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segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Os bons sinais no Restelo, em Paços e Moreira e o quase milagre do Boavista

"O nível médio da Liga actual tem sido genericamente fraco, mesmo entre os grandes. O Sporting desmente Jesus na proclamação imprudente de uma versão mais “italiana”, o Porto fez das tripas coração - de um plantel curto extraiu uma equipa competente - mas revela uma falta de criatividade que lhe complica alguns jogos e o Benfica oscila na razão directa do maior ou menor rendimento das suas mais destacadas unidades. Daí para baixo, o quadro também não é muito animador, a começar nos habituais candidatos à Europa: o Braga precisa de melhorar e diversificar o processo ofensivo para ser mais que o campeão dos não-grandes, o Marítimo perdeu rendimento em vez de ganhar e não apresenta futebol atractivo e o Vitória de Guimarães é uma desilusão evidente, apenas pontualmente eficaz e num futebol feito mais de correria que de pensamento. Além dos muitas vezes citados Rio Ave e Chaves, faz sentido destacar um Boavista em que Jorge Simão deixa a marca do melhor rácio da prova entre qualidade disponível e rendimento em campo. Com um dos plantéis mais fracos, a equipa do Bessa mostra-se conhecedora das suas forças e fraquezas e segue segura na tabela agarrada a um futebol com critério, não muito elaborado mas eficaz, raramente sedutor mas sempre corajoso. À organização defensiva de qualidade que já vigorava com Miguel Leal, Simão acrescentou a ambição de jogar mais vezes e mais tempo no meio campo contrário. Estar na primeira metade da tabela só não é um milagre porque no futebol não há milagres. Só de trabalho competente pode resultar o que tem acontecido no Bessa.
E surgem, finalmente, outros bons sinais, de um futebol audacioso que pretende agradar ao espectador e não apenas somar pontos, visíveis no Paços de Ferreira, no Belenenses e mesmo no Moreirense. Quem só vê essas equipas quando defrontam os grandes, pode pensar que pouco ou nada mudou, mas não é verdade: o Paços de João Henriques não precisou de muito tempo para mostrar um novo rosto face ao herdado de Petit, o Belenenses transfigurou-se em duas semanas apenas face aos tempos de Domingos e o Moreirense de Sérgio Vieira é incomparavelmente mais organizado que o do arranque da temporada com Manuel Machado, Mais que questionar os técnicos cessantes, que hão-de decerto ter razões que explicam um rendimento fraco e formas de jogar que não entusiasmavam ninguém, vale a pena olhar para o que os novos técnicos tentam mudar. Não são ainda mais do que sinais, princípios de intenção, mas alguns já são sinais evidentes.
A primeira sensação de mudança está na escolha dos jogadores, no perfil que se procura, particularmente dos médios. No Restelo foi finalmente possível ver ao mesmo tempo (e frente ao Benfica!) André Sousa, Filipe Chaby (joga tão bem!), Diogo Viana e Fredy, numa mensagem clara de que o momento ofensivo conta tanto ou mais que o defensivo, abandonando a sobreposição de Yebda com Bouba Saré ou Tandjigora. No primeiro jogo de João Henriques pelo Paços, a mesma mensagem (e o jogo era fora, nas Aves, frente a um rival directo), que o jogo de iniciativa e posse confirmou. A chegada de Ruben Micael não implicou que Pedrinho saísse da equipa, nem Xavier, o que se repetiu no jogo seguinte, já com Assis na equipa e sempre com o também criativo Andrezinho a ser lançado. Só podia melhorar e acredito que crescerá mais ainda. No Moreirense Tózé deixou de ser apenas o baixinho improvisador sempre deslocado para um flanco. Surgiu no corredor central, com gente de qualidade ofensiva nas alas – Bilel e Arsénio – e sempre com objectivo de jogar com o ponta de lança, Edno, e não apenas de o servir em cruzamentos. Foi assim que conseguiu empatar com o Porto e ganhar em Tondela.
A escolha desse tipo de jogador, que sugere mas também reclama um jogar feito de iniciativa, é o indicador seguro de que uma equipa pretende jogar mais vezes em função das próprias competências que apostando sobretudo em anular o melhor de qualquer rival. Todos os treinadores falam de identidade mas ela só pode ser reconhecida numa equipa que sabe o quer fazer e não apenas impedir que o opositor faça. Numa equipa com limitações – não, não se aplica só às melhores – a intenção de jogar, de correr mais riscos, tem duas vantagens imediatas: a primeira é muito concreta e resulta da importância de repartir a gestão dos ritmos, de não oferecer a bola ao rival com facilidade (se for um grande aproveitará para sufocar essa equipa perto da área); a segunda é menos óbvia mas muitas vezes determinante e traduz-se numa mensagem de confiança aos próprios jogadores, fazendo-os acreditar que podem lutar sempre no campo todo, pensando em ganhar mesmo contra os melhores, num incentivo decerto mais eficaz que o garantido em sessões de coaching ou por um guru motivacional. Passar aos profissionais a mensagem de que não servem pra mais do “feijão com arroz” nunca ajudou ninguém a ser melhor. Nem no futebol nem em qualquer outra actividade que eu conheça.

PS: O pior de Jorge Jesus vem ao de cima sempre que está por cima. Bastou ganhar um troféu, mesmo sem deslumbrar, e vencer um jogo (sofrido) que lhe valeu a liderança e lá voltaram as palavras fanfarronas (“somos uma equipa mais italiana, como a Juventus”) ou insensatas (“Gelson e Dost são mais de 50% do Sporting ofensivamente”). A seguir aconteceu no Estoril o mesmo que o ano passado em Vila do Conde, quando após o bom jogo em Madrid proclamou que “a melhor equipa em Portugal é sempre a que eu treino”. Nem todas as palavras são levadas pelo vento."

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