"Um empate tristonho frente a uma Islândia que já havia ameaçado pelo mesmo sítio e pelo mesmo jogador (Bjarnason) deixa a Selecção Nacional embaraçada. Renato Sanches entrou aos 70 minutos e foi a primeira aposta de Fernando Santos.
Saint-Étienne - Se alguém contava com uma vitória fácil de Portugal neste seu terceiro confronto contra a Islândia, equivalente ao que acontecera nos dois anteriores, apesar de ter sempre sofrido golos, não tardou a desenganar-se. Apostando numa união muito grande e num conjunto remetido por inteiro ao seu meio-campo na fase defensiva, Lars Lagerback, o experiente seleccionador sueco desta equipa que veio da ilha lá dos mares do norte, coube conter muita da criatividade dos portugueses que, com três homens (João Mário, Moutinho e André Gomes) na frente de Danilo, dava a corda toda ao duo de avançados composto por Cristiano Ronaldo e Nani.
Curiosamente, seria sobretudo em lances aéreos que Portugal criou complicações iniciais ao seu adversário pese embora o golo descongelador de Nani tenha surgido num movimento todo ele à superfície da relva e muito bem aproveitado pela excelente desmarcação de André Gomes.
Portugal entrou em campo conhecedor da vitória da Hungria sobre a Áustria no imperial confronto de Bordéus e consciente de que um triunfo sobre a Islândia iria esclarecer, desde já, muito as contas do apuramento. O entusiasmo lusitano foi bem expresso por Cristiano Ronaldo que entrou para o aquecimento em velocidade supersónica para se dirigir aos adeptos aplaudindo-os e incitando-os ao apoio. É preciso dizer que eles também não precisaram de muito incitamento já que se mostraram barulhentos como nunca. O estádio Geoffroy Guichard estava dividido a meio uma metade vermelha e outra azul (talvez a metade vermelha fosse um pouquinho maior). Os islandeses, que durante a tarde invadiram a cidade, espalhando-se pelas praças de Jean Jaurés e do Hotel de Ville, gritando a plenos pulmões «Áfram Island!» (Força Islândia!), não mostraram rouquidão de garganta o que fez que houvesse um equilíbrio notório no «Noisimeter», uma invenção diabólica que podemos rebaptizar de «Barulhómetro» e que servia para medir os decibéis debitados por cada uma das claques. Enfim, coisas de quem teima em não deixar que o Futebol seja algo de espontâneo e natural como devia sempre ser.
Deixemos o barulho. Passemos ao jogo que é, na verdade, o que provoca barulho.
Ninguém pode dizer que os avisos não foram dados. Foram e muito cedo, precisamente por Bjarnason que caiu nem ginjas no espaço que lhe era dado no lado direito da defesa lusitana. Não se impressionaram os nossos compatriotas, viriam a pagá-lo caro.
Renato Sanches - primeira aposta!
Portugal demorou a soltar-se. Lentidão excessiva nos lances ao centro do terreno só compensada pela movimentação contínua de João Mário e André Gomes, em trocas de flancos e em desmarcações para as costas dos laterais islandeses, com Ronaldo a descair também com naturalidade para as pontas, deixando Nani no centro da defesa contrária (o inverso também foi acontecendo), estiveram na base do desfazer de um bloco muito denso e na explicação do golo de Nani que parecia atirar Portugal para os braços abertos dos oitavos-de-final.
Com a vantagem garantida ao fim de meia-hora, penso que ninguém pôs em dúvida o sucesso lusitano. Até porque defensivamente, a Selecção Nacional mostrou-se sempre muito coesa perante alguns atrevimentos adversários, sobretudo saídos dos pés de Bjarnason, esse mesmo que criou a primeira grande chance do encontro, obrigando Rui Patrício a duas defesas consecutivas, claudicando nesse pecado do lado direito. Erro grave de cálculo.
Era preciso mostrar em campo a superioridade escrita em papel azul e que tanto tem sido apregoada por uma equipa que veio para este Campeonato da Europa com declaradas e largas ambições. E se isso parecia ir acontecer, os primeiros minutos do segundo tempo lançaram dúvidas na cabeça de toda a gente. O golo de Bjarnason foi demasiado consentido e o jogo como que recomeçava.
Respondeu bem a Selecção e tornaram-se menos irritantemente defensivos os islandeses. Os movimentos ganharam interesse e o entusiasmo azul recrudesceu. Eis que finalmente se torna difícil tirar os olhos do relvado.
O tempo ia passando, depressa para os portugueses e lentamente para os rapazes da Islândia. Duas concepções diametralmente opostas de tempo, como diria Mário Filho, o homem que deu nome ao Maracanã.
Sublinhe-se que também os nórdicos passaram a movimentar-se no meio do terreno português. Não frequentemente, é verdade, mas aqui e ali em contra-ataques de veneno.
A dúvida pairava sobre o Estádio Geoffroy Guichard... Seria possível contrariar a força dos ilhéus? A pressão aumentava. A pressão do ataque nacional e a pressão de um resultado com muito de desanimador. Havia que mudar algo na teimosia de lances repetitivos e na insistência individual de Ronaldo.
A primeira aposta de Fernando Santos foi Renato Sanches a vinte minutos do final. Tempo suficiente para se cavar uma vitória e tirar do congelador aquilo em que o jogo se tornara. Mas à medida que o tempo passava, os nervos iam tomando conta dos portugueses. Excesso de quezílias só beneficiava os homens do Norte da Europa para os quais o resultado parecia agradar. Além de que, fisicamente se impunham - até o avançado-centro Sigthórsson dava água pela barba aos centrais portugueses, obrigando-os a uma atenção continua para que não servisse de cabeça os homens que o acompanhavam de quando em vez.
Entrou Quaresma, o ficou-se à espera de um truque do chapéu. Os minutos escoavam-se pela abertura da ampulheta como grãos de areia por entre os dedos. A alegre vitória que se esperava morria de encontro ao voluma gigante de um colosso branco e inamovível.
Portugal: Rui Patrício; Vieirinha, Pepe, R. Carvalho, R. Guerreiro; Danilo, João Mário (Quaresma, 76'), J. Moutinho (R. Sanches, 71'), André Gomes (Éder, 84'); Nani, Ronaldo"
Afonso de Melo, in O Benfica
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