muitas vezes sem sentido e que só o diminuem nas qualidades mais expressivas. Se o toque está para o futebol como a palavra para a sociedade, o suíço é um jogador austero, silencioso, inexpressivo, em suma, de poucas conversas. Quando chegou a Portugal deu sinais de que poderia fazer upgrade às qualidades consolidadas ao longo da carreira, mas a torneira fechou e as dúvidas foram mais fortes do que a esperança. Agora, tudo mudou: como quarto avançado do plantel (atrás de Ferreyra, Castillo e Jonas) conquistou a titularidade e marcou o golo que decidiu o clássico. Um golo que valeu por dez.
Sendo ponta-de-lança, Seferovic não tem a contabilidade em dia; é desprendido com a estatística e pensa mais no todo do que no bem-estar pessoal; não corre quilómetros e entrega-se a lutas acesas com os defesas para tirar partido individual desse esforço, antes encara essa entrega como arma colectiva. É uma opção que o desgasta e que, a partir de certa altura dos jogos, o enfraquece nos despiques em zona de finalização, onde é conveniente chegar fresco, lúcido e sereno para tomar as decisões mais contundentes.
Seferovic tem e terá sempre melhor relação com o jogo do que propriamente com o golo e é muito mais relevante para a equipa do que temido pelos adversários. Mas é avançado e, no limite da apreciação exterior, é medido pela pontaria ou falta dela – um médio pode ser admirado pela subjectividade dos requintes técnicos, um atacante é medido pelos golos que marca. A generosa entrega e o espírito solidário são qualidades que perdem significado ao fim de longos jejuns sem marcar. O golo torna-se prova de vida para conquistar a tranquilidade e o reconhecimento universal; sem ele, os parâmetros de avaliação por ser o primeiro defesa da equipa e a noção de equilíbrio perdem relevância. Por isso o tiro que derrotou o FC Porto foi muito mais do que um momento: foi o golo mais importante da carreira; um instrumento precioso para consolidar o estatuto abalado na preparação da época; o argumento final para o tornar herói definitivo no reino da águia, mesmo que a distinção belisque o seu perfil discreto e as suas profundas convicções de que o futebol é um desporto colectivo.
Nakajima com
aura de fenómeno
O Portimonense teve uma vantagem indiscutível no jogo com o Sporting
Nakajima confirmou a aura de fenómeno O japonês escolheu bem o dia para explodir e mostrar-se na plenitude de um talento grandioso: fê-lo perante uma potência, num jogo altamente mediático. Com a bola dominada, em velocidade, no ataque ao espaço, tomando decisões sempre com sentido prático, poucos em Portugal o suplantam. Caso ainda não tenham percebido, é um craque.
Militão adaptado
ao jogo europeu
O FC Porto teve capacidade de resposta notável à saída de Iván Marcano
Éder Militão chegou e, pouco depois, foi colocado perante exigente teste, na Luz, perante o Benfica. Aos 20 anos, não deixou créditos por mãos alheias e assinou exibição que sustentou a ideia de que estamos perante um dos melhores jogadores do Brasil da actualidade, candidato seguro a patrão da canarinha para a próxima época. Chegar à Europa e adaptar-se com tanta facilidade tem muito que se lhe diga.
Nani não evitou
apagão leonino
Nas equipas em estado de desgraça, todos parecem pior do que são realmente
O Sporting foi manta de retalhos em Portimão. Os melhores jogadores, que têm sido decisivos em várias situações durante a época, foram arrastados pela desinspiração colectiva e não deram a volta ao texto. Tudo o que podia correr mal, correu – incluindo a lesão de Salin. Nani ainda trouxe uma corrente de ar fresco, depois do intervalo, mas não conseguiu contagiar os outros. O apagão foi grave a esse ponto."
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