"Roger Schmidt vai com 9 triunfos consecutivos em jogos oficiais desde que lidera o Benfica. Com este arranque, já ultrapassou vários treinadores históricos, tendo apenas à sua frente Sven Göran Eriksson que iniciou em 1982 a gloriosa passagem pelo clube da Luz, com um incrível percurso de 15 vitórias seguidas (até um surpreendente empate com o Alcobaça, no que seria apenas um acidente de percurso, já que o Benfica foi um brilhante campeão). O alemão trabalhou uma forma de jogar, um onze base e os elogios sucedem-se à forma pressionante como a equipa defende, à boa circulação de bola e à ligação entre os vários sectores.
E no entanto começam a surgir sinais de preocupação, e mais vale refletir sobre eles no ciclo de vitórias e não depois. Em três das cinco jornadas iniciais, o Benfica teve dificuldades em vencer. Se contra o Paços o problema terá estado na finalização, já com o Casa Pia e Vizela identificaram-se problemas diferentes. Roger Schmidt, que veio de um futebol aberto e até algo ingénuo como o holandês, está a bater de frente com o Tugão. O Tugão é nada mais nada menos que o futebol português que todos nós conhecemos, um jogo de manhas e chico-espertices, desde os dirigentes até aos jogadores, passando pelos árbitros. As equipas e treinadores que compõem o Tugão aprenderam ao longo de décadas a nivelar desta maneira uma luta que à partida (e à chegada) é totalmente desigual. Uma "evolução da espécie" que Charles Darwin também gostaria de dissecar, em que a presa percebeu a melhor forma de se proteger do predador, mesmo que esse mecanismo seja feio para quem o vê. No Tugão assistimos de forma recorrente a equipas a povoar o centro da defesa, muitas vezes com três centrais e ainda mais médios defensivos a recuar para perto dessa posição, a que se somam dois laterais que raramente atacam, sobrando dois extremos e um avançado velozes, para tentar explorar contra-ataques e transições rápidas, na procura de um golo nas duas ou três vezes que se acercam da área adversária. Pouca ideia ofensiva há ali, para além da tal velocidade e do aproveitar ao máximo todas as bolas paradas.
Mas o mais feio disto tudo é mesmo as perdas de tempo. Muitos Benfiquistas criticaram Sérgio Conceição (um tipo com imenso mau perder, que vai beneficiando da raridade desse momento e de uma imprensa que embrulha a sua má educação com um "ser genuíno e frontal") sobre as suas declarações após a derrota com o Rio Ave, mas a verdade é que o tempo de jogo útil no Tugão é miserável. Basta comparar com as outras ligas. Se defender em bloco baixo é um direito que assiste a equipas que jogam contra conjuntos com orçamentos 10 e 20 vezes superior, já é uma vergonha inaceitável que jogadores finjam lesões, se atirem para o chão em todas as oportunidades, tentem sacar faltas e penaltys com simulações e aproveitem todos os lançamentos, pontapés de baliza e bolas paradas para perder mais 5, 10, 15 segundos do que o que deviam. E infelizmente, os árbitros portugueses continuam a aceitar este jogo manhoso, assinalando faltas a todo o momento e não punindo com os minutos de desconto que efetivamente deviam. Estas equipas terão muita razão sobre o tecido estrutural do futebol português, dos três grandes que secam tudo à sua volta, mas não é assim que conquistarão adeptos nem farão evoluir o desporto nacional.
Da parte do Benfica é seguir com toda esta alma e qualidade, mas avaliando se não estará também na altura de rodar jogadores, pois sente-se já um cansaço acumulado. Veja-se como Enzo Fernandez e David Neres, por exemplo, baixaram a alta bitola com que iniciaram a época. São craques, mas não são máquinas. Gerindo isso, o Benfica tem tudo para seguir vitorioso. Nota-se um bom espírito de grupo no relvado e os adeptos fazem o resto. Lotações a rondar os 55.000 na Luz e um mar vermelho nos jogos fora empurram e muito esta equipa. E será que contra o Vizela já houve a chamada "estrelinha de..."? Nem termino a frase, o futuro o dirá.
Uma nota final para o fecho do mercado. Terá sido dos verões mais competentes que há memória na Luz. Conseguiu-se aliviar a folha salarial com a saída de Verthongen, Weigl, Meité e Taarabt, fez-se uma venda milionária com Darwin e reinvestiu-se o dinheiro com lógica num foco desportivo. Repare-se a contratação surpresa e estrondosa de Draxler, um campeão do mundo com a Alemanha: nunca em momento algum a anterior direção do Benfica faria uma operação destas, que poderá ter uma enorme valia desportiva, mas nenhuma valia financeira. Vieira nunca aprovaria isto, pois pensava sempre mais no segundo factor, que no primeiro. Mas este ano o Benfica não olhou apenas para o catálogo de Jorge Mendes, não olhou a negócios de ocasião, não procurou jogadores jovens para valorizar e vender, independentemente se o plantel estava necessitado deles ou não. Pelo contrário, houve critério e planeamento para um plantel equilibrado e adequado à ideia de jogo do treinador.
O Benfica 2022/23 segue forte, unido, vitorioso e com imensa crença dentro e fora do relvado. É fundamental ninguém entrar em euforias, pois o percurso é longo e está mais que visto extremamente espinhoso, se calhar bem mais do que Roger Schmidt imaginaria, por mais Enzos, Neres e Draxlers que se tragam. Mas caro Roger, é isto o Tugão..."
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