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terça-feira, 30 de outubro de 2018

Dos segredos do City aos revolucionários do futebol brasileiro

"Do azul do céu de Manchester, ao negro chumbo que tinge os dias no Brasil. Da novidade trazida pela Amazon sobre os segredos do futebol moderno a duas abordagens históricas sobre dois exemplos de activismo no futebol.
Começamos por All or Nothing, série documental produzida pela Amazon, que nos revela os segredos da superequipa do Manchester City.
E deste sucesso mundial, lançado há um par de meses, seguimos para baixo do equador para, através da música e da literatura recordar Afonsinho e Sócrates.
Estes dois rebeldes dentro de campo têm muito em comum, do perfil revolucionário à carreira na medicina. Por estes dias, o exemplo de ambos, de resistência em campo à ditadura militar, serve de contraponto para a actualidade, dominada nos últimos dias pela eleição de um inimigo da democracia para a presidência do Brasil.
Vale a pena ver, ouvir e ler.
Ver: «All Or Nothing Manchester City»
Género: série de documentário
Produção: Amazon
Realizador: Manuel Huerga
País: Reino Unido
Duração: 50 minutos (x8 episódios)

Bernardo Silva pede o FC Porto no sorteio da Liga dos Campeões: a primeira cena de All or Nothing (Tudo ou nada) parece destinada a captar a atenção do público português.
O documentário de oito episódios produzido pela Amazon abre-nos as portas do Ethiad Campus, do estádio ao magnífico centro de treinos, e permite-nos espreitar os segredos da milionária equipa do Manchester City e acompanhar os sucessos e as desilusões da temporada 2017/18, ao longo de nove meses.
Das palestras de Pep Guardiola às entrevistas exclusivas com os protagonistas, dos treinos até aos bastidores dos jogos: tudo pode ser visto desde o sofá de nossa casa… e com a narração de Sir Ben Kingsley.

Descobrimos desde os métodos mais inovadores para a recuperação de lesões à forma como o plantel tenta ultrapassar uma traumatizante eliminação num jogo de paintball ou até como o tema Wonderwall, do ilustre fã dos citizens Noel Gallagher, se torna praticamente num hino da equipa.
O documentário (que pode ver aqui), estreado a 17 de Agosto e disponível em mais de 200 países, conquistou a crítica com o modelo behind the scenes que a Amazon privilegiou nas séries All or Nothing também com os gigantes do futebol americano Dallas Cowboys ou os All Blacks, selecção de râguebi da Nova Zelândia – também estreadas este ano.

Pelo acesso quase livre aos segredos do City a gigante norte-americana terá pago mais de 11 milhões de euros ao City, num acordo bilateral que agastou a Sky Sports detentora dos direitos de transmissão da Premier League.

Ouvir: «Meio de Campo»
Autor: Gilberto Gil
Intérpretes: Gilberto Gil / Elis Regina
Género: MPB
País: Brasil
Duração: 4:44 minutos

Médico, futebolista, revolucionário. Podia ser Sócrates, mas é Afonso Celso Reis. Aliás, Afonsinho. O «Prezado Amigo» imortalizado nos versos de Gilberto Gil em «Meio de Campo», tema de abertura do álbum a cidade do Salvador editado em 1973.

Versão ao vivo – por Gilberto Gil
A canção, que por estes dias de convulsão no Brasil merece ser recuperada, é uma homenagem ao médio do Botafogo que, em plena ditadura militar brasileira, lutou contra o poder absoluto das direcções dos clubes, tornando-se no primeiro jogador a ser dono do seu passe.
Se tinha barba e era cabeludo como um revolucionário, Afonsinho havia de encarnar esse papel no futebol brasileiro, ao tornar-se, em 1971, numa espécie de Bosman antes do tempo – a Lei Pelé, que viria a regulamentar a situação no Brasil, só surgiria 27 anos depois.

Versão em estúdio – Elis Regina
A história de Afonsinho, que além de futebolista era estudante de medicina e ativista político com simpatias comunistas, viria a servir de argumento para o documentário «Passe Livre», de 1974. Tal como para a canção de Gilberto Gil, mais tarde interpretada também pela inconfundível voz de Elis Regina.
«Prezado amigo Afonsinho
Eu continuo aqui mesmo
Aperfeiçoando o imperfeito
Dando um tempo, dando um jeito
Desprezando a perfeição
Que a perfeição é uma meta
Defendida pelo goleiro
Que joga na Selecção
E eu não sou Pelé nem nada
Se muito for, eu sou um Tostão
Fazer um gol nessa partida não é fácil, meu irmão…»
Ler: «Doctor Sócrates»
Autor: Andrew Dowie
Editora: Simon & Schuster
Género: Biografia
País: Reino Unido
Páginas: 400

De um rebelde do futebol brasileiro para outro. Se Afonsinho ganhou a batalha por ser dono do seu passe, nos anos 70, Sócrates tornou-se, na década seguinte, num símbolo social da oposição democrática brasileira ao regime militar.
Ídolo do Corinthians, referência da selecção brasileira de 1982, o «Magrão», que também viria a enveredar pela medicina depois de pendurar as chuteiras, tornou-se no ideal do futebolista-activista e o rosto mais mediático da «Democracia Corinthiana», movimento que fazia depender do voto de cada elemento (do director ao roupeiro) cada decisão no mais popular clube paulista.
A biografia de Andrew Dowie, britânico radicado no Brasil, que foi lançada em Março de 2017 e reeditada já este ano, retrata com detalhe a dimensão histórica do «Doutor», que faleceu em 2011, mas também o lado boémio e pessoal.
A obra de 400 páginas escrita em inglês não foi editada em Portugal, mas pode ser adquirida online por um preço entre os 10 e os 20 euros – conforme seja versão em capa mole ou capa dura.
«Os jogadores actuais são o contrário de Sócrates: ganham muito mais e importam-se muito menos com o sítio de onde vieram», constatou o autor, no que não deixa de ser um convite irresistível para ler a obra.
Sócrates, por sua vez, descrevia-se de forma simples: «Eu bebo, eu fumo, eu penso.»"

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