"As opiniões dividem-se sobre a assinalável assiduidade com que Vítor Pereira, que é o presidente dos árbitros, tem vindo a público esmiuçar as exibições dos seus activos dos apitos e das bandeirolas na corrente temporada.
Francamente, sou a favor desta exposição mediática do presidente dos árbitros porque nada vejo nela de sombrio ou de escondido. Antes pelo contrário, só vejo transparência e linearidade. E, jogando-se o futebol dentro de quatro linhas, o que mais faz falta é, precisamente, a tal linearidade.
Vítor Pereira tem sido muito linear nas suas intervenções e isso é meritório. Foi no princípio desta semana que o presidente dos árbitros voltou a usar da palavra para nos falar sobre questões da arbitragem nacional que, como sabemos é, por excelência, o assunto que mais interessa o maior número de cidadãos nacionais.
Há quem defenda, por exemplo, que André Villas Boas condicionou a arbitragem de João Ferreira no último Beira Mar - FC Porto quando, na conferência de imprensa de lançamento do jogo, se referiu ao árbitro setubalense lamentando os seus «antecedentes infelizes».
E, pela mesma ordem de ideias, logo houve quem concluísse que a grande penalidade que permitiu ao FC Porto vencer em Aveiro teve muito mais a sua origem nas palavras bem amadurecidas do treinador do FC Porto do que na queda de Hulk na grande área do Beira Mar.
São opiniões, há que respeitar.
Vítor Pereira sobre este mesmo assunto ainda não formulou a sua opinião em termos públicos, visto que decidiu só se pronunciar sobre os casos da última jornada do campeonato na sua próxima alocução que ainda não tem data marcada. Está bem visto, sim senhor.
Sobre a decisão de Elmano Santos, outro seu pupilo, em mandar repetir a grande penalidade a favor do Vitória de Setúbal o Estádio do Dragão, Vítor Pereira também não emitiu o seu parecer e, verdade seja dita, dificilmente o faria. Não porque, eventualmente, não entenda o episódio como digno de uma frase ou duas. Mas porque nunca ninguém lhe perguntou o que pensava sobre o assunto.
Ficámos assim, depois da última palestra do presidente dos árbitros, um bocado à nora sem saber os pensamentos de Vítor Pereira sobre os casos que dizem respeito ao bafejado líder do campeonato. Já sobre o Benfica, o presidente dos árbitros tem montes de opiniões.
Diz que foi irregular o golo marcado pelos campeões nacionais em Coimbra - e foi, sim senhor - e diz que só viu uma grande penalidade que ficou por marcar a favor do Benfica em Coimbra mas, como se sabe, isso são coisas que acontecem.
Realçou, com frontalidade, que o Benfica foi beneficiado pelo árbitro no jogo, na Luz, com o Rio Ave visto que houve uma obstrução de David Luiz ao guarda-redes vila-condense que terá permitido a Salvio fazer o quinto, repita-se, o QUINTO golo dos donos da casa. É óbvio que esse golo não alteraria a questão essencial da conquista dos 3 pontos em causa mas as verdades são para se dizer e Vítor Pereira, linear, não tem medo delas, ou seja, das verdades.
Esmiuçando o passado recente das provas nacionais e em lances em desfavor do Benfica, Vítor Pereira optou por não se debruçar sobre factos menores. Como, por exemplo, a bola jogada com a mão por Djalmir no lance do golo do Olhanense, na Luz, para a Taça da Liga que o árbitro do Porto, Artur Soares Dias, não viu. E a grande penalidade que ficou por marcar no jogo com o Nacional quando Saviola foi rasteirado na área madeirense e que o árbitro do Porto, Rui Costa, também não viu o que nem fez grande mossa porque o lance prosseguiu e a bola acabou no fundo da baliza do Nacional.
É certo que estes dois lances não são tão chocantes como a obstrução de David Luiz ao guarda-redes do Rio Ave de que acabaria por nascer o QUINTO golo do Benfica no encontro da 15.ª jornada, mas umas palavritas de Vítor Pereira sempre teriam caído bem.
Estamos como estamos. E, por isto, mesmo não vejo razões para censurar Vítor Pereira por falar de mais. Já por falar de menos, vejo algumas, muito francamente.
Aguardemos serenamente pela próxima intervenção pública do presidente dos árbitros e, então, veremos o que tem a dizer linearmente sobre a grande penalidade que deu a vitória ao FC Porto no jogo de Aveiro.
E, já agora, sobre o trabalho do árbitro do Porto, Vasco Santos, no escaldante Beira Mar - Nacional da Madeira que se joga no próximo fim-de-semana e que decide um semi-finalista da Taça da Liga.
Vejam só este caso curioso.
Há coisa de duas semanas, na conferência de imprensa de lançamento do jogo FC Porto com a Naval 1.º de Maio, um jornalista presente, João Martins, da RTP, perguntou a André Villas Boas qual era, no seu entender, «a percentagem de possibilidades de o FC Porto perder o campeonato».
O treinador do FC Porto não encaixou a questão com fair-play e respondeu assim ao repórter: «Primeiro, há que enquadrar a pergunta com a tua cor clubística.»
A primeira curiosidade é esta espanholice muito em voga de tratar por tu os jornalistas, o que não é método nem de se dar ao respeito nem, muito menos, de rebaixar a plateia, é apenas uma imitação sem jeito das conferências de imprensa no futebol espanhol, onde toda a gente se trata por tu porque é assim mesmo, é cultural.
Ainda recentemente aconteceu comigo, em Espanha, mais precisamente em Ayamonte, quando me dirigi à caixa de uma estação de serviço para pagar a gasolina
-«Pagas em efectivo o con tarjeta?» - perguntou-me a funcionária com toda a delicadeza do mundo.
Espanholices, como concordarão.
Mas a curiosidade maior é mesmo a resposta de Villas Boas à pergunta do jornalista João Martins, acusando-o de que o seu suposto benfiquismo o estivesse a influenciar no trabalho. Trata-se, sem dúvida, de uma premissa tão abusiva quanto despropositada. Imagine-se só, na temporada passada, quando Villas Boa era treinador da Académica, se lhe aparecesse pela frente um jornalista a perguntar se a sua «cor clubístice» poderia interferir na preparação dos jogos com o FC Porto.
Não há paciência, pois não? Enfim, espanholices...
O Benfica eliminou ontem o Rio Ave e está nas meias-finais da Taça de Portugal. Agora vai jogar com o FC Porto em duas mãos. Não foi fácil o jogo de Vila do Conde porque o Rio Ave joga bem à bola. O árbitro também teve a sua dose de protagonismo assinalando quatro grandes penalidades. O Rio Ave falhou uma vez e o Benfica falhou duas vezes, por Cardozo e por David Luiz.
A culpa disto é dos árbitros. Decidiram que esta época não havia grandes penalidade a favor do Benfica e os nossos jogadores, naturalmente, estão muito destreinados em pontapés de 11 metros. Como se viu ontem."
Leonor Pinhão, in A Bola
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