"Gosto muito da Taça de Portugal, quando é jogada mano-a-mano, os grandes contra os pequenos, com os futebolistas dos pequenos a terem a humildade que, por vezes, os fazem, durante 90 minutos, serem gigantes; e os futebolistas dos gigantes, por vezes, durante 90 minutos, a sofrerem de um nanismo pouco compatível com o estatuto, o ordenado e os privilégios com que se pavoneiam.
Como adepto ferrenho do Benfica (o maior dos Gigantes), espero sempre que os nossos futebolistas saibam que só serão gigantes se souberem, sempre, partir para o jogo com a humildade de um David.
Recordo o primeiro jogo que vi, ao vivo, para a Taça de Portugal: foi em Castelo Branco, no “mítico” pelado do Vale do Romeiro, no dia 04 de Janeiro de 1981. O Benfica de Castelo Branco recebia o Benfica. Lajos Baroti apresentou praticamente todos os titulares (trocou o Bento pelo Botelho) e lá se apresentaram gigantes como Chalana, Humberto, Alhinho, Bastos Lopes, Carlos Manuel, João Alves, Néné, Shéu… Enfim, uma constelação que teve como oponente um Benfica de Castelo Branco que tinha em Balacó (que faria carreira na primeira divisão, no Espinho e no Portimonense) a grande figura.
O Benfica ganhou, naturalmente, com três golos (um de Reinaldo, um de Carlos Manuel e outro do inevitável Néné). Eu, do alto dos meus dez anos, saí do campo maravilhado por ter visto, ao vivo, os meus heróis, naquele simples e honrado pelado. O meu único lamento era não ter visto em campo o maior dos meus ídolos, o Bento.
Não entendia o chorrilho de críticas com que os mais velhos se despediam de uma equipa que acabara de ganhar 3-0. Diziam esses mais velhos que ao Benfica se exigia muito mais do que um mero jogo para entreter; outros acusavam os jogadores de terem lá ido brincar… e eu, puto em aprendizagem, apenas me queixava de não ter visto o Bento. Aprendi, nesse dia, a lição de que os profissionais do Benfica não se podiam satisfazer com essa coisa parca e diminutiva de “fazer os mínimos contra adversários que dão o máximo”. Nesse dia, Baroti não se vangloriou de nada, não se gabou de nada e certamente percebeu que, apesar da vitória, se exigia muito mais do que o que a sua equipa mostrara.
Há lições que nunca se esquecem."
Pedro F. Ferreira, in O Benfica
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