"Há algo de intrigante naqueles atletas que parecem desafiar o tempo. Não apenas porque continuam fisicamente capazes, mas porque mantêm uma presença competitiva que ultrapassa a lógica comum. A idade, no desporto, é muitas vezes vista como uma sentença de declínio, mas a verdade é que alguns atletas resistem ao envelhecimento competitivo com uma consistência que nos obriga a olhar para além da fisiologia e entrar no objeto mais fascinante da psicologia, a mente humana.
A longevidade não é um acaso, é uma construção psicológica sustentada por duas forças internas que raramente analisamos com a profundidade que merecem: a resiliência mental e a disciplina. Quando estas duas se cruzam, criam uma combinação poderosa que permite prolongar carreiras, reinventar fases competitivas e manter níveis de excelência que desafiam expectativas. Esta tríade revela-se essencial porque, num contexto de exigência extrema, não chega ter talento ou cuidar do corpo, é preciso saber cuidar da mente com a mesma seriedade e rigor.
A resiliência mental é, talvez, o elemento mais visível nesta equação, mas paradoxalmente o mais incompreendido. Costuma ser romantizada como uma espécie de superpoder emocional, mas na verdade é uma competência treinada que nasce do contacto repetido com a adversidade: lesões, derrotas, críticas públicas, períodos de perda de rendimento e até a solidão emocional. A resiliência mental não se mede pela capacidade de aguentar, mas pela capacidade de adaptar, reinterpretar e transformar o que acontece. Não é teimosia nem resistência cega à dor, é flexibilidade cognitiva, é regulação emocional, é a capacidade de manter o foco quando tudo parece desfocar.
Vamos, então, olhar o segundo elemento desta tríade, a disciplina, como o braço operacional da resiliência. É a disciplina que faz um atleta levantar-se cedo para treinar quando ninguém está a ver, que regula o descanso, a alimentação, o comportamento, os limites e a capacidade de executar rotinas quando o corpo pede descanso e a mente pede fuga. No desporto de alta competição, a disciplina protege da erosão psicológica. É ela que estrutura a mente quando as emoções oscilam e que impede que momentos de fragilidade se tornem verdadeiras crises. A disciplina alicerçada na resiliência emocional não é rígida, é inteligente. É a capacidade de manter constância nos comportamentos essenciais, mesmo quando a motivação falha, mesmo quando o contexto externo desafia, mesmo quando os resultados não aparecem.
A longevidade nasce, então, desta combinação subtil entre capacidade de resistir ao que dói e capacidade de repetir o que importa. A longevidade psicológica implica continuar a encontrar propósito no treino diário, na competição e no desgaste natural do percurso. É querer continuar, não apenas conseguir continuar.
A neurociência demonstra que a resiliência está ancorada em redes cerebrais associadas à aprendizagem emocional, ao controlo inibitório e ao processamento de erros. Atletas resilientes não evitam falhar, aprendem a falhar melhor. A disciplina atua nos sistemas de recompensa e motivação, reforçando comportamentos consistentes. A longevidade é um produto desta economia interna: quando a mente está protegida, regulada e motivada, o corpo acompanha. No fundo, a longevidade é menos sobre correr contra o tempo e mais sobre correr com ele, aproveitando o que a experiência, o erro e a maturidade trazem ao atleta.
O corpo envelhece, mas o cérebro é extraordinariamente plástico e responde à forma como escolhemos viver a experiência competitiva. Quando a mente se mantém ativa, disciplinada e emocionalmente regulada, influencia diretamente mecanismos biológicos que retardam o desgaste físico. A gestão eficaz do stress reduz a produção crónica de cortisol, hormona que acelera processos inflamatórios e o envelhecimento celular. A motivação sustentada promove rotinas de treino consistentes, que estimulam a renovação muscular e a eficiência cardiovascular. A capacidade de encontrar propósito preserva circuitos neurais associados ao bem-estar, que por sua vez modulam sistemas hormonais e imunitários chave na manutenção da vitalidade. A mente não impede o tempo, mas cria condições metabólicas mais favoráveis. Esta não é uma tríade mágica, é uma tríade significativa e é cientificamente validada."

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