"A fase de qualificação para o Euro'2020 não começou bem para a Selecção Nacional, que somou dois empates em outros tantos jogos, ambos realizados no Estádio da Luz. Portugal continua com as suas possibilidades intactas e o mais provável ainda é marcar presença na fase final da competição. Considerando apenas os resultados e probabilidades, eu diria que não há motivo para alarme. Mas se fizermos uma análise mais profunda e olharmos para o jogo, o jogo em si, o rendimento da equipa, julgo que é hora de o nosso seleccionador Fernando Santos reflectir...
Sejamos claros: Portugal joga pouco. Tem vezes que não joga nada! E isto é ainda mais preocupante se nos lembramos dos jogadores que temos hoje em dia. Uma das coisas mais absurdas no Futebol é o desperdício de talento a que se assiste um pouco por todo o lado em nome de constrangimentos táctico-estratégicos. Desgraçadamente Fernando Santos é mestre nisso. Com uma ideia de jogo pouco arrojada, quase sempre em função do adversário, sem uma identidade vincada, a estratégia - variável de jogo para jogo - sobrepõe-se claramente a um modelo trabalhado, a uma matriz concreta e homogénea ao longo do tempo, onde as dinâmicas e comportamentos colectivos revelam intenções gerais análogas, sejam quais forem os adversários.
É verdade que o rácio de vitórias por jogos disputados é muito elevado com o Engenheiro ao leme da nau lusitana. No entanto, em fases de qualificação, Portugal encontrou quase sempre adversários muito, mas muito inferiores. Mais faltava que não conseguisse assumir o jogo, ser dominador, criar muitas oportunidades e ganhar na esmagadora maioria das ocasiões. O que se verifica, por oposição, é que sempre que o grau de exigência sobe, os problemas aumentam exponencialmente, e há uma dificuldade reiterada em apresentar um futebol condizente com a qualidade individual existente, ainda que se ganhe algumas vezes. Nas fases finais, na realidade, aquele rácio não é grande pistola...
É aqui que muitos dirão: "Mas então Portugal não foi campeão europeu em 2016?" Foi! Para todos os efeitos, Fernando Santos foi o treinador que deu ao futebol português a maior conquista da sua História. Esse crédito, esse mérito, esse orgulho pessoal nunca ninguém lhe vai subtrair. Mas o que jogámos? Praticámos um futebol que conquistou a admiração dos apaixonados pelo jogo e não apenas pela bandeira? Ou fomos apenas a personificação da Grécia sensaborona e enfadonha que criticámos em 2004?
Nesse Euro em França, como todos nos lembramos, triunfámos sem jogar grande coisa, mas beneficiámos de um caminho bastante acessível até à final e tivemos sempre a "estrelinha" do nosso lado. De todos os jogos, só com o País de Gales é que assumimos o jogo e fomos superiores. Nos restantes, depois de três empates na fase de grupos contra selecções acessíveis (Islândia, Áustria e Hungria) e de termos passado como um dos melhores terceiros classificados, tivemos a felicidade sempre do nosso lado. Contra a Croácia, caiu para nós no fim do prolongamento, como podia perfeitamente ter caído para os croatas. Diante da Polónia, foram as grandes penalidades a decidir. E na final com a França, Éder fez o remate de uma vida, no prolongamento, após um jogo onde a França foi sempre superior.
Há umas mentes brilhantes que atribuem o triunfo de 2016 ao "pragmatismo" com que a selecção portuguesa se exibiu. Defender muito e com muitos, ser ofensivamente pobre, pensar pequenino, ser uma equipa curta e conservadora, é visto como uma fórmula de sucesso. Pois se quando fomos "pragmáticos", fomos campeões, e quando jogámos bem, fomos eliminados, então só temos de continuar a jogar feio mas a ganhar!! Que raciocínio brilhante! A eliminação do Mundial'2018 nos 'oitavos' perante o Uruguai, após um torneio sofrível, em que se tentou replicar a mesma fórmula do Euro, foi um tremendo abanão, um abre-olhos que rasgou ao meio tal argumentação.
Ao longo da história, quantas vezes jogámos bom futebol e estivemos perto do sonho de um título e só não o conseguimos porque nos deparámos com adversários de maior qualidade que País de Gales, Croácia ou Polónia? Mundial'1966, Euro'1984, Euro'2000, Euro'2004, Mundial'2006... E quantas vezes não jogámos nada e pelo caminho ficámos? Todas as vezes que nem a fase final alcançámos, Mundial'2002, Euro'2008, Mundial'2014... Muitas vezes jogámos feio e fomos eliminados. Muitas vezes jogámos bem e estivemos tão perto, e só não chegamos lá porque apareceu a França de Zidane, ou a Espanha de Xavi e Iniesta, ou a Grécia da "estrelinha". Achar que o "pragmatismo" é alguma fórmula de sucesso, só porque foi assim que nos exibimos quando os astros se alinharam todos a nosso favor, é facilmente rebatível com o passado, é estar a ver o filme todo ao contrário, é uma completa falácia!
A melhor fórmula para ganhar há-de ser sempre a qualidade de um modelo em todos os momentos do jogo. É conseguir controlar o mais possível tudo o que acontece no jogo e não esperar que o acaso possa ditar a sua lei. É ser pró-activo, ir à procura, ser dominador e influente no jogo, ao invés de ser passivo, esperando que as nossas vedetas estejam sempre inspiradas, que Cristiano Ronaldo resolva ou que um Éder qualquer apareça nos jogos todos, rezando, ao mesmo tempo, para que o adversário acerte sempre no poste. É promover um jogo ligado e conexo, maioritariamente em posse, assente na qualidade técnica, inteligência e criatividade natural dos jogadores portugueses.
Portugal foi campeão da Europa em 2016, com mérito, mas porque calhou, a imprevisibilidade do futebol assim permitiu, não porque adoptou um estilo "pragmático". É bom que se perceba isso, para que no futuro se volte a mudar o chip, se potencie novamente toda a qualidade individual que temos e se torne a estar mais próximo de ganhar um grande torneio, como em 1966, 2000, 2004 ou 2006.
Rui Patrício, Nélson Semedo, João Cancelo, Ricardo Pereira, Diogo Dalot, Raphael Guerreiro, Mário Rui, Rúben Dias, Pepe, Ferro, Diogo Leite, Rúben Neves, Danilo, William Carvalho, João Moutinho, Gedson, João Mário, Bruno Fernandes, Pizzi, Bernardo Silva, Gelson Martins, Rafa, Bruma, Gonçalo Guedes, Diogo Jota, Cristiano Ronaldo, João Félix, André Silva, Gonçalo Paciência, etc, etc, etc... Quantas selecções no mundo se podem vangloriar de ter um conjunto de jogadores deste calibre? Muito poucas! Isto não pede, não requer, não exige, um futebol de maior qualidade, onde a acção da equipa técnica acrescente valor, levando a que o colectivo seja muito maior que a soma das individualidades? Obviamente que sim! É por isso que esperamos nos próximos jogos, nas próximas competições..."
Sem comentários:
Enviar um comentário
A opinião de um glorioso indefectível é sempre muito bem vinda.
Junte a sua voz à nossa. Pelo Benfica! Sempre!